quinta-feira, 31 de março de 2022
No fundo do desemprego
quarta-feira, 30 de março de 2022
A ciência
Contra a discriminação do mercurocromo
terça-feira, 29 de março de 2022
segunda-feira, 28 de março de 2022
sábado, 26 de março de 2022
O que é nacional é joia
sexta-feira, 25 de março de 2022
Aliás e há leões
A fama chegou-lhe apenas em 1973, quando entrou numa canção do Elton John.
Sobre carris, mas pouco...
Se os comboios andassem sobre rodas, seriam transportes rodoviários. Assim, é o que se sabe...
O bom ladrão
Fafe, algures pelos finais da década de sessenta do século passado. Na sala de aula da agora desaparecida Escola da Feira Velha, no meio da parede, por cima do quadro negro, um Cristo crucificado. Carmona à direita da cruz, Salazar ironicamente à esquerda. Eu, que naquela altura já tinha umas luzes bíblicas, nunca percebi qual destes dois era o bom ladrão...
P.S. - Publicado originalmente no dia 26 de Julho de 2018. No dia 25 de Março de 1928 o general Óscar Carmona foi eleito presidente da República. Era candidato único. A oposição estava proibida. Curiosamente, o dia 25 de Março é dedicado pela Igreja Católica a São Dimas, o bom ladrão.
quinta-feira, 24 de março de 2022
Mãe há só uma
quarta-feira, 23 de março de 2022
Salta aos olhos
Tinha mais olhos do que barriga. Isto é: tinha dois olhos e somente uma barriga, posto que as barrigas das pernas não contam para a questão em apreço. Era, portanto, uma pessoal normal.
P.S. - Hoje é Dia Mundial da Optometria.
terça-feira, 22 de março de 2022
A gota de água
segunda-feira, 21 de março de 2022
Que nós bem, graças a Deus
Foto Tarrenego! |
O Texas era um tasco e era em Fafe. Chamava-se também Quiterinha, derivado ao nome da dona, senhora respeitável, ou Pensão Império, e isso eu nunca soube derivado a quê. Estão a ver a Rua Monsenhor Vieira de Castro, quem vai para o Picotalho, do lado do Cinema, depois da padaria e encostado ao Noré, mesmo em frente à cabine, antes de chegar às Grilas e ainda mais às Turicas, nas barbas da procissão da Senhora de Antime? O Texas era exacta e geograficamente aí, previamente a ter-se instalado de armas e bagagens no sul dos Estados Unidos da América, resvés com o México, segundo vi depois nos filmes a cores.
O Texas, o nosso Texas, o verdadeiro Texas, era a preto-e-branco e tinha, após o balcão, um reservado com vista para a cozinha e para os campos do Santo, onde hoje se ergue o cimento do Pavilhão Municipal. Foi no nosso Texas, na sala da frente, que eu vi na televisão os jogos de Portugal no Mundial de 1966. Eu e a RTP éramos miúdos da mesma idade. Ao Texas fui com o meu pai, no Texas confraternizei com os músicos antigos da Banda de Revelhe, que tinha casa de ensaio ali a dois compassos, coisa tão a calhar, com o querido Senhor Ferreira do Hospital ou com o Queirós, meu camarada bissexto na fábrica e provavelmente o melhor tintureiro do mundo, desse-se o caso extraordinário de ele aparecer ao trabalho...
As pancadas de Jean-Baptiste Poquelin
Quando elas morriam de pé
Que mal é que as árvores fizeram às câmaras municipais?
Era uma localidade um bocadinho estranha, porém exuberantemente moderna e cosmopolita. Nas suas principais entradas, a autarquia colocara frondosas tabuletas que avisavam os forasteiros: "Se quiser sombra, traga a sua própria árvore".
P.S. - Hoje, 21 de Março, é Dia Mundial da Árvore e Dia Internacional da Floresta.
Nostradamus, vostradais, elestradão
Nostradamus, nome latino e artístico, padecia de epilepsia psíquica, de gota e de insuficiência cardíaca. Se a isto tudo somarmos a habilidade para a leitura dos astros e das cartas de tarô, facilmente perceberemos que o artista viveu e morreu antes do tempo. O nosso Miguel seria o convidado ideal, diário, bidiário, ou talvez até terciário, para todos os programas das manhãs e das tardes das televisões generalistas portuguesas de hoje em dia.
A mais eficaz profecia de Nostradamus acabou por ser, lamentavelmente, a do seu próprio falecimento. Em 1566, dia 1 de Julho, inesperada véspera do definitivo dia 2 de Julho, estava o profeta cada vez mais à rasca derivado ao dramático agravamento da gota e da artrite, chamou o seu secretário e, entre trovões e relâmpagos e talvez sarças ardentes de febre, disse-lhe o que já lhe dissera mais do que uma vez: de amanhã não passo. E finalmente acertou.
