sábado, 18 de fevereiro de 2017

Crónicas de Matosinhos (para rasgar antes de ler) 18

Foto Hernâni Von Doellinger

Fábula em 152 caracteres (com espaços)
No tempo em que os animais falavam, o cão disse: ão, ão, ão. E o gato perguntou: és gago ou quê, ó chien de merde? O gato era, com efeito, poliglota.

Era uma vez um cão
Havia um cão que tinha um dono muito bem mandado. Obediente, brincalhão, carinhoso, esperto - só lhe faltava ladrar...

Quem me dera ser cão
"Portugueses já gastam mais com cães do que com bebés", dizia a capa do semanário Expresso. Acontece no país certo.
 
Vida de cão, vida de cão
"Cão deixado no lixo dentro de um saco gera onda de solidariedade em Vila Real", anunciava o jornal Público, em título fim-de-semaneiro. E acrescentava: "Plataforma Proanimal alerta que nesta altura do ano há mais animais abandonados e menos pessoas disponíveis para os acolher."
Verdade como punho, ontem como hoje. Embora não gere nenhuma "onda de solidariedade", está curiosamente a acontecer o mesmo com os velhos e com os recém-nascidos, por assim dizer, humanos - cada vez mais abandonados e com cada vez menos pessoas disponíveis para os acolher. É. Vivemos realmente uma "altura do ano" filha da puta. Mas os cãezinhos, Senhor...

Meia dose de xenofobia
A chinesinha descia a rua em direcção à praia, e levava o cão pela trela. Achei aquilo tão esquisito. Como se eu levasse a passear um frango de churrasco.

O meu cão
Eu tenho um cão imaginário. Chama-se Parkinson, porque quando quero chamar por ele nunca me lembro do nome Alzheimer. A raça do meu cão tem dias, vantagem de ser imaginário: às segundas é perdigueiro, às terças é labrador, às quartas é são bernardo, às quintas é pastor alemão, às sextas é dálmata e aos fins-de-semana é sobretudo rafeiro. O meu cão nasceu no país certo.
O meu cão fica-me muito em conta. Não come mas cala, dispensa vacinas e vitaminas, nunca vai ao veterinário, não precisa de casota nem de agasalhos para o Inverno, e só me custa o preço da trela. O meu cão conhece o dono e não morde a mão que não o alimenta. Se todos fôssemos cães assim, vínhamos mesmo a calhar por exemplo aos senhores do PSD e do CDS.
O meu cão faz-se muito bem de morto e corre atrás de qualquer bugiganga que lhe atire. Só lhe falta falar. O meu cão não ladra às pernas das pessoas nem fornica com as pernas do dono, não abocanha, não caga no passeio, não mija nos pneus do carro do vizinho, não tem pulgas nem chatos, nem anda por aí a emprenhar cadelas mais ou menos oferecidas. É como se não existisse. O meu cão é um exemplo de cidadão.
Já mo quiseram comprar e eu não o vendi. Foi um vendedor de empregos imaginários: dava-me dois-extraordinários-empregos-dois em troca do meu cão simplesmente. Nã!... Antes quero o cão.

A realização do homem no século XXI
Adoptar um cão, comprar um bonsai e escrever no Facebook.

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