Longe de veredas e
povoações, a serra ondulava pedregosa e nua. Só aqui e além, ao fundo
das encostas ou por detrás dos cabeços, repousavam manchas macias de
terra lavrada. Donde e quem vinha lavrá-la parecia mistério em sítio tão
desolado e ermo. Toda a tarde caminharam, o Lambaça adiante, André
atrás. Nem uma só vez avistaram um ser humano. Não fora o sol derramando
luz no ar e nas coisas, não fora o ar límpido e leve, aquele deserto e
aquele silêncio seriam intoleravelmente opressivos. Assim, a serra
abria-se à intimidade, numa carícia tranquila e confiante.
Mas,
quando o sol começou a aproximar-se do horizonte, e os vales se diluíram
em penumbras, e os cabeços e rebolos estenderam as sombras, e o ar
começou a pesar de humidade e frio, então, sobranceira, a serra ganhou
subitamente nova grandeza, como que olhando os intrusos com hostilidade.
"Cinco Dias, Cinco Noites", Manuel Tiago
(Álvaro Cunhal, que usou o pseudónimo literário de Manuel Tiago, nasceu no dia 10 de Novembro de 1913. Faz hoje cem anos. Morreu em 2005.)
Senhor Hernâni gostava de ver um texto seu sobre "O Bolinhas" (vendedor de jornais).
ResponderEliminarAcho que é a pessoa mais indicada para o fazer.
Obrigado por nos fazer mergulhar na infância.
Abraço
João Carlos Lopes
Muito obrigado, caro amigo, pelo seu comentário. O João Carlos sabe que eu não sou senhor, sou Hernâni. E sou também um seguidor diário e admirador do seu trabalho por Fafe. Quanto ao que me sugere, falaremos por outra via.
EliminarAbraço,
h.