quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Onomástica, toponímia & outros nomes esquisitos 15

                                                                                                                 Foto Hernâni Von Doellinger

O pregador. O pregador subiu ao púlpito, e os seus passos seguros, pesados, degrau a degrau, ecoaram em stereo litúrgico na igreja confortavelmente vazia. Estranho... Dizia-se que era o melhor pregador da região.
O pregador não iria, porém, deixar os seus créditos por mãos alheias. Compenetrado mas decidido, agarrou nas três tachas que levava na ponta da língua, sacou do martelo que trazia à cintura, e em menos de um padre-nosso já tinha consertado a estante que o sacristão escangalhara sem querer nas arrumações da missa das sete.

A língua portuguesa...
- Temos tomado a nossa medicação? - pergunta-me ela.
- Temos, temos, senhora doutora - respondo eu, que sou uma pessoa educada e um exemplar tomador de medicações.
- Temos feito o nosso exerciciozinho diário?
- Todos os dias, senhora doutora.
- Temos moderado a nossa alimentação?
- Que remédio, senhora doutora. O dinheiro já só dá para cascas de batatas. 
- Ora ainda bem. Vamos lá ver como que é temos a nossa tensão - diz-me ela.
- Vamos a isso, senhora doutora, nem é tarde nem é cedo - digo eu, tirando o casaco e arregaçando a manga da camisa.
Vimos a tensão.
- Temo-la um bocadinho alta - informa-me ela, sem esconder a preocupação.
- Um bocadinho pouco ou um bocadinho muito, senhora doutora? - pergunto eu, também já um bocadinho muito à rasca. 
- Bastante, bastante. Vamos meter este comprimidozinho debaixo da língua e vamos deitar um bocadinho ali - diz-me ela.
- Vamos lá então, senhora doutora. A senhora doutora primeiro, que eu gosto de ficar por cima - digo eu, que, repito, sou uma pessoa educada e exemplar tomador de medicações.

Entre o requinte e o requente. A diferença entre requintado e requentado passa quase despercebida. No arroz de marisco é que se nota mais.

Chamei comas às aspas e estou bastante aborrecido. Por exemplo, as aspas. Toda a minha vida chamei aspas às aspas. Aspas é um nome com o seu quê de palerma, mas aceita-se, não ofende ninguém, nomeadamente as aspas propriamente ditas, que são a parte mais interessada.
Que se segue: ontem, sei lá bem o que me deu, chamei comas às aspas num e-mail que mandei ao meu irmão. Comas. Palavra de honra, nunca tal me tinha acontecido e foi, eu fique ceguinho, sem intenção. Chamei-lhes comas, não sei onde tinha a cabeça. Devo confessar, a propósito, que me senti um bocado badalhoco. Pedi desculpa ao meu irmão e peço publicamente desculpa às aspas, às aspas propriamente ditas...

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