terça-feira, 23 de junho de 2015

Joaquim Manuel de Macedo 3

Fazei de conta que vos achais agora comigo no aprazível terraço do Passeio Público do Rio de Janeiro.
O dia foi calmoso. Em compensação, porém, a tarde é bela e fresca. O sol derrama sobre a terra seus últimos raios. Anuncia-se a hora do crepúsculo. A viração festeja docemente as verdes folhas das árvores que sussurram com um leve ruído.
Imaginai tudo isso. Embalar-vos-ei com uma ficção que já tem sido e será mil vezes uma verdade.
Sentemo-nos nestes bancos de mármore e de azulejos. Voltemos as costas para o mar. O espetáculo dessa natureza opulenta, grandiosa, sublime, absorver-nos-ia em uma contemplação insaciável. Cerremos por algum tempo os olhos à majestade das obras de Deus. A hora do crepúsculo é suave, melancólica e propícia aos sonhos do futuro e às recordações do passado.
Deixemos o futuro a Deus no céu e aos poetas na terra.
Lembremos antes o passado, e, ligados pelo mesmo pensamento, vamos buscar no último quartel do século décimo oitavo o princípio da história deste jardim público.
Suponhamos ainda e finalmente que por unanimidade de votos me escolhestes para vosso orador: foi uma eleição inteiramente livre, sem cabala, sem fósforos, sem intervenção da polícia, sem duplicatas, sem anulações de votos fatais, um verdadeiro milagre constitucional. Tenho consciência da pureza do meu mandato.
Falo em nome de todos vós.

"Um Passeio pela Cidade do Rio de Janeiro", Joaquim Manuel de Macedo

(Joaquim Manuel de Macedo nasceu no dia 24 de Junho de 1820. Morreu em 1882.)

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