P.S. - Publicado originalmente no dia 21 de Dezembro de 2019. Hoje, 21 de Março, é Dia Internacional da Astrologia. E atenção: Renascença não quer dizer Rádio Renascença.
domingo, 20 de março de 2022
Não sabes o que perdeste, Mirita!...
Foto Tarrenego! |
O senhor Merito, que também era mestre-de-cerimónias do es-tra-or-di-ná-ri-ooo... ex-pe-ctá-cu-looo!!!..., padecia de uns óculos com lentes verdes de fundo de garrafa Carvalhelhos versão 1960, que, aos meus olhos infantis e crentes, justificavam à partida os poderes adivinhatórios de que ele estava evidentemente investido.
Coisas de outro mundo. No circo aprendi palavras sen-sa-ci-o-nais, que gostava de ouvir e de dizer e não sabia o que significavam: funambulista, malabarista, contorcionista, equilibrista, acrobata voador, faquir, trapezista, pirofagista, globista, faquista, mais engolidor de espadas, palhaço e ilusionista - estas três eu ia lá -, e que hoje percebo que todas são afinal meros adereços ou adjectivos para outra palavra do léxico circense que é a palavra... político.
Agora? Agora andam por aí circos com nomes paisanos, insossos, e a magia foi um ar que se lhe deu. Nomes de linha média em quatro-quatro-dois losango: Rúben, Cláudio, Leandro e Walter Dias. Nomes do dia-a-dia, corriqueiros, sem pés nem cabeça, como se fossem nomes de talhos ou retrosarias. Como se fossem: o Circo Almeida, o Circo Brochado, o Circo Ferreira, o Circo Gomes, o Circo Lopes, o Circo Magalhães, o Circo Santos. O Circo Celso. Sem o glamour de um Tony, sem o garbo de um Fredy, sem as lantejoulas de uma Nandy nem as meias de rede de uma Mirita no seu rola-rola, ainda que rotas, as meias, porque no circo é importante trabalhar com rede, posto que sem fio, portanto Wi-Fi.
E ainda haverá palhaços excêntricos musicais? E a profissão está devidamente reconhecida e enquadrada? Tem ordem? Carteira profissional?
Era um deslumbramento vivermos - digo bem, vivermos - de coração aos saltos e mãos a tapar os olhos, o perigosíssimo trabalho daqueles artistas cheios de is gregos e cabelo empastado, artistas in-tarrr-na-ci-o-nais de Ermesinde e Freamunde - Cuidado, Dany, cuidado! Res-pei-tá-vel público, silêncio, o mais completo silêncio, por favor, peço o silêncio dos senhores ex-pe-cta-do-reeesss... Vamos, Dany, cuidado, upa, ealé, bravo, bravo, Dany, bravo!...
O sítio do circo em Fafe era na Feira Velha. A Câmara Municipal, quando se tornou mercearia para não ficar atrás das outras câmaras municipais, meteu lá carros à hora e é pena.
Por outro lado: o circo somos nós - camelos, ursos, jacarés em camisolas, asnos e leões mansos. Homens-bala de pólvora seca, malabaristas, contorcionistas, ilusionistas, equilibristas, palhaços - somos nós, porque nos mandam e porque somos o único circo a que temos direito. Vivemos na corda bamba e sem rede. Tiraram-nos a rede, esticam-nos a corda, caímos que nem tordos sem capacete.
P.S. - Publicado originalmente no dia 17 de Novembro de 2017, sob o título "Que é da magia do circo?".
O velho contador de histórias
A felicidade acaba à meia-noite
Hoje, 20 de Março, é Dia Internacional da Felicidade. Eu sei que é uma chatice, mas são ordens da ONU.
sábado, 19 de março de 2022
Era uma vez o futebol
Foto Tarrenego! |
Comecei a ir ao futebol pela mão do meu pai. Íamos ao Campo da Granja ver o Fafe. O Campo da Granja tinha uma bancada pequena apontada ao grande círculo e uma nora atrás da baliza do lado de São Gemil. A nora, neste caso, era um engenho para tirar água de um poço e não funcionava. Mas ficava num altinho muito jeitoso para a assistência. A assistência naquele tempo não era passe para golo, era pessoas. Eu e o meu pai víamos os treinos, os jogos, os juniores em vez da missa (o que arreliava sobremaneira a minha mãe), as reservas e, ao domingo à tarde, o primeiro time. Os domingos à tarde da minha infância eram os melhores dias do mundo. Até tinham altifalantes com marchas do John Philip Sousa. Depois o meu pai deixou de ir à bola, por razão de força maior, e eu continuei.
O Campo da Granja desistiu para dar lugar a uma escola de pré-fabricados. E foi bom para todos. Ganhámos o ciclo preparatório e um estádio que havia de ser, mesmo encostado aos Bombeiros. Apareceu-me o buço e, embora uma coisa não tenha a ver com a outra, passei a acompanhar a Associação para todo o lado, pendurado na generosidade de amigos mais velhos e com emprego. Frequentei todos os campos e estádios do Norte do País e, já praticamente de bigode, até fui ao Barreiro arrancar à CUF um lugar nas meias-finais da Taça de Portugal que nos roubaram.
