A sala de visitas era estreita e atulhada, com duas janelas para a rua e quatro portas, contando com a que nos dera ingresso: a mobília não parecia nova, especialmente o piano, que, abrindo para o lado da parede, apresentava o pano do forro, verde, desbotado e despregado em mais de um ponto; os aparadores estavam cobertos de enfeites de bronze, de conchas, de cristal e de tapeçaria; na mesa do centro, sobre uma coberta de crivo, havia, ao lado de um grande lampião de globo fosco, dois álbuns e uns grossos rolos de cartão; a um dos cantos dela, como esquecido, estava um cachimbo de espuma já muito requeimado. Ainda que muito cheia e ornada, tinha a sala não sei que aspecto de pobreza que logo se conhecia... talvez porque o tapete do sofá era velho e gasto, talvez porque o papel das paredes, desmaiado e com manchas de gordura, mal se escondia debaixo dos muitos quadros que o forravam; talvez porque as escarradeiras de porcelana azul estavam por limpar e uma delas trincada.
Momentos depois, veio a família, - a dona da casa, uma senhora magrinha, que podia ter, igualmente, quarenta ou cinquenta anos, uma mocinha beiçuda, de cara redonda e bexigosa, testa curta e maçãs salientes, ambas com vestidos caseiros muito unidos ao corpo, que a mocinha possuía admiravelmente modelado, e, com as duas, um rapazola a quem apontava o buço, de cabelo anelado e quase a dar pelos ombros.
"O Marido da Adúltera", Lúcio de Mendonça
(Lúcio de Mendonça nasceu no dia 10 de Março de 1854. Morreu em 1909.)
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