O problema, agora, era aquele: desfazer-se dos cachorrinhos. Para o Padre Nazareno o caso assumia proporções graves. Não. Não podiam continuar aí. Brigavam a dentadas como se, em lugar de irmãos, fossem três bandidos. Negrinha não possuía nenhuma força moral perante suas crias. Seus latidos disciplinares, longe de pacificá-los, atiçavam-nos, fazendo-os retesar as patas dianteiras e fuzilar as pupilas. A barulheira exasperava os vizinhos. Chovia reclamações de toda a parte. Padre Nazareno andava zonzo.
Nelo, certa vez, botara a cabeça na cerca:
Olhe, padre, se você não acaba com essa ninhada, eu acabo jogando nela um cadinho de bronze fervendo.
Agora era procurar quem ficasse com eles.
Isso doía o coração de Nazareno. Chegara a amá-los como se fossem filhos. Suas preferências iam todas para um cotó, meio capenga, mas esperto e afetivo. Mal via o padre, corria aos pinotes abanando o toquinho de rabo, ganindo de contente.
Quieto, Sulfato!
Batizara-o com o nome de Sulfato. Não sabia por quê. Tinha o focinho rosado e úmido, um olhar de gente. Manifestava uma precocidade alarmante. Compreendia as mínimas palavras.
Olhe, Sulfato, se você me rasgar outra vez a batina, entrego você ao Tinoco. O Tinoco era o "homem do saco". Um pobre-diabo que vendia espigas de milho num saco de estopa. As mães, para assustar os filhos peraltas, afiançavam que ele raptava e carregava as crianças desobedientes naquele saco. À palavra "Tinoco", Sulfato, esperto e compreensivo, fugia e ia esconder-se debaixo do tanque. Duro, depois, para desentocá-lo.
"Salomé", Menotti del Picchia
(Menotti del Picchia nasceu no dia 20 de Março de 1892. Morreu em 1988.)
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