segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Mais André Almeida, a pedido

Anda por aí uma rapaziada que pensa que não há vida para além da política e que faz da política um jogo de capelinhas, interesses inconfessados, intriguismo, umbiguismo e ciumeira. Esses pobres de espírito nunca conseguirão distinguir uma opinião honesta e independente nem que ela lhes seja cagada por uma gaivota, com toda a força, em cima da cabeça. Julgarão sempre que estão a sangrar.
A propósito do meu texto sobre o ex-deputado André Almeida (que, na verdade, era sobre outra coisa...), um leitor do Tarrenego!, que assina Luís Silva e que sinceramente não creio que pertença ao grupo de que falo no parágrafo anterior, pergunta, muito correctamente, aliás, se aquilo não era uma "encomenda". Era. Mas é claro que era. E como o caderno de encargos previa a elaboração de dois textos, cá está o segundo.
Como já expliquei ao senhor Luís Silva, não tenho o prazer de conhecer pessoalmente o André Almeida e só falei com ele uma vez, pelo telefone, não por acaso em Fevereiro de 2008. Sei tanto da vida do PSD, ou da vida de outro partido qualquer, como o senhor Luís Silva sabe da minha. Isto é: nada. Fui a Arouca uma vez e gostei. A famosa vitela é que me pareceu uma coisa como outra qualquer. A vitela de Fafe é incomparavelmente melhor. Mas decerto errei no dia, fui pelas Festas das Colheitas, em 2005. Posta assim ao léu a minha declaração de desinteresses, devo acrescentar que admiro as pessoas bem intencionadas, ingénuas ou não, vaidosas ou não. Para cínico, basto eu.
André Almeida só não vingou como deputado porque fez tudo mal. Chegou a Lisboa e avisou que queria trabalhar, disse até qualquer coisa do género "Acho que posso ser útil no Parlamento". Ora, os deputados não estão lá para trabalhar, muito menos para serem úteis. Os mais velhos decerto que ensinam isso aos mais novos, mas o jovem arouquense deve ter faltado às aulas. Depois foi a desgraça que se viu. André Almeida teve a lata de admitir que ganhava demais e levou nas orelhas, mas, mesmo desterrado para os bancos da cozinha, lá aparecia de vez em quando, provavelmente quando não estava mais ninguém no hemiciclo, a puxar por Arouca e pela sua região. Ainda por cima, tinha a mania de "prestar contas" aos eleitores com permanente informação no seu site oficial. A verdade é esta: deputados assim não interessam, dão má fama à Assembleia da República.
Afirma o senhor Luís Silva que "era habitual" André Almeida fazer encomendas de textos "sempre que ia caindo no esquecimento". Aqui fica o registo. E faz notar também que, no meu texto, "faltou dizer" que o ex-deputado "não apoiou Passos Coelho na luta contra Rangel". Não faço a mínima ideia se o André Almeida apoiou ou não apoiou o Passos Coelho e nem sei o que é que isso interessa para o caso. Mas isto sou eu, que estou por fora das intrigalhadas partidárias. E já agora: o Passos Coelho lutou mesmo contra o Rangel? Gostava de ter visto. Embora eu ache, se me permitem a sugestão, que um combate entre Rangel e Marques Mendes era mais equilibrado.

Informo a estimada clientela que tenho a produção toda tomada até ao final do ano. Novas encomendas só serão consideradas a partir do dia 2 de Janeiro de 2012.

Correio de Fafe

Acabo de ler no blogue Falaf - Revista Cultural de Fafe que o jornal Correio de Fafe fechou portas. O director do semanário, António Ferreira Leite, faz o seu papel e diz que é uma suspensão temporária, tendo em vista uma "reestruturação profunda". Pois. Eu sei como estas coisas são. Já vi este filme e sei como é que acaba: fim!  E tenho pena.

sábado, 29 de outubro de 2011

Matosinhos, sol e saralhotos

Matosinhos à tarde. Sol. O casal descia a rua, em direcção ao mar, puxado pela trela do pequeno cocker. Eis senão quando, porventura desarranjado pelo strogonoff de vitela e leite-creme do almoço, o aflito canídeo arriou as calças e cagou ali mesmo em pleno passeio, com evidente alívio pessoal e grande satisfação dos babados papás. Acabada a obra, a madama, higiene e civismo acima de tudo, foi à carteira e retirou um lenço de papel de um branco imaculado, abriu-o e voltou a dobrá-lo, agora apenas em dois, baixou-se e... limpou o cu ao cão. Depois amarrotou o papel e lançou-o para junto do saralhoto. E lá seguiram os três para o mar e para o sol, dois deles puxados pela trela.
A autarquia agradece. Faz colecção. No brasão de Lisboa figuram corvos, no de Matosinhos deviam desenhar saralhotos.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Intelectualismo bacoco

Conheci Orlando Pompeu, ali para os lados do Café Império, por altura dos meus 17 ou 18 anos, e nem me passava pela cabeça que ele viria a ser pintor. Pela dele também não. Não sei se pode ser, mas tenho ideia de que o meu primeiro contacto com a sua pintura foi também num café, o H7, e confesso que fiquei impressionado (ou será que devo dizer hiper-realizado?). A inteligenzzia local considera-o hoje em dia "o mais conceituado e famoso artista plástico fafense" ou, versão sintética, "o artista mais consagrado do concelho", consoante a fonte. Não sei se é. Para além de ter muitos cafés, Fafe é terra de outros exageros. Não duvido, porém, que Pompeu seja um dos principais embaixadores da cultura fafense, se tal existe, em Portugal e por esse mundo fora.
Lembro-me dos retratos do Orlando Pompeu. Aquilo é que era força. Não sei se foi por aí que ele começou, mas eu gostava muito, quer-se dizer: daquele gostar leigo, descomprometido. No mundo dos entendidos, todavia, desagradava a uns quantos a dose de realismo que esses trabalhos carregavam, mas eu quero é que os "entendidos" vão à merda. O artista, como bom artista que se preze, passou depois para a fase não sei quê, e eu perdi-me da pintura dele. Até anteontem.
Anteontem, o blogue Olhares, do Núcleo de Artes e Letras de Fafe, deu-me notícia da exposição do Orlando Pompeu em Albufeira. Inaugurou ontem e vai até ao próximo dia 25 de Novembro. A exposição chama-se Manifestos Conceptuais e eu desatei a rir. Suspeitei de imediato que Pompeu continua na famosa fase não sei quê e fui à procura dos títulos de anteriores mostras. Gastei meia dúzia de minutos e dei-me por satisfeito com esta colheita: Uni-Versos Conceptuais, Pré-Textos Conceptuais, Pré-Textos Gestuais, Con-Textos Conceptuais. Realmente, o artista faz render a fase não sei quê.
Estes títulos estão cheios de... nada. Não dizem nada. Não querem dizer nada. Que treta, Pompeu, que treta! Parecem títulos inventados de propósito para gozarem comigo, que não sei de pintura, que não sei de quase tudo, mas sei de títulos e gosto de me rir. Estes títulos são um desajeitado exercício de intelectualismo bacoco, são trocadilhismo no vácuo. Vejam bem: é como se eu titulasse os sarrabiscos deste texto como "Uni-Pré-Verso(Manifesto) Gestual/Conceptual-Semântico Metafísico/Invectivo, Astronómico ou Vice-Versa". Mas não liguem ao que eu digo. Vão lá, à exposição algarvia. É na Galeria Municipal de Albufeira, aberta de segunda a sábado, das 10h30 às 16h30. Vão lá! De certeza que