quarta-feira, 16 de outubro de 2013

António Ramos Rosa 2

A Festa do Silêncio

Escuto na palavra a festa do silêncio.
Tudo está no seu sítio. As aparências apagaram-se.
As coisas vacilam tão próximas de si mesmas.
Concentram-se, dilatam-se de ondas silenciosas.

É o vazio ou o cimo? É um pomar de espuma.

Uma criança brinca nas dunas, o tempo acaricia,
o ar prolonga. A brancura é o caminho.
Surpresa e não surpresa: a simples respiração.

Relações, variações, nada mais. Nada se cria.
Vamos e vimos. Algo inunda, incendeia, recomeça.


Nada é inacessível no silêncio ou no poema.
É aqui a abóbada transparente, o vento principia.

No centro do dia há uma fonte de água clara.
Se digo árvore a árvore em mim respira.
Vivo na delícia nua da inocência aberta.


"Volante Verde", António Ramos Rosa

(António Ramos Rosa nasceu no dia 17 de Outubro de 1924. Morreu nem há um mês.)

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