sábado, 8 de julho de 2023

Fafe, a las cinco de la tarde

Foto Juan Carlos Cardenas/Lusa

E quem cuidava que não, pois que se desengane: Fafe também foi aos touros. No Campo da Granja, em 1963, provavelmente por ocasião das Festas da Senhora de Antime, que é o mais certo, mas também poderá ter sido por alturas das Feiras Francas, lembro-me é que era um belo dia de sol e, agora que penso nisso com mais vagar, não faço a mínima ideia de como é possível lembrar-me. Uma tourada que terá sido a primeira realizada em terras de Fafe e que, se não me engano, foi igualmente a única, até hoje, com touros propriamente ditos. O redondel não era assim tão redondo como o nome poderia indicar à partida: digamos que foi construída, com robustos troncos de madeira, uma espécie de lua cheia fanada, cortada em linha recta na zona da bancada, que era para o excelentíssimo público poder estar em cima do acontecimento. As digníssimas autoridades locais e a nossa mais distinta burguesia, orgulhosamente alapadas na bancada de cimento com tecto de zinco, quero crer que com umas discretas almofadinhas aliviando os respectivos traseiros, e o povo a pé, no meio do campo da bola, encostado às tábuas, mas seria muito pouco, meio dúzia de gatos-pingados, se tanto, e eventualmente já razoavelmente decilitrados, porque os bilhetes, mesmo os bilhetes mais baratos, eram caros como o caralho. Foram certamente ao engano e, diga-se em sua defesa, o calor era realmente muito e a situação deveras incómoda e eventualmente perigosa. Se naquele tempo já havia praças de toiros desmontáveis e alugáveis, não foi daquela vez que uma delas chegou a Fafe.
A tourada, segundo me lembro, e confesso que continuo sem perceber como é que me lembro, foi uma merda. Compreendo portanto que a autarquia fafense vire as suas modernas prioridades para outras lides. Para as chegas de bois, para as largadas de perdizes, para as montarias ao javali, para as exposições e concursos de beleza canina ou columbófila, para as corridas de cavalo a passo travado e de salto alto, para as batidas à raposa, que é o que nos faz falta. Um destes dias ainda tornaremos, se Deus quiser, à nossa ancestral porém nunca desmentida caça aos gambozinos, com organização camarária, estacionamento gratuito, pequeno-almoço, almoço, merenda, jantar e tudo. Tenho uma fé muito grande nos nossos conspícuos guiadores e guiadoras, quem dera que não chova, e olé!

Por outro lado. A malta mais nova se calhar não faz ideia da revolução que é ter espectáculos à borla, como acontece hoje em dia, nomeadamente nas Festas da Cidade, e só tenho a elogiar a autarquia por isso. Antigamente, e naquele tempo a pobreza era modo de vida, regra geral, em Fafe pagava-se por tudo e por nada. Só faltava andarem os fiscais da Câmara a passar bilhete, no Largo e em Cima da Arcada, a quem fosse apanhado a olhar para o fogo-preso do Jardim do Calvário...

P.S. - "A las cinco de la tarde", agora assunto sério, é um dos mais conhecidos textos de Federico García Lorca. "La cogida y la muerte", assim se chama de origem o poema, no livro "Llanto por Ignacio Sánchez Mejías".

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