Houve
um tempo em que Fafe era o fim do mundo. Tenho testemunhas. Gente que
se metia no comboio em Ouagadougou ou em Anchorage, vamos um supor, às
tantas desprecatava-se, passava pelas brasas e quando acordava já estava
em Fafe, porque não havia volta a dar, o mundo acabava ali, numa parede
à frente do nariz, rés-do-chão da Rua do Retiro. Era também o fim da
linha da CP. Ou o princípio, consoante o ponto de vista. Mas, chegando a
Fafe, saía-se do comboio e da estação, subia-se a rampa até ao Zé da
Menina, respirava-se fundo, olhava-se para o Largo e fazia-se vida. Se
forem num instante à minha terra, ainda vão encontrar quem conte como
fez. Perguntem ao Gino.
Depois a automotora começou a madrugar só para mim, para me trazer ao namoro ao Porto e tornar-me a casa à noite, Fafe desistiu do comboio e queixou-se muito quando lho "tiraram".
Hoje o fim do mundo é em Guimarães. É lá que está o muro. Para além dali, nada. É um fim do mundo indoor, asmático e com luzinhas de discoteca, uma boa merda à beira do nosso fim do mundo antigo, que era outra categoria - ao ar livre, com couves, tomates, cheiro a alfádega e só saúde. Ainda por cima, o nosso fim do mundo era feminino: dizia-se em Fafe, não sei explicar porquê, "a" fim do mundo.
O mundo está, portanto, mais pequeno. Isto é científico. Mingou 14 quilómetros. Este aperto mundial, de mais a mais num tempo em que os bons vão caindo como tordos, daria jeito para que nos aconchegássemos um bocadinho, trocássemos olás de boca, para que nos abraçássemos se fosse o caso, e no entanto apartamo-nos cada vez mais uns dos outros, de cabeças enfiadas em caixinhas de cores com teclas ou figurinhas de arrastar com os dedos. E agora é a pandemia a afastar-nos. Parece que estamos oficialmente proibidos uns dos outros.
Ia-me esquecendo: a outra conclusão a tirar, e igualmente científica, é que Fafe já não é deste mundo.
Depois a automotora começou a madrugar só para mim, para me trazer ao namoro ao Porto e tornar-me a casa à noite, Fafe desistiu do comboio e queixou-se muito quando lho "tiraram".
Hoje o fim do mundo é em Guimarães. É lá que está o muro. Para além dali, nada. É um fim do mundo indoor, asmático e com luzinhas de discoteca, uma boa merda à beira do nosso fim do mundo antigo, que era outra categoria - ao ar livre, com couves, tomates, cheiro a alfádega e só saúde. Ainda por cima, o nosso fim do mundo era feminino: dizia-se em Fafe, não sei explicar porquê, "a" fim do mundo.
O mundo está, portanto, mais pequeno. Isto é científico. Mingou 14 quilómetros. Este aperto mundial, de mais a mais num tempo em que os bons vão caindo como tordos, daria jeito para que nos aconchegássemos um bocadinho, trocássemos olás de boca, para que nos abraçássemos se fosse o caso, e no entanto apartamo-nos cada vez mais uns dos outros, de cabeças enfiadas em caixinhas de cores com teclas ou figurinhas de arrastar com os dedos. E agora é a pandemia a afastar-nos. Parece que estamos oficialmente proibidos uns dos outros.
Ia-me esquecendo: a outra conclusão a tirar, e igualmente científica, é que Fafe já não é deste mundo.
P.S. - Publicado originalmente no dia 23 de Novembro de 2013. No dia 25 de Março de 1977 a Companhia de Caminhos-de-Ferro Portugueses, SARL passa a CP, empresa pública. Nesse mesmo dia realiza-se a última viagem comercial de uma locomotiva a vapor, em via larga, em Portugal. A espécie de onomatopeia do título era muito usada no tempo em que havia comboio.
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