Vivíamos os três numa pequena casa com uma varanda deitada sobre a rua, coberta com vinha. Ali minha avó passava as tardes de Verão a fazer meia ou a costurar. Ao certo não me recordo se costurava, mas suponho que sim, pois não me lembro de costureira alguma que a tivesse substituído nesse serviço. Mas seja como for: que fazia meia nunca o poderei esquecer. Vejo-a sentada na cadeira de espaldar, as agulhas a bater desembaraçadamente, enquanto observava o que se ia passando na rua. Tão acostumada estava a fazer meia que nem precisava de olhar. Aliás, as meias eram sempre pretas, infalivelmente pretas, fossem para ela própria, para o avô ou para mim. Por isso eu, apesar de tão pequena ainda, tinha de andar sempre de meias pretas. Isso arreliava-me, porque as crianças com quem convivia não usavam meias pretas e queria ser igual a elas. Cheguei a falar à avó nessa minha mágoa, mas respondeu-me:
- Não digas tolices, Rose. Se as outras crianças não usam meias pretas é porque as mães não sabem ser práticas e económicas. Duas palavras que, cedo, aprendi a detestar: prático e económico.
"O Mundo em que Vivi", Ilse Losa
(Ilse Losa nasceu no dia 20 de Março de 1913. Morreu em 2006.)
- Não digas tolices, Rose. Se as outras crianças não usam meias pretas é porque as mães não sabem ser práticas e económicas. Duas palavras que, cedo, aprendi a detestar: prático e económico.
"O Mundo em que Vivi", Ilse Losa
(Ilse Losa nasceu no dia 20 de Março de 1913. Morreu em 2006.)
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