Quando mudei a minha vida para o Porto ainda se ia ao futebol em família. Quero dizer: famílias inteiras, com pai, mãe, avós e netos, sobrinhos, primos, namoradas e namorados. Podia-se ir, não era perigoso. Eu fui logo morar para o Estádio das Antas, Superior Norte, porta com porta com o meu tio Zé da Bomba, que já lá morava há que anos. Consegui converter a minha mulher ao FC Porto, fi-la também sócia e passámos a ir à bola os dois, eu e ela com a cesta do merendeiro atrás, porque naquele tempo não havia lugares marcados e para jogos grandes era mesmo preciso entrar de véspera. E quando digo merendeiro quero dizer exactamente merendeiro: frango assado, sandes de vitela ou lombo de porco, panados, bolinhos de bacalhau, bacalhau frito, pataniscas, feijoada, salada russa, iscas de fígado, rojões, moelas de coelho, arroz à valenciana, filetes de pescada, salpicão, presunto e rebentos de soja, uma toalha de linho em cima dos joelhos, uma garrafosa de verde tinto bem fresquinho, ou duas, e uma garrafa de litro de cerveja, ou duas, por causa dos descontos. Entrava tudo. E marchava tudo. Para não virmos carregados para casa. Aquilo é que era futebol!
Se o FC Porto não jogava nas Antas, então eu ia ao Mar torcer pelo Leixões ou ao Bessa ver o Boavista. Aos sábados puxava pelo Salgueiros em Vidal Pinheiro que Deus tem ou matava o vício no claustrofóbico campo do Infesta, que me dava falta de ar. Sempre que podia, levava o Kiko, meu filho. Às quartas, dia da minha folga do trabalho, papava campeonatos de reservas, desempates da Taça de Portugal, liguinhas de subida de divisão e torneios de apuramentos de campeões. Em Santo Tirso, em Vila do Conde, na Póvoa de Varzim, em Espinho, em Aveiro, onde calhasse aqui à roda. Havia jogo, eu estava lá. E regalava-me. Mas depois chegaram as sades e as claques "organizadas", como se diz para o crime, para a Máfia, para os ganguesteres, e eu vim-me embora.
Às vezes tenho saudades. Tenho saudades do tempo do futebol ingénuo, em estado quase puro, futebol asseado, sem sades, sem ceos e sem administradores e consultores e assessores pornograficamente remunerados e premiados no final do ano ainda que não ganhem nada em campo, ainda que destruam a equipa de futebol e ainda que levem o clube à bancarrota. Do tempo em que os clubes de futebol eram clubes de futebol, associações, colectividades, agremiações. Do tempo em que os presidentes e os directores dos clubes de futebol punham dinheiro do próprio bolso e ainda biscatavam graciosamente ou, como o Fernando da Sede ou o Chester, carregavam botijas de gás às costas até aos balneários para que nada faltasse aos seus "meninos". Do tempo em que dirigentes pagavam bifes a jogadores à rasca da vida. Do tempo dos espectadores, da massa associativa, dos adeptos, dos apaniguados, dos grupos excursionistas, das comissões de auxílio, dos grupos de apoio espontâneos, com bombos e até gigantones e cabeçudos, que não eram poucos. Era o futebol, e o futebol era uma festa! Por outro lado, a partir das claques, que são um verdadeiro negócio dentro do outro tal negócio, ser-se mero espectador transformou-se em actividade de risco elevado. Agora o futebol está de pernas para o ar, chama-se "o jogo" e tem transições e momentos e adn e claques profissionais pagas a peso de ouro (ou ao peso do que o receptador aceitar), sades com contas mal contadas, accionistas de encomenda, histórias de polícia, claques armadas, drogadas e perigosas, talvez assassinas, ninguém é de ninguém, os frequentadores de estádios, pagantes e deslavados, viram as costas ao campo e tiram-se selfies, e eu não percebo nada disto. Confesso: às vezes tenho saudades - mas não torno!
Estou velho para estas merdas
Ora bem. Foi na parte do mais não sei quê - e digo mais não sei quê porque realmente não faço ideia, o assunto interessou-me sobremaneira, eu estava ali concentradíssimo como o Futre, invejoso, confesso, mas não consegui perceber o que se passava até às últimas consequências -, portanto, foi na parte do mais não sei quê que a mulher menos jovem, com evidente cara de dona, largou os suspiros, ganhou fôlego, esganiçou ainda mais a voz e disse ao cão, imperativa: - Frederico! Não! Não! Não! Mamãe já falou! Isso não, Frederico!
sexta-feira, 18 de março de 2022
Então pastéis era aquilo?
