A imagem
Esperar a imagem. Queimar o incenso,
Deixar a luz entrar na casa,
Escolher as melhores cores, fixar a seda branca,
Esperar que a imagem cresça no silêncio.
Era assim que fazia Kuo Hsi.
Além dos tons de branco,
O azul da azurite ou "Azzurra della Magna",
O vermelho da poeira de coral, o amarelo do pavão,
O verde da malaquite, o vermelho fulgurante do cinábrio,
Todas as cores, primeiro expectantes,
Eram gritos no acto da criação.
Mas, querido Mestre Kuo Hsi,
No nosso mundo, as imagens não nascem enquanto o incenso arde.
Quando não se escondem, deixando apenas cactos e poeira,
Irrompem com furor na noite escura,
E, sílaba a sílaba, lágrima a lágrima,
derramam-se sobre o papel, não sobre a seda branca.
Por vezes, acompanha-as o vento das estrelas,
Que sucede ao vento solar,
Com memórias do gelo dos anéis de Saturno
E da Grande Mancha Vermelha de Júpiter.
Porém, quase sempre nascem mais perto,
Dubrovnik sob as bombas, o Arboretum em chamas,
Sarajevo, a Somália, o sangue, e o sono de Deus,
As águas da Normandia e os muitos deuses da guerra.
Um lugar mágico por vezes, o café de Rick,
E mágicos também os écrans azuis dos computadores,
L.A. ao romper do dia, o Harlekin de Stockhausen,
Um cavaleiro através da névoa,
O Tejo outrora tão verde em Toledo.
Mas sempre a ameaça do vento nos gélidos caminhos,
Não obstante Proust, o feiticeiro do tempo,
A cadeia da criação, Picasso, Rilke e a Quinta Elegia,
A tinta castanha de Da Vinci.
Oeste, terra dos mortos, dizem os egípcios.
O grito é de Munch.
"Quinteto para o Império do Meio", Maria Amélia Neto
(Maria Amélia Neto nasceu no dia 30 de Outubro de 1928)
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