Esbraguilhado, de acordo com a definição dicionária, é o tipo que "tem a braguilha desabotoada". As braguilhas há que anos não são de botões, mas não posso negar que umas quantas vezes já saí de casa com a ferramenta a arejar, esquecido completamente de puxar o fecho-éclair para cima, por pressa ou por idade - ainda não cheguei a uma conclusão. No entanto, foram acasos, excepções, eu morra aqui se não é verdade. Nesse sentido, portanto, não me vejo como um genuíno esbraguilhado.
Porém. Esbraguilhado também quer dizer o tipo que anda "com fralda da camisa saída". E aqui sou eu, todo e completo: esbraguilhado de corpo inteiro, que não meto as fraldas para dentro há mais de quarenta anos, nem nos dias raros e cerimoniosos de uso de casaco. Jamais.
Bela palavra, esbraguilhado. Nunca lhe tinha posto a vista em cima, até ontem e por acaso, apesar de a língua portuguesa ser uma paixão e o meu ofício. O amor e o respeito pela nossa língua foram-me ensinados primeiro pela minha mãe - analfabeta por culpa da vida, e sábia graças a Deus. A minha mãe corrigia-me a leitura, emendava-me as palavras, eu de cabeça enfiada nos livrinhos fascistas da primária, na mesa da nossa sala que era também o quarto dos meus pais logo à entrada da casinha do Santo Velho, e a minha mãe a ensinar-me Português. Ela não sabia ler nem escrever, e eu achava aquilo extraordinário. Ainda hoje acho aquilo extraordinário. Um milagre.
Depois tive a sorte de me calhar o professor Correia (Toninho da Cafelândia, se não me engano), que me levou da segunda à quarta classe na Escola Conde Ferreira, tive os extraordinários mestres do seminário, o professor Alberto Alves, que me ensinava livros na Biblioteca Gulbenkian de Fafe, o velho professor Horácio, meu chefe e amigo na revisão do Janeiro. Todos me ensinaram a pedir licença e a tratar com carinho a língua portuguesa. Puxaram pelo melhor de mim, sem estragarem o que a minha mãe tinha feito. Aprendi.
Aprendi, por exemplo, a ter dúvidas quando escrevo. Quem não tem dúvidas, tende a escrever asneiras. E eu não sei escrever sem o dicionário, o livro, ao lado; não sei escrever sem a enciclopédia, os livros, ao lado. Molho o dedo, gesto antigo, vou lá ver se é com ésse ou com zê, se a palavra que escolhi quer dizer exactamente aquilo que eu quero dizer - e ainda assim asneio.
Foi num destes exercícios que descobri ontem a palavra esbraguilhado e gostei dela. E, à falta de melhor assunto, veio-me a memória. Ou então sou só eu a dar uso às palavras, que é para o que o Tarrenego! me serve.
Porém. Esbraguilhado também quer dizer o tipo que anda "com fralda da camisa saída". E aqui sou eu, todo e completo: esbraguilhado de corpo inteiro, que não meto as fraldas para dentro há mais de quarenta anos, nem nos dias raros e cerimoniosos de uso de casaco. Jamais.
Bela palavra, esbraguilhado. Nunca lhe tinha posto a vista em cima, até ontem e por acaso, apesar de a língua portuguesa ser uma paixão e o meu ofício. O amor e o respeito pela nossa língua foram-me ensinados primeiro pela minha mãe - analfabeta por culpa da vida, e sábia graças a Deus. A minha mãe corrigia-me a leitura, emendava-me as palavras, eu de cabeça enfiada nos livrinhos fascistas da primária, na mesa da nossa sala que era também o quarto dos meus pais logo à entrada da casinha do Santo Velho, e a minha mãe a ensinar-me Português. Ela não sabia ler nem escrever, e eu achava aquilo extraordinário. Ainda hoje acho aquilo extraordinário. Um milagre.
Depois tive a sorte de me calhar o professor Correia (Toninho da Cafelândia, se não me engano), que me levou da segunda à quarta classe na Escola Conde Ferreira, tive os extraordinários mestres do seminário, o professor Alberto Alves, que me ensinava livros na Biblioteca Gulbenkian de Fafe, o velho professor Horácio, meu chefe e amigo na revisão do Janeiro. Todos me ensinaram a pedir licença e a tratar com carinho a língua portuguesa. Puxaram pelo melhor de mim, sem estragarem o que a minha mãe tinha feito. Aprendi.
Aprendi, por exemplo, a ter dúvidas quando escrevo. Quem não tem dúvidas, tende a escrever asneiras. E eu não sei escrever sem o dicionário, o livro, ao lado; não sei escrever sem a enciclopédia, os livros, ao lado. Molho o dedo, gesto antigo, vou lá ver se é com ésse ou com zê, se a palavra que escolhi quer dizer exactamente aquilo que eu quero dizer - e ainda assim asneio.
Foi num destes exercícios que descobri ontem a palavra esbraguilhado e gostei dela. E, à falta de melhor assunto, veio-me a memória. Ou então sou só eu a dar uso às palavras, que é para o que o Tarrenego! me serve.
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