Sentado, as pernas cruzadas, uma das mãos no bolso e a outra a brincar com o lápis, Giovanni Fazio observa os passos, para diante e para trás, dum casal de ingleses. Ele - chamar-te-ás John, decidiu - recuara dois ou três metros, e ela - Mary - dirigia-se devagar para os degraus do palácio, sob o olhar indiferente da estátua de David. Encostou-se ao pedestal, tirou o lenço da cabeça e olha para o marido. Este baixa-se um pouco, aponta demoradamente a máquina e dispara por fim.
Mary virara-se outra vez de costas e Giovanni quis adivinhar-lhe a direcção dos olhos, acompanhá-los depois no voo extasiado que terminava na torre do Palazzo Vecchio. Mas o marido gritara qualquer coisa interrogativa, ela deu meia volta e viu John, que agitava um braço e abria e fechava a boca. Dizendo o quê? E Mary aproxima-se novamente do David, regressando o marido à posição anterior, a máquina preparada. Talvez o primeiro retrato fique melhor do que o segundo, murmura Giovanni, como se fosse ele o fotógrafo.
Depois as situações inverteram-se: o marido posou então para a imortalidade. Em Florença - dirá aos amigos, de regresso a Londres, e indicando a fotografia. Ah! - exclamarão eles, amavelmente.
Porquê? Porquê? O desejo insensato de falar com aqueles desconhecidos. Desconhecidos e talvez ridículos, assim, a tirar fotografias! E, enquanto bebe o café escaldante, continua a persegui-los com o olhar.
"A Cidade das Flores", Augusto Abelaira
(Augusto Abelaira nasceu no dia 18 de Março de 1926. Morreu em 2003.)
Sem comentários:
Enviar um comentário