Foto Tarrenego! |
Conhecia-os de vista. De passar pelas montras ou das mesas do Peludo, mas nunca me tinham sido apresentados. Até que uma vez o meu pai trouxe meia dúzia para casa. Vinham naquela caixinha de papel, obra de engenharia feita na hora, ali mesmo aos olhos do freguês, com a habilidade e o requinte de quem constrói um avião a jacto. Se me estou a lembrar bem, havia, naquele tempo, os bolos de arroz, as bolas de berlim, os queques, os jesuítas, os caramujos, os mil-folhas, as natas e os cocos. As tíbias apareceram depois, já na era das minissaias. O meu pai chegou muito tarde "da música" e se calhar os pastéis vinham por isso, como pedido de desculpas, para adoçar a boca à minha mãe. Não tenho a certeza. Era pequeno demais para então perceber o que agora sei tão bem. Mas gostei da festa que foi: acordámos - a Nanda, o Nelo e eu -, sentámo-nos todos na beira da cama da frente, ao lado da nossa mãe, provámos apressados a novidade, o nosso pai fez-nos rir como de costume e fomos felizes. Então pastéis era aquilo? Era bom. Para mim, quase tão bom como uma côdea de broa coberta com açúcar amarelo, e já lá irei.
Fafe era um terra de antonomásias, estoufarto de dizer. No nosso imenso pequeno mundo, tínhamos o Largo, a Avenida, o Monumento, a Recta, o Campo, o Depósito, o Banco, os Serviços, a Bomba, o Jardim, a Quelha, o Santo e o Café, que era o Peludo e que na verdade se chamava Cine-Bar, eventualmente dada a sua proximidade e até uma certa ligação ao Teatro-Cinema e à família Summavielle. Mas cafés, tascos e afins havia muitos. Uma mão-cheia de cafés, e tascos até dar com um pau, para ser mais preciso. Pastelarias, salões de chá ou snack-bares é que nada, até aparecer o Dom Fafe, mesmo no centro da vila, coisa fina e para clientela sem gases. O Dom Fafe, respeitando a tradição, passou a ser "o" Snack-Bar.
Eu era calisto. Calisto televisivo. A preto e branco e com muitos pedimos desculpa por esta interrupção. Para me fazer pagar a moina, o Sr. Avelino do Café, que era o Hoss do "Bonanza" em pessoa menos o chapéu alto, entregava-me umas moedas e mandava-me à cozinha do Hospital buscar uns enormes tijolos de gelo que ele depois partia e metia no barril de tirar finos (imperiais, se lido em Lisboa). No fim do recado dava-me o troco? É o davas. Oferecia-me um pastel? Fodias-te. Eu tinha para aí sete anos, o meu pai ainda não tinha trazido pastéis para casa e o Sr. Avelino punha-me à frente a merda de um cimbalino. Sete anos, e ele dava-me um café (bica, se lido em Lisboa). Se ainda ao menos fosse um cigarro!...
Não sou de doces. E, dos pastéis que o meu pai trazia para casa, o que eu gostava mais era da festa, do riso. Daquela meia hora extra fora da cama. Da sensação de família e fartura, da felicidade antes do sono. Porque o meu doce preferido era outro: era a côdea de broa, "grande daqui até ao céu", enfiada às escondidas na lata do açúcar amarelo e comida na clandestinidade do fundo do quintal. Subia a um banco para subir à mesa da cozinha para chegar ao armário, abria a lata, passava o pão, fechava a lata e saía dali a cem à hora mas com mil cuidados para não entornar o "recheio". Côdea de broa com açúcar amarelo, isso, sim, era o meu bolo. Havia lá coisa melhor no mundo!? Por acaso até havia: era a gemada. Gemada simples e honesta: gema de ovo batida numa malga com muiiiiiito açúcar. Mas essa só podia ser duas vezes por ano, acho eu, pela passagem de classe e no meu aniversário. Com os ovos, lá em casa, todo o cuidado era pouco. Estavam contados, eram para deitar. E ao açúcar para a broa a minha mãe fechava os olhos. Fazia de conta que não sabia...
Volta ao mundo em dois dias (três, se for a Fátima)
Foto Hernâni Von Doellinger |
O meu avô da Bomba jurava que nunca pôs nem nunca na vida poria pé na praia. Que era muito sol ao desamparo, areia demais para a sua camioneta. Queixava-se: a água estava constantemente molhada e, ainda por cima, salgada. O meu querido avô era "uma pessoa muito doente" e precatada quanto ao sal. Portanto, o sol e o sal. "Se ainda ao menos houvesse a sombrinha de uma árvore", dizia, molageiro, aí que contassem com ele nem que fosse só para a soneca da tarde. Mas o meu avô era um exagerado, um mentirosinho sem tenção de ofensa - e aquela jura eu sabia que era a mangar...
