Antigamente a caridade tinha dia certo, e era um descanso. Às sextas-feiras, vamos supor, os pobres andavam de porta em porta pedindo "uma esmolinha por alma de quem lá tem". Os pobres da parte de fora da porta eram uns desgraçados muito rotos e muito sujos e eram assim para se distinguirem dos pobres da parte de dentro da porta, que já tinham em cima da "cristaleira" umas moedinhas negras separadas e preparadas para a função. Éramos todos pobres, dum e doutro lado da porta, uns mais, outros menos, e, à falta de quem governasse por nós, em Lisboa ou na Câmara, nada mais nos restava senão sermos uns para os outros. Às sextas-feiras, vamos supor. O resto da semana não.
Naquele tempo os ricos tinham os seus próprios pobres, privativos, pessoais porém transmissíveis. Os pobres eram deixados em herança. Ter pobres por conta era, pelo menos em Fafe, inequívoco sinal exterior de riqueza. Para o senso comum, quantos mais pobres alguém tivesse mais rico era. Os pobres eram, portanto, uma necessidade da Nação para que os ricos prosperassem. Quantos mais pobres Portugal tivesse e quanto mais pobres fossem os pobres portugueses mais ricos seriam os nossos ricos e isso certamente era bom para o Produto Interno Bruto.
Isto é: a pobreza convinha-nos, aos pobres. A pobreza era o progresso da Nação. O regime ensinava-nos desde os bancos da escola que felicidade era sermos pobres mas honrados e termos as unhas das mãos sempre limpas. E isso deixava-me cheio de pena dos ricos, infelizes, principalmente dos ricos muito ricos que ainda por cima tinham as mãos sujas.
Sei bem do que falas Hernâni... também eu comi o pão dos pobres, algumas vezes ainda com restos de batom dos lábios dos ricos, outras vezes já amolecido pela 'água-benta'. Abraço amigo.
ResponderEliminarGrande abraço, grande Amigo!
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