domingo, 6 de outubro de 2019

Um país de luxo para cidadãos de lixo

Foto Hernâni Von Doellinger

Só nos primeiros seis meses do ano foram apresentados 166 novos projectos de hotéis em Portugal, conta o JN. Cento e sessenta e seis, repito e por extenso, que a enormidade do número faz por merecer. Há dezoito investimentos em carteira para o Porto e treze para Lisboa. Vila Nova de Gaia vai ter a maior obra do País e a minha rua, em Matosinhos, já é ela por ela para alojamento local.
Nos princípios de 2018, havia 450 mil casas sobrelotadas e 2,5 milhões de casas subaproveitadas. Havia mais de 735 mil casas vazias, umas caindo de velhas, outras ainda por estrear. Em Portugal havia - e há - cada vez mais portugueses sem dinheiro para pagarem ao banco a prestação da casa. Os portugueses devolvem a casa ao banco, sem ondas e sem suicídios. Em Portugal não há dinheiro para ajeitar a vida dos portugueses. E há cada vez mais portugueses morando no olho da rua. É. O País constrói-se para as visitas.
Portugal de luxo, Portugal de lixo. Um site oficial do Governo exultava: "A Pousada do Porto, instalada no Palácio do Freixo, acabou de entrar na prestigiada e exclusiva rede The Leading Hotels of the World. Só os mais luxuosos, prestigiados e sofisticados hotéis são admitidos na referida listagem de apenas 430 unidades em todo o mundo."
Prestigiada e exclusiva, luxuosa, outra vez prestigiada e sofisticada. A Pousada. Um mundo...
Portugal tinha então cinco hotéis na lista dos 100 melhores do mundo, e em 2012 era português o melhor hotel da Península Ibérica e o melhor pequeno hotel de luxo da Europa era em Lisboa. Em Portugal havia mais de 40 hotéis de luxo. Hoje em dia devem ser mais que as mães.
E há também mais de três milhões de pobres, meio milhão de trabalhadores a salário mínimo, um milhão e meio de desempregados ou mais, entre os registados e os desarriscados, e milhares e milhares e milhares de sem-abrigo, ninguém sabe ao certo quantos. No Portugal de lixo multiplicam-se os chalés de luxo como o do retrato.

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