Para o avô da Bomba, como para todo o fafense que então se prezasse, a palavra praia queria dizer Póvoa de Varzim. Exactamente. Ir à praia e ou ir para a praia (conceitos que importa diferençar) era ir à Póvoa ou ir para a Póvoa, via Famalicão. E no entanto o meu avô conhecia também satisfatoriamente os longínquos areais de Ofir, da Figueira da Foz e da Nazaré, o que já não era brincadeira! E de onde é que lhe vinha esta extraordinária mundivivência, este cosmopolitismo fafense tão antes do tempo? Pois bem: o meu avô organizava excursões - dois dias ao Alto Minho, com pernoita em Viana do Castelo, dentro do autocarro, no Largo da Agonia a esbordar de camionetas e parolos como nós, e umas senhoras cá fora a fazerem café de cafeteira em máquinas a petróleo, à luz do petromax até que o sol nascesse; três dias a Fátima, pelo 13 de Maio. Ano sim, ano não. Partida e chegada no quartel dos Bombeiros, sempre, então na Rua José Cardoso Vieira de Castro, ao lado da garagem do Zé Bastos e entre os dois palacetes. Com as estradas que tinha, Portugal era naquele tempo um país imenso. Ir de Fafe aos Arcos de Valdevez, por aquela altura, era como embarcar por engano numa expedição ao fim do mundo...
O meu avô era um videirinho, já aqui contei. Tinha casa e salário de quarteleiro dos Bombeiros, não sei se era muito ou pouco, mas não perdia oportunidade de fazer dinheiro extra no que lhe estivesse mais à mão: o tasquinho na cave do quartel, os tremoços, os bolinhos de bacalhau e o vinho na Festa da Bomba, a aguardente e o vinho, sempre o vinho, nas sessões nocturnas do cinema ao ar livre na parada das traseiras, muito antes de a sétima arte descer ao campo de futebol, a banca de sapateiro por baixo das escadas que subiam para o salão de festas, umas refeições especiais encomendadas por um certo grupo de amigos, respeitosos admiradores das mãos de ouro da minha avó para a cozinha. Uma vez há cinquenta anos o papa Paulo VI veio a Fátima e pouca gente tinha televisão em casa. No salão dos Bombeiros foram montados um projector e uma tela para a transmissão em directo e em "ecrã gigante", com entradas a pagar. A sala encheu, o dinheiro da receita revertia naturalmente para a Associação Humanitária, mas de certeza que o avô também conseguiu sacar dali algum, nem que fosse a vender rebuçados para a tosse ou cascas de amendoins...
Ora é aqui que encaixam as excursões, que os candidatos a excursionistas pagavam em suaves prestações semanais desarriscadas nuns cartõezinhos que o meu avô mandava fazer na tipografia. Isto para aí durante um ano. O avô da Bomba fazia a cobrança aos sábados ou domingos de manhã, não sei precisar. Ia de motorizada e às vezes levava-me, primeiro numa Florett e depois na Lambreta, uma Vespa azul, antes e depois de haver sentidos proibidos nas ruas de Fafe. Para o meu avô nunca houve, o caminho foi sempre o mesmo e tinha sempre razão quando lhe apitavam ou gritavam para não ir por ali. Eu, nem pio...
(A Florett tem muito que se lhe diga em Fafe, era um veículo de pecado, mas por ser verdade aqui declaro que o meu avô nunca foi dado a essas actividades por assim dizer extracurriculares. A Florett calhou-lhe, e só isso...)
Mas as excursões. Eram viagens épicas, cheias de cheirinho bom a merendeiro e muitas paragens para "mudar a água às azeitonas", enjoos e borracheiras de caixão à cova. Cheiravam também a gomitado, a naftalina, a sapatos novos, a botas ensebadas de fresco, a chulé, a urina, a tabaco, a suor, a desodorizante Lander, a perfume barato, a brilhantina, a laca, a mundo. A coberto da noite soltavam-se uns traques enfeitados com risinhos solertes que ajudavam à festa. A camioneta avariava, pessoas perdiam-se. Cantava-se o "Treze de Maio", o "Queremos Deus" e "O carrapito da Dona Aurora". Rezava-se o terço ao passar a Ponte de Fão, sobre o rio Cávado, porque constava que a estrutura estava a cair de podre. Morreríamos todos muito bem. Na Póvoa as mulheres arregaçavam as saias, os homens arregaçavam as calças e os miúdos ficavam em cuecas ou em pelote, consoante a idade, e todos se agarravam com quanta força tinham à grossa corda que ligava o mar ao areal, brincando aos sustinhos e trambolhões de felicidade histérica ali no sítio onde o mar enrola na areia, que também se cantava.
Sei disto tudo porque estive lá. Que me lembre, fui uma vez a Fátima e outra ao Alto Minho, esta ainda com o meu pai. O meu irmão Lando ainda não tinha nascido. Eu, o Nelo e a Nanda queríamos ir sempre, mas não podia ser. O meu avô não dava borlas, nem aos netos. (Na verdade, o meu avô não dava nada a ninguém. Isto é: dava os bons-dias mas pedia recibo.) Ia portante só um, e no colo da mãe, mais do que isso seria prejuízo...
