sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Fredinho Bastos

Eu ia ver o Rali com o Fredinho Bastos. O Rali era um acontecimento emocionante por que esperávamos um ano inteiro e que se dividia em três partes, como jogo e meio de futebol: a viagem até à Lagoa, sempre em rali a partir de Medelo, a passagem do rali propriamente dito, que para nós os dois acabava logo após o sétimo ou oitavo carro, e a merenda que se seguia, nem que chovessem canivetes. Eu, por mim, ficava a ver o resto dos concorrentes até ao fim, mas o Fredinho fazia questão de me ensinar a relatividade das coisas e a prioridade de umas sobre outras. "O rali já acabou, isto agora não é nada. Vamos mas é comer", dizia todos os anos, sem querer saber sequer a minha opinião. E lá íamos atacar o farnel, preparado com todo o carinho pela sua mulher - uma Senhora a quem devo muito mais do que apenas bolinhos de bacalhau e panados, aliás excelentes.
Fazíamos o caminho de regresso até ao carro pela estrada do troço de competição, encostando à berma quando se aproximava o roncar de mais um motor, mas (o Fredinho tinha razão) aquilo era só bazófia, muito roncar e pouco motor. Dava tempo para tudo. Até para cumprimentar pilotos e penduras da segunda metade da tabela, que estavam no largo da famosa Igreja de Nossa Senhora das Neves ainda à espera da ordem de saída. O Fredinho conhecia aquela malta toda. Ele, Alfredo Bastos, também tinha sido corredor de ralis.
Portanto sabia que, depois de Jean-Luc Thérier, Rafaello Pinto, Markku Alen, Hannu Mikkola (com Jean Todt, o actual presidente da FIA, como navegador), Ove Andersson, Sandro Munari, Bjorn Waldegaard, Jean Pierre Nicolas, Walter Röhrl ou Michèlle Mouton, pouco mais havia que realmente interessasse ver. As bombas já tinham passado: os Alpine Renault, os Fiat 124 Abarth, os belíssimos Lancia Stratos, os Fiat 131 Abarth, os Audi Quattro e até o Opel Ascona, que em Portugal, antes do 25 de Abril, se chamava Opel 1904 SR por causa da moral e dos bons costumes. Isto que não saia daqui, mas os que vinham a seguir a estes andavam menos do que nós...
Nós íamos no Vauxhall Viva GT, verde e cinza, com que eu tinha visto o Fredinho correr a Rampa da Penha, uns anos antes. O carro, preparado pelo Valdemar "Mecânico", ou "Paredes", ainda mantinha as barras de protecção e os assentos e volante de competição. Era de uma incomodidade dolorosa, porque andávamos sempre nas horas, e de lado, mas extremamente seguro. Diziam ao Fredinho que ele conduzia muito bem. Ele respondia: "Toda a gente conduz bem até bater. Eu também".
O Rali em Fafe era a Lagoa e era um mundo. Só anos depois é que apareceram as outras classificativas, creio que "inventadas" pelo próprio Fredinho, que as terá sugerido e mostrado aos organizadores da prova. Soube-se ontem que o Rali vai regressar a Fafe, a casa, no próximo ano, embora apenas para uma sessão de espectáculo no troço Fafe/Lameirinha. E eu lembrei-me do Fredinho.

8 comentários:

  1. AVISO
    Parece que alguns leitores do Tarrenego! não conseguem, de novo, colocar os seus comentários. Peço-lhes desculpa e deixo-lhes à disposição o meu endereço de e-mail:
    hernani.doellinger@hotmail.com

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  2. Não te passa pela cabeça as saudades que tenho desses tempos em que, ora elemento de equipas de controlo ou simples espectador, seguia o rali (quase) de princípio até MESMO ao fim...
    JA

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  3. Por acaso até passa, caro JA. Lembrei-te também de ti.
    (E o que é que estás a fazer a pé a esta hora da madrugada?)
    Grande abraço. Beijinhos às meninas.
    h.

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  4. Embora pequeno na altura, conheci o Fredinho pessoalmente e que bom HOMEM ele era. Faz parte das boas lembranças que tenho de Fafe, alias era um ponto de referencia nas conversa que manhtinha com o meu Pai acerca de velocidades e condutores.Acima de tudo recordo o ir ao lado dele meter combustivel nos carros da bomba. Sim esse piloto era motorista da nossa Bomba, e recordo que afinal deixou de conduzir bem quando ao estacionar uma ambulancia Peugeot 404 ( NR-18-93 )tocou com o vidro do pisca traseiro esquerdo e partiu. Mal saiu da viatura referiu : PRONTOS. CONDUZI BEM ATE HOJE! BATI COMO OS OUTROS! O meu Pai nao se cansava de me contar esta historia de exemplo de humildade.
    Obrigado Nane mais uma vez por recordar coisas boas.
    Miguel

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  5. Obrigado, Miguel, pela visita e pelo comentário.

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  6. Hernâni
    Parabéns por este belíssimo texto, (mais um) sobre a Terra que te serviu de berço e as suas Genuínas Gentes.
    Se o Poder Autárquico, ou os agentes culturais de Fafe não estiverem atentos ao Tarrenego, então estamos muito pior do que pensamos.
    Quanto ao Rali, recordo-me de ter sido destacado para um ou dois, mas acho que em Fafe não estive. Mas sempre me impressionou o comportamento dos mais aficionados que, assim que passavam os primeiros classificados encetavam divertida caminhada pelo meio da nuvem de pó deixada pelos bólides, correndo ou saltando sempre que se aproximava um qualquer Fredinho Bastos.
    Gaspar de Jesus

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  7. Obrigado, Gaspar, pela visita e pelo comentário. Já não sei onde colocar os galhardetes que me mandas. É que eu nem faço colecção!
    Grande abraço,
    h.

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  8. Recomendo a leitura:
    http://blogmontelongo.blogspot.pt/2014/03/conhece-historia-dos-trocos-de-fafe.html

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