Abrigo
Paris da minha ternura
Onde estava a minha Obra -
Minha Lua e minha Cobra,
Timbre da minha aventura.
Ó meu Paris, meu menino,
Meu inefável brinquedo...
- Paris do lindo segredo
Ausente no meu destino.
Regaço de namorada,
Meu enleio apetecido -
Meu vinho de Oiro bebido
Por taça logo quebrada...
Minha febre e minha calma -
Ponte sobre o meu revés:
Consolo da viuvez
Sempre noiva da minha Alma...
Ó fita benta de cor,
Compressa das minhas feridas...
- Ó minhas unhas polidas,
- Meu cristal de toucador...
Meu eterno dia de anos,
Minha festa de veludo...
Paris: derradeiro escudo,
Silêncio dos meus enganos.
Milagroso carrossel
Em feira de fantasia -
Meu órgão de Barbaria,
Meu teatro de papel...
Minha cidade-figura,
Minha cidade com rosto...
- Ai, meu acerado gosto,
Minha fruta mal madura...
Mancenilha e bem-me-quer,
Paris - meu lobo e amigo...
- Quisera dormir contigo,
Ser todo a tua mulher!...
Mário de Sá-Carneiro
(Mário de Sá-Carneiro nasceu no dia 19 de Maio de 1890. Morreu em 1916.)
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