segunda-feira, 6 de maio de 2013

Malba Tahan

Todos os dias, ao nascer do sol, levava para o campo o grande rebanho e era obrigado a trazê-lo ao abrigo antes de cair a noite. Com receio de perder alguma ovelha tresmalhada e ser, por tal negligência, severamente castigado, contava-as várias vezes durante o dia.
Fui assim adquirindo, pouco a pouco, tal habilidade em contar que, por vezes, num relance calculava sem erro o rebanho inteiro. Não contente com isso, passei a exercitar-me contando os pássaros quando, em bandos, voavam pelo céu afora. Tornei-me habilíssimo nessa arte.
Ao fim de alguns meses - graças a novos e constantes exercícios -, contando formigas e outros pequeninos insetos, cheguei a praticar a proeza incrível de contar todas as abelhas de um enxame! Essa façanha de calculista, porém, nada viria a valer, diante das muitas outras que mais tarde pratiquei! O meu generoso amo possuía, em dois ou três oásis distantes, grandes plantações de tâmaras e, informado de minhas habilidades matemáticas, encarregou-me de dirigir a venda de seus frutos, por mim contados nos cachos, um a um. Trabalhei, assim, ao pé das tamareiras, cerca de dez anos. Contente com os lucros que obteve, o meu bondoso patrão acaba de conceder-me quatro meses de repouso e vou, agora, a Bagdá, pois tenho desejo de visitar alguns parentes e admirar as belas mesquitas e os suntuosos palácios da cidade famosa. E, para não perder tempo, exercito-me durante a viagem, contando as árvores que ensombram esta região, as flores que a perfumam, os pássaros que voam no céu entre nuvens.
E, apontando para uma velha grande figueira que se erguia a pequena distância, prosseguiu:

- Aquela árvore, por exemplo, tem duzentas e oitenta e quatro ramos. Sabendo-se que cada ramo tem, em média, trezentas e quarenta e sete folhas, é fácil concluir que aquela árvore tem um total de noventa e oito mil, quinhentas e quarenta e oito folhas! Estará certo, meu amigo?
- Que maravilha! - exclamei atônito. - É inacreditável possa um homem contar, em rápido volver d’olhos, todos os galhos de uma árvore e as flores de um jardim! Tal habilidade pode proporcionar, a qualquer pessoa, seguro meio de ganhar riquezas invejáveis!
- Como assim? - estranhou Beremiz. - Jamais me passou pela idéia que se pudesse ganhar dinheiro contando aos milhões folhas de árvores e enxames de abelhas! Quem poderá interessar-se pelo total de ramos de uma árvore ou pelo número do passaredo que cruza o céu durante o dia?


"O Homem que Calculava", Malba Tahan

(Júlio César de Mello e Souza, conhecido pelo heterónimo Malba Tahan, nasceu no dia 6 de Maio de 1895. Morreu em 1974.)

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