Fazei de conta que vos achais agora comigo no aprazível terraço do Passeio Público do Rio de Janeiro.
O dia foi calmoso. Em compensação, porém, a tarde é bela e fresca. O
sol derrama sobre a terra seus últimos raios. Anuncia-se a hora do
crepúsculo. A viração festeja docemente as verdes folhas das árvores que
sussurram com um leve ruído.
Imaginai tudo isso. Embalar-vos-ei com uma ficção que já tem sido e será mil vezes uma verdade.
Sentemo-nos nestes bancos de mármore e de azulejos. Voltemos as
costas para o mar. O espetáculo dessa natureza opulenta, grandiosa,
sublime, absorver-nos-ia em uma contemplação insaciável. Cerremos por
algum tempo os olhos à majestade das obras de Deus. A hora do crepúsculo
é suave, melancólica e propícia aos sonhos do futuro e às recordações
do passado.
Deixemos o futuro a Deus no céu e aos poetas na terra.
Lembremos antes o passado, e, ligados pelo mesmo pensamento, vamos
buscar no último quartel do século décimo oitavo o princípio da história
deste jardim público.
Suponhamos ainda e finalmente que por unanimidade de votos me
escolhestes para vosso orador: foi uma eleição inteiramente livre, sem
cabala, sem fósforos, sem intervenção da polícia, sem duplicatas, sem
anulações de votos fatais, um verdadeiro milagre constitucional. Tenho
consciência da pureza do meu mandato.
Falo em nome de todos vós.
"Um Passeio pela Cidade do Rio de Janeiro", Joaquim Manuel de Macedo
(Joaquim Manuel de Macedo nasceu no dia 24 de Junho de 1820. Morreu em 1882.)
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