terça-feira, 17 de julho de 2018

Altino do Tojal

Depois da aula, minha tia passava o resto da tarde a ler, à sombra de uma roseira, perto da velha escola.
Meu avô queria‑me consigo na cidade, mas ela opusera‑se:
- Reconsidere, papá. O miúdo é franzino, precisa de ar puro. Vê­‑lo‑á todos os fins de semana.
E solicitando a minha adesão com um olhar cúmplice:
- Queres ir para as terras dos gnomos,
Franganito?
Grande era a minha ânsia de espaços livres, de horizontes azuis. Reinar num quintal murado já não chegava.
Anuí.
Trinta e tal quilómetros de camioneta... uma receção triunfal, com narizes moncosos e ramos de flores silvestres... minha tia a descalçar os sapatos e a calçar sandálias, palmilhando veredas entre eucaliptos, com a criançada atrás, como uma galinha seguida pelos pintos... aquele riacho vadeado junto da azenha, às cavalitas do moleiro... os aromas resinosos, o voo das pegas, os chocalhos ao longe... a aparição dos campos, dos celeiros, das medas, do campanário da igreja, da branca aldeiazinha dos mortos...
Para fruir lances tão excelsos valia bem a pena aturar o despotismo de minha tia - a mais temida e amada das tias... e a mais fascinante!


"Os Putos", Altino do Tojal

(Altino do Tojal nasceu no dia 26 de Julho de 1939. Morreu no passado domingo.)

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