A velha suspirou:
- Se o Adroaldo fosse vivo, hoje estaria fazendo sessenta e oito anos.
O marido corrigiu sem pressa:
- Sessenta e sete, minha velha. Ele nasceu em 1911, numa quarta-feira. Era um feriado qualquer, eu não consigo me lembrar bem que feriado, mas era dia de ninguém trabalhar.
Dirigiu-se à cômoda onde estava o retrato do filho, em sépia, descolorido, arranhado. Era um jovem revolucionário de 30, entre dois companheiros, tendo ao fundo as grandes rodas inteiriças de uma locomotiva maria-fumaça. Os três riam descontraídos. Ao pé deles um cão branco com manchas escuras dormia, enrodilhado. O velho passou os dedos engelhados pela foto.
- O nosso Adroaldo - foi só o que pôde dizer.
- Te lembras de como a gente recebeu a notícia da morte do menino, na Revolução de 30, quando o batalhão dele andava pelos lados de Itararé? - ela fez uma pausa. - Itararé fica para os lados de São Paulo, não é?
- Fica - confirmou o velho depois de retornar à cadeira de balanço forrada com um velho pelego descolorido pelo tempo.
Perguntou se ainda tinham o suficiente para o mate de todos os dias; não custava nada fazer uma espera na estrada, em geral deserta, na tentativa de encontrar um viajante qualquer e pedir que arranjasse um pouco de erva ou que a mandasse por um outro que viesse de torna-viagem. Só um pouco de erva. A velhinha foi até o armário de portas envidraçadas, torceu a chave e tirou lá de dentro uma grande lata quadrada. Depois de calcular a quantidade pelo peso, recolocou-a no lugar e fechou novamente a porta.
- Tem menos de um quilo.
- Economizando bem a gente ainda tem erva para duas semanas.
- Se o Adroaldo fosse vivo, hoje estaria fazendo sessenta e oito anos.
O marido corrigiu sem pressa:
- Sessenta e sete, minha velha. Ele nasceu em 1911, numa quarta-feira. Era um feriado qualquer, eu não consigo me lembrar bem que feriado, mas era dia de ninguém trabalhar.
Dirigiu-se à cômoda onde estava o retrato do filho, em sépia, descolorido, arranhado. Era um jovem revolucionário de 30, entre dois companheiros, tendo ao fundo as grandes rodas inteiriças de uma locomotiva maria-fumaça. Os três riam descontraídos. Ao pé deles um cão branco com manchas escuras dormia, enrodilhado. O velho passou os dedos engelhados pela foto.
- O nosso Adroaldo - foi só o que pôde dizer.
- Te lembras de como a gente recebeu a notícia da morte do menino, na Revolução de 30, quando o batalhão dele andava pelos lados de Itararé? - ela fez uma pausa. - Itararé fica para os lados de São Paulo, não é?
- Fica - confirmou o velho depois de retornar à cadeira de balanço forrada com um velho pelego descolorido pelo tempo.
Perguntou se ainda tinham o suficiente para o mate de todos os dias; não custava nada fazer uma espera na estrada, em geral deserta, na tentativa de encontrar um viajante qualquer e pedir que arranjasse um pouco de erva ou que a mandasse por um outro que viesse de torna-viagem. Só um pouco de erva. A velhinha foi até o armário de portas envidraçadas, torceu a chave e tirou lá de dentro uma grande lata quadrada. Depois de calcular a quantidade pelo peso, recolocou-a no lugar e fechou novamente a porta.
- Tem menos de um quilo.
- Economizando bem a gente ainda tem erva para duas semanas.
"Enquanto a Noite Não Chega", Josué Guimarães
(Josué Guimarães nasceu no dia 7 de Janeiro de 1921. Morreu em 1986.)
(Josué Guimarães nasceu no dia 7 de Janeiro de 1921. Morreu em 1986.)
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