O meu pai, que gostava de fazer rir a minha mãe, dizia aos dois que ficavam: "Não é preciso chorar, vós também ides. Na sombra..."
Tanto relambório para chegar aqui: herdei do meu avô o horror à praia em dias de sol e gente, mas tenho a árvore que ele reclamava. Encontrei-a aqui em Matosinhos, mesmo ao pé da porta, encostada à esplanada do Lais de Guia. Passo por lá todos os dias e vejo o avô à sombrinha, com os pés mansamente enfiados na areia morna. Gosto de o ver assim, peço-lhe a bênção e beijo-lhe a mão. Sossego as saudades. O avô da Bomba era molageiro e videirinho, forreta do piorio, mas é meu.
De Portugal, dos Algarves e da Póvoa de Varzim
Foto Hernâni Von Doellinger |
A Póvoa de Varzim, que é Fafe no Verão, enormou-se sem rei nem roque. Cresceu a torto e a direito - e digo bem, literalmente a torto e a direito. Cuido que a culpa não é só dos fafenses apartamenteiros, que, na verdade, são mais que as mães. Outros culpados haverá, por exemplo derivados de Famalicão ou de Felgueiras, gente igualmente de mostrar e com fábricas e ferraris que entretanto faliram. As fábricas. E os operários. Os ferraris estão bem, graças a Deus, na garagem disfarçada de lavandaria atrás do lago do menino que mija e da piscina de plástico. Os da Póvoa de todo o ano só agora deram fé que foram encabados. Arruinaram-lhes os quartinhos de aluguer e as vistas. São prisioneiros, vedados por um colossal muro de betão que lhes rouba a praia, o ar e a vida. A cidade dos empreiteiros aluga-se. Os autarcas também. Mas tornemos a Fafe. Quem fez ao Largo o que fez, quem fez ao Assento o que fez, quem fez ao Santo Velho o que fez, quem fez ao monte de São Jorge e a Castelhão o que fez, só pode ter construído também a Póvoa de Varzim moderna e encaixotada, é de justiça e entregue-se-lhes a medalha. E depois é mandá-los à merda pelo que fizeram da minha terra.
A Póvoa estava um bocado ao deus-dará, praticamente de vago, decerto derivado à pandemia em alta e à época do ano em baixa. Mas há cada vez mais andares e apartamentos para vender e quartos por alugar, de acordo com os letreiros. A língua oficial da Póvoa de Varzim, entre os meses de Junho e Agosto, é o francês com caralhos no meio. No resto do ano também. Eu e a minha mulher foi como se estivéssemos no estrangeiro, embora com caralhos no meio, e ainda há um bocadinho tínhamos saído de Matosinhos. Por falar nisso, liguei à vizinha para saber se estava tudo bem. E estava.
Aproveitámos as férias em cheio. Olhámos para o casino e para o Cego do Maio, fomos espreitar as montras com bolos, a praia, os banhos e as banhas. Fomos às piscinas, ao museu, à biblioteca, à praça de toiros e ao estádio, sempre pelo lado de fora, para não incomodar. Não percebo quem diz que não tem dinheiro para ir de férias. Eu e a minha mulher fomos e às 17h45 já estávamos outra vez em casa. Mais: resolvi fazer um prolongamento extraordinário das férias e demo-nos ao luxo de jantar. Dois bijus, um para cada.
As minhas férias ficaram-me por 10,65 euros. Ora portanto, 24 cêntimos dos dois pães do almoço, dez euros de dois andantes Z5 (cartões incluídos) para as viagens Matosinhos-Póvoa de Varzim e Póvoa de Varzim-Matosinhos, mais os 24 cêntimos dos papos-secos do jantar, uma extravagância, e 17 cêntimos da chamada para a vizinha. Total: 10,65 euros, com todas as taxas incluídas. Um bocado puxado, é verdade, e não dá para descontar no IRS, mas é uma questão de nos organizarmos durante o resto do ano. O que é preciso é saber fazer "uma boa aplicação dos recursos" que temos, como filhodaputamente dizia, no seu tempo de troika, o então alegado primeiro-ministro.
A minha mulher ainda quis ir a uma agência de viagens, para ver se a coisa nos saía mais em conta - como se nós fôssemos uns necessitados! Mandei-a dar uma volta e ela passou as férias todas sem me falar.
A propósito de férias: as únicas pessoas que eu e a minha mulher conhecemos que nunca foram ao Brasil somos nós os dois. Mas já está resolvido: para o ano, se Deus quiser, vamos outra vez à Póvoa.
quinta-feira, 17 de março de 2022
"Lá estara", Lando Bomba?
Foto Tarrenego! |
Quero fazer uma denúncia: o meu pai era benfiquista e morreu quando eu tinha dez anos. Isso faz-se? Tem algum jeito? Não sei se a CMTV e a TVI vão pegar no caso, mas justificava-se. Porque desgraça assim é para dar na televisão. Há que tempos que eu sou mais velho do que o meu pai, e acho mal. E o meu pai ainda me faz falta e tenho essa razão de queixa. E às vezes sinto-me órfão, como por exemplo hoje, e já não tenho idade para isso. Na minha ideia, a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Judiciária também deviam fazer alguma coisa.
