Agustina Bessa-Luís
ocupou o cargo de directora de O Primeiro de Janeiro entre 1986 e 1987.
Digo bem: ocupou o cargo. Fazendo o favor a Diogo Freitas do Amaral, a
quem o jornal da portuense Rua de Santa Catarina tinha sido dado pela
família Pinto de Azevedo. Agustina entrou e mandou logo mudar de sítio a
secretária do gabinete da direcção, para poder apanhar solzinho nas
perninhas. É a grande marca do seu consulado. De resto, era bonito de se
ver aquela mulherzinha de carrapito e xaile ou lenço pelas costas,
sentada quase invisível, debruçada sobre o mesão, com os pés a meio
caminho do soalho, manuscrevendo laboriosamente numa letrinha
encarreirada que era preciso saber.
Agustina escrevia para o jornal uns "editoriais" extraordinários, que
eram tudo menos editoriais. Eram pérolas literárias, histórias, contos,
ensaios, que viam a luz do dia no cantinho superior esquerdo, ou talvez
direito, da primeira página.
A directora não sabia nada do jornal e o jornal também não queria saber
dela. Um dia o chefe de redacção entrou-lhe no gabinete perguntando-lhe o
que fazer com uma notícia eventualmente mais melindrosa e que agitava
na mão. É, antigamente as notícias viajavam em folhas de papel. "Eu não
sei nada disso", enxotou a directora, "vá falar com o chefe de
redacção". E o chefe de redacção disse "Com certeza, senhora directora",
e foi falar consigo mesmo, modalidade, aliás, em que era e ainda é
campeão.
Agustina deixou O Primeiro de Janeiro depois dos pascácios da
administração lhe terem feito a sacanagem de publicar, sem lhe dar
cavaco, uma edição apócrifa do jornal, a pedido das bolachas Triunfo. A
escritora exigiu a demissão dos administradores, que se mantiveram nos
seus lugares, agarrados ao tacho como lapas. Saiu ela.
Sei disto tudo e outro tanto porque conheço muito bem o tipo que revia
os "editoriais" de Agustina no velho Janeiro e que, vítima do efeito
dominó provocado pela renúncia da directora, acabaria por ter de tomar
conta da redacção. Conheço-o tão bem que é como se me visse ao espelho.
P.S. - Agustina Bessa-Luís faria hoje 99 anos.
Essa tua 'estória'para além de verdadeira é hilariante, e mais hilariante fica quando me lembro do tal chefe de redacção rrrrrrrrrrr.
ResponderEliminarForte abraço amigo Hernâni.
Abraço, Amigo Gaspar.
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