Foto Hernâni Von Doellinger |
Mudança de paradigma (ou de modelo...)
Ontem jogaram os croatas e os franceses e no fim não ganharam os alemães. Nem os brasileiros. Nem os argentinos. Nem os espanhóis. Nem os ingleses. Os cabeçudos do costume não chegaram sequer aos últimos jogos do Mundial e os italianos nem puseram os pés na Rússia, por indecente e má figura na qualificação. A final de Moscovo era uma bagatela desportiva, um evento turístico, folclore, bebedeira de vodka e televisão: toda a gente sabe que o futebol a sério terminou há coisa de dois meses, na varanda da Câmara Municipal do Porto. Todavia, por causa da introdução do VAR, por causa de umas meias-finais exclusivamente europeias, porque a Alemanha e o Brasil lerparam, e porque a França ergueu o seu segundo caneco, vinte anos depois e agora no estrangeiro, aposto um emprego em como, hoje, jornais e outros comentadores encartados vão fartar-se de descobrir que houve uma "mudança de paradigma" no futebol mundial. Como já aqui dei a entender, "mudança de paradigma", sendo uma expressão pletórica de concomitância e mais na moda era impossível, não quer dizer absolutamente nada. Não interessa para rigorosamente nada. Mas
faz-me lembrar pecados velhos. Recua-me à década de oitenta do século passado, ao cimo da Rua de 31 de Janeiro, onde havia uma casa de jogos de máquinas de flippers e afins que tinha uma cave com um altifalante fanhoso que, de uns quantos em quantos minutos, gritava cá para fora a curiosa frase "Mudança de modelo". Lá em baixo parece que havia umas raparigas muito jeitosas e nuas a fazerem não sei o quê e umas cabinas individuais e sebentas com ranhura para a clientela meter a moeda como nos flippers e espreitar por um vidro e fazer também não sei o quê. Sei muito pouco do assunto porque, palavra de honra, nunca lá pus os pés. E, agora que penso nisso, nem me lembro sequer porquê. Mas estou arrependido.
Informei-me. "Mudança de modelo", logo a seguir ao ding-dong de uma campainha de aeroporto, queria dizer, por exemplo, que a morena mamuda passava a pasta à loura pernalta e ia para os bastidores ler a Corín Tellado, e assim sucessivamente e vice-versa, mas decerto queria dizer também que os clientes tinham que fechar a braguilha o mais rapidamente possível e dar a vez a outros, que eram mais que as mães, sobretudo no intervalo de almoço. O speaker de serviço dizia "Mudaaaança de modeloooo" com um garbo só comparável ao do mestre-de-cerimónias do Circo Merito quando anunciava a sensacional "Maribelaaaa no seu rrrrrola-rolaaaa". Eu gostava: "Mudaaaança de modeloooo"! Parava em frente para ouvir, uma e outra vez, até à hora de voltar ao trabalho. E ria-me. Mais de trinta anos depois, leio e ouço a "mudança de paradigma". E também me faz rir, confesso, mas não me arrebita. Falta-lhe sustância...
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