O meu pai era portanto benfiquista e penso que só isso é mais do que suficiente para abrir um processo. Era benfiquista e levava-me a ver os treinos do Fafe no Campo da Granja que também já não existe. O meu pai ensinou-me o futebol e outras coisas boas da vida. Uma vez levou-me às Festas Gualterianas a Guimarães, fomos a um tasco e eu pedi-lhe para comer feijão com tripas, que nunca tinha provado, e gostei que eu sei lá. Se calhar por isso é que ainda hoje gosto tanto e faço tão bem. Outra vez trouxe-me de presente uma pistola Luger de brincar, pesada e igualzinha às dos nazis dos filmes, e gostei que eu sei lá. Não sei o que me deu na cabeça, mas cresci e não gosto de armas. Continuo a gostar do meu pai.
Para além de benfiquista - repito, benfiquista -, o meu pai era também novo, bonito e bom, mas suponho que isso não interesse para o processo, e era excelente operário tecelão, músico, bombeiro e jogador de dominó. De bombeiro, levava-me ao cinema e ao circo. E contava-se que no dominó, jogado na mesa do canto direito para quem entrava na sala das traseiras do café Peludo, o meu pai até escondia pedras na boca para enganar parceiros e ganhar mais uns tostões para casa. Eu ia chamá-lo, bem ensaiado pela minha mãe para que ele não ficasse mal perante os amigos. "A mãe manda dizer que a comida está pronta", era o que eu dizia, uma e só uma vez, e ficava ao lado dele todo contente à espera.
É preciso que se note: o meu pai, também conhecido como Lando Bomba ou Lando da Bomba, não era só dominó. Nas festas onde a Banda de Revelhe ia tocar, o meu pai, que tocava saxofone, tinha também sociedade com o homem da roleta de feira, artesanal e viciada. Nos intervalos dos concertos, fartava-se de ganhar canivetes, cintos, saca-rolhas, tesouras, baralhos de cartas e gaitas de beiços. O meu pai era o engodo. "Mais uma para o senhor músico. Está em dia de sorte, o raisparta o músico!", gritava o homem da roleta, feitos um com o outro, a chamar o povo. No final, o meu pai devolvia tudo a troco de umas coroas ou de mais uma navalha para oferecer.
P.S. - Publicado originalmente no dia 6 de Dezembro de 2011, sob o título "Quero denunciar o meu pai".
Mudam-se os tempos, mudam-se as vaidades
quarta-feira, 16 de março de 2022
As virgens e a bisnaga
Vosselências não andam de transportes públicos, pois não? Se calhar nem vão compreender o meu drama, mas eu vou tentar explicar:
terça-feira, 15 de março de 2022
Egosismo, de Orlando Castro - já à venda
Já está disponível "Egosismo", o novo livro de poesia do jornalista Orlando Castro. Mais informação sobre o autor e a obra pode ser consultada em https://jornalf8.net/egosismo-novo-livro-de-orlando-castro/. À venda em https://shop.autores.club/pt/inicio/340-egosismo.html.
We don't need no education
Foto Hernâni Von Doellinger |
Alegria, alegria a sério era aquilo: chegar à escola primária e a "empregada" mandar-me embora. Ordenava, porque naquele tempo as "empregadas" é que mandavam nas escolas, repito, ordenava: - Vai para casa, diz à tua mãe que a senhora professora está doente. E ordenava com o braço estendido e no fim do braço estendido tinha uma mão estendida com um dedo estendido que não admitia discussão e queria dizer "rua!"...
(Também poderia querer dizer "Salazar! Salazar! Salazar!", mas sem dedo.)
O coração rebentava-me pela boca mal saía o portão, aos gritos e aos saltos - Não há escola!, não há escola!, não há escola!, Rua Montenegro fora, enervando desnecessariamente o pobre Baptista do Asilo, que desatava às cabeçadas contra o gradeamento carcerário, e eu festejando efusivamente a dor de barriga da professorinha, dando a boa nova aos colegas retardatários, que faziam meia-volta-volver e também saltavam e gritavam - Não há escola!, não há escola!, não há escola!...
(Alegria ingénua, pura, intensa, física. Era evidentemente uma manifestação de profunda catarse, embora eu na ocasião não o soubesse, porque ainda não tínhamos chegado a essa palavra.)
Passávamos a Casa de Santa Zita, que caducou, a Cafelândia, que é um banco, a Rosindinha Catequista, que desapareceu, o Largo, que estreitou, a Loja Nova, que morreu de velha, o Peludo, que acabou, o Cinema, que é outra coisa, a Aurorinha Maia, que mudou de ares, a Padaria, que se foi, a Quiterinha, que é só memória, as Grilas, que Deus tem, o Funileiro, que já não há, quer-se dizer, alarmávamos a vila inteira - Não há escola!, não há escola!, não há escola!, eu chegava a casa, no Santo Velho, esbaforido e feliz, e a minha mãe, por tradição, dava-me logo à entrada dois ou três sopapos derivado àquele "espectáculo todo" e... "para aprender", mas não me roubava a alegria.
segunda-feira, 14 de março de 2022
O peso da poesia
- Era dois poemas de trinta gramas, se faz favor!
- Os dois?
- Cada.
- Sessenta gramas de poesia, quer dizer...
- Mas em doses separadas.
P.S. - Hoje, 14 de Março, é Dia Nacional da Poesia. No Brasil.
domingo, 13 de março de 2022
Aníbal Carriço, solenemente antiengonha
Hoje em dia não há respeito por nada, nem pelos velhos, nem pelos novos, nem pelos entremeados, nem pelos pais, nem pelos filhos, nem pela missa, nem pelos professores, nem pelo sagrado futebol - e daqui não vamos mais longe. As pessoas pagam fortunas para entrarem no estádio e depois não vêem o jogo, espreitam-no pelo ecrã do telemóvel, "filmam", "fotografam", viram as costas ao campo, telefonam-se, vão ao YouTube, lançam tochas, fazem selfies, mandam sms umas às outras, cadeira ao lado, revelam a emoção do momento no Facebook, mas não ligam à bola, não sabem o resultado, não sabem sequer quem são "os nossos", querem ver se aparecem na televisão, nem um palavrãozinho ao árbitro, nem um vai à merda! ao defesa-esquerdo que é uma nódoa, nem um uiiii! ao tiro a rasar poste. Que grande falta de respeito pelos intervenientes, que ausência de presença, que ignorância da tradição...
No meu tempo sabíamos como nos devíamos comportar. Da bancada (e, aqui, bancada é uma mera força de expressão), tínhamos uma palavra a dizer em campo. Havia um léxico muito próprio e rigoroso que nos era ensinado desde tenra idade, por exemplo:
- Olha a hora!...
- Está a sentar!...
- Já não chove!...
- Não jogas nada!...
- Anjinho de merda!...
- És um arrocho!...
- Vai prà tua terra, ó preto!...
- Abre-me esses olhos, ó cego!..
- Ó bandeirinha, estás fodido comigo!...
- Ó gatuno!...
- Vais levar poucas, vais!...
- Aperta com ele!...
- Dá-lhe!...
- Parte-lhe uma perna!...
- Ó filhadaputa, ó boi!...
- És muito corno!...
- Força prà frente, caralho, pá!...
- Chuta, que o guarda-redes é anão!...
- Chuta, caralho!...
- Corta, caralho!...
- Desce, caralho!...
- Sobe, caralho!...
- Corre, caralho!..
- Tira o gajo, caralho!...
- Mete outro, caralho!...
Pelo menos em Fafe era assim, primeiro no Campo da Granja e depois no "Estádio". A interacção era tão próxima, tão intensa, que, às vezes, mortinhos por fazerem parte, os próprios jogadores tomavam a iniciativa de mandar foder os adeptos, num eloquente gesto largo ou num simples chocalhar de colhões, como quem diz e diziam "ide para o caralho, caralho, correi vós, caralho"...
Destoava o Aníbal Carriço, isto também é verdade. O bom e querido amigo Aníbal Rodrigues, porém Carriço, que, tantas vezes farto da engonha de falsos habilidosos, gritava de cá de fora com voz pausada e grave, solenemente, de mãos na boca em altifalante: "Passa a bola! PA-SSA A BO-LA!! PA-SSA A BOO-LAA!!!..."
De acordo com os dados recolhidos pela estação sísmica da Gavieira, em Viana do Castelo, o "PA-SSA A BOO-LAA!!!..." do Aníbal ouvia-se (e eu quero tanto que ainda se ouça!), consoante para onde o vento estivesse virado, de Guimarães a Felgueiras, da Póvoa de Lanhoso a Vieira do Minho e de Cabeceiras a Celorico de Basto. Isto, se não estou em erro.
A dialéctica e a exegese futebolísticas estão modernamente aos cuidados de especialistas televisivos, de paineleiros. Mas, palavra de honra, por mais paineleiros que os paineleiros sejam: ver a bola simplesmente, desabafar umas litúrgicas caralhadas, ouvir o Aníbal, e depois ir merendar ao tasco - ainda não descobri melhor maneira de passar uma boa tarde de domingo...
P.S. - Publicado originalmente no dia 4 de Novembro de 2016, então sob o título "O futebol à antiga tinha a sua própria gramática". No outro dia lembrei-me do extraordinário Zé Manel Carriço, hoje apetece-me recordar o irmão Aníbal, meu ilustre camarada de jornais. O Aníbal Carriço foi um dos mais promissores jovens jogadores da AD Fafe da sua geração, mas a Guerra Colonial e uma série de balázios no lombo impediram-lhe o resto.