Foto Hernâni Von Doellinger |
Os velhos cinemas, que é deles?
O cinema foi sempre a coisa mais importante da minha vida até deixar de ser. Creio que a última vez em que entrei numa sala de cinema levava pela mão o meu filho para vermos "O Rei Leão", portanto no Verão de 1994 e lamentavelmente era a versão portuguesa.
Comecei cedo, ainda de calças curtas e a dar uso na leitura das legendas às primeiras letras que trazia aprendidas da escola. Era o tempo do cinema ao ar livre na parada das traseiras dos velhos Bombeiros, na Rua José Cardoso Vieira de Castro, entre os dois palacetes. Debaixo da escadaria do quartel foi montada uma espaçosa e saudável cabina de projecção, toda ela feita em lusalite, e o terreiro enchia-se de cadeiras. O operador era o Porinhos, se não me engano, eu via os filmes de camarote, isto é, da janela do quarto do meu padrinho e tio Américo derivado à ausência de idade, depois o cinema acabou sem mais nem menos, a parada lá ficou, como o próprio nome indica, e o barraco, de tão jeitoso, aproveitou-se para arrecadação das tralhas do meu avô.
Ainda em Fafe, mais tarde, tornei-me ferrinho do Teatro-Cinema, andei pelas aldeias com o Pimenta, de catrel e altifalantes, a anunciar os "magníficos" filmes que, pelo Verão, passavam no campo de futebol e eram tão fraquinhos, frequentei bissextamente o salão inacabado do Martinho da Granja, se a memória não me atraiçoa, e fui uma ou duas vezes ao Estúdio Fénix. Entretanto, levado pela vida, tinha-me virado para Braga - São Geraldo e Teatro-Circo -, e para Guimarães - São Mamede e Jordão. Vi cinema, de forma avulsa e por exemplo, em Vila Real, Figueira da Foz, Amadora, Lisboa, Dublin ou Bordéus, onde estivesse e pudesse.
Instalei-me no Porto e não me escapou um: Águia D'Ouro, Batalha, Carlos Alberto, Charlot, Coliseu, Estúdio, Estúdio Foco, Estúdio 400, Júlio Dinis, Lumière, Nun'Álvares, Olímpia, Passos Manuel, Pedro Cem, Rivoli, Sá da Bandeira, Terço, Trindade, Vale Formoso e até o Vitória, na Circunvalação mas tecnicamente do lado de Rio Tinto, Gondomar.
E agora, que é deles? Onde estão os cinemas do Porto? Partiram todos em tournée? E tornarão? Eu sei que também não vou ao cinema há 25 anos, mas a culpa não é minha. É do meu filho, que cresceu depressa demais.
De Paris, com amor
Foto Hernâni Von Doellinger |
Os franceses são uns exagerados. Os parisienses abusam. E se o assunto for o amor, l'amour, então é que ninguém os atura. Compreende-se: os parisienses são os únicos que realmente têm sempre Paris. "Casablanca" é omisso quanto a aloquetes (cadeados, se lido em Lisboa). Não se sabe, por isso, se Rick e Ilsa se juraram aferrolhadamente um ao outro numa qualquer ponte da Cidade Luz e deitaram a chave ao rio, como agora se usa, mas vamos admitir que sim. Era bonito ter começado dessa maneira, no Sena, a moda que por acaso até já chegou cá, graças a Deus temperada com recato e parcimónia, como convém a um país de brandos costumes.
(Publicado originalmente no dia 23 de Maio de 2012)
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