- Que fazeis pr’aí, homem de Deus? Não tens em que entreter-se hoje? E aquele mato que está por queimar? E o monturo dos fundos, quem vai remover? Onde já se viu semelhante preguiça?
Era a voz do feitor, correndo do pátio da fazenda o pobre do Pancho. Pancho Papaterra, como ele o chamava, só porque o rapaz tinha a cor parda do solo e vivia com os pés metidos na lama, como um boneco de barro. Seu derivativo, para espairecer das fadigas do trabalho, era vir espiar Cholita, inclinada no bastidor de bordado com um ar de estampa antiga. Era a sua debilidade. Um momento de folga, um minuto de distração do ferrabrás, e lá vinha o Pancho para junto do alpendre extasiar-se ante a presença da moça, colorindo os olhos baços com aquela pintura, molhando a vista naquela paisagem. Cholita era fria, indiferente, mas sem crueldade. Consentia naquela adoração distante, deixando-se surpreender e admirar pelos olhos fascinados de Pancho:
- Pobre! Deixá-lo pr’aí... Que mal poderá resultar disso? Seria impiedade enxotá-lo quando lhe dá a mania.
Por ela, ficaria por ali quanto tempo quisesse. Não lhe queria mal, apesar dos olhos súplices com que a espreitava, uns olhos ternos na aparência, mas no fundo desejosos. Não podendo revelar a cobiça, refletiam a humildade.
"Marabaxo, Contos", Osvaldo Orico
(Osvaldo Orico nasceu no dia 29 de Dezembro de 1900. Morreu em 1981.)
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