Pois morre-se de muita coisa, de muita coisa
 se morre, morre-se por tudo e por nada
 morre-se sempre muito
 Por exemplo, de frio e desalento
 um pouco todos os dias
 mas de calor também se morre
 e de esperança outro tanto
 e é assim: como a esperança nunca morre
 morre a gente de ter que esperar
 Morre-se enfim de tudo um pouco
 De olhar as nuvens no céu a passar
 ou os pássaros a voar, não há mais remédio
 ó amigos, tem que se morrer
 Até de respirar se morre e tanto
 tão mais ainda que de cancro
 De amar bem e amar mal
 de amar e não amar, morre-se
 De abrir e fechar, a janela ou os olhos
 tão simples afinal, morre-se
 Também de concluir o poema
 este ou qualquer outro, tanto faz
 ou de o deixar em meio, o resultado
 é o mesmo: morre-se
 Data-se e assina-se - ou nem isso
 Sobrevive-se - ou nem tanto
 Morre-se - sempre
 Muito
"Sobre a Nossa Morte Bem Muito Obrigado", Rui Caeiro
(Rui Caeiro nasceu no dia 27 de Junho de 1943. Morreu ontem.)
Sem comentários:
Enviar um comentário