Só ele, Geraldo, um covarde. Que estranha natureza a sua, que lhe não permitia odiar em nome dos outros! Ter outras simpatias e aversões que não as suas? Os próprios ódios do pai nunca pudera endossá-los. O velho odiava os regatões, seus concorrentes desleais. Ele os amava, em segredo. Seu pai movia guerra de morte ao dono do seringal vizinho, porque no fundo o achava parecido com seu pai. Eram iguais na ação e na violência. Sim. Era o sangue dos nhengaíbas que lhe corria nas veias. Como sua mãe, não distinguia entre brancos, judeus, sírios, pretos e caboclos. Aceitava ou repelia instintivamente a cada um individualmente, mas não sabia compreender um ódio universal contra um povo, uma raça. Mas com quem estaria a razão e a justiça? Quem andaria certo? Devia ser os outros. Eles eram a maioria. Quem não aceita os ódios e as simpatias dos seus antepassados deve ser covarde. Mas, então, ninguém era como ele? Talvez Lore, pensou Geraldo. Quis duvidar, mas não pôde. Sim, Lore pensava como ele. Talvez não gostasse de judeus, mas a sua simpatia não ia ao ponto de querer queimar as obras de arte que eles produziam. Quando chegariam os tempos em que a humanidade se decidisse a cancelar os ódios do passado para começar uma vida nova?
"Um Rio Imita o Reno", Vianna Moog
(Vianna Moog nasceu no dia 28 de Outubro de 1906. Morreu em 1988.)
Sem comentários:
Enviar um comentário