sábado, 22 de abril de 2017

José Guilherme Merquior

Nos anos 20, o regime soviético pré-estalinista encorajou o cinema de vanguarda - mas as massas continuavam a preferir as películas à Hollywood. O fato ilustra bem com que extensão o Kitsch está enraizado na consciência das massas; uma extensão seguramente maior do que pensam os que se inclinam a considerar o fenômeno da mentalidade estética degradada um simples reflexo de condicionamentos efêmeros, impostos pelos interesses dos "donos" da "indústria cultural". Não se trata aqui de dar razão aos distribuidores cretinos, que alegam dar ao povo "o que ele quer": chanchada e melodrama; trata-se, isso sim, de levar mais longe a indagação sobre as raízes psicossociais do Kitsch. Em outras palavras: de penetrar mais fundo na geologia moral do homem da massa e de seu antepassado cultural imediato - o burguês.
Ao examinar a experiência estética peculiar ao Kitsch, deparamos com o mecanismo da reação controlada. O Kitsch é a estética do digestivo, do "culinário", do agradável-que-não-reclama-raciocínio. O Kitsch faz cosquinhas na boa consciência do homem "médio", que detesta pensar, porque vive
fugindo à verdade
como de um incêndio
(Drummond).
Como sempre, boa consciência e má-fé andam de braços dados.

"Formalismo e Tradição Moderna",  José Guilherme Merquior

(José Guilherme Merquior nasceu no dia 22 de Abril de 1941. Morreu em 1991.)

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