quinta-feira, 15 de agosto de 2019

António Nobre 6

Não repararam nunca?

Não repararam nunca? Pela aldeia,
Nos fios telegráficos da estrada,
Cantam as aves, desde que o sol nada,
E, à noite, se faz sol a lua cheia.

No entanto, pelo arame que as tenteia,
Quanta tortura vai, numa ânsia aiada!
O Ministro que joga uma cartada,
Alma que, às vezes, de Além-Mar anseia:

- Revolução! - Inútil. - Cem feridos,
Setenta mortos. - Beijo-te! - Perdidos!
- Enfim, feliz! - ? - ! - Desesperado. - Vem.

E as boas aves, bem se importam elas!
Continuam cantando, tagarelas:
Assim, António!, deves ser também.


"Só", António Nobre

(António Nobre nasceu no dia 16 de Agosto de 1867. Morreu em 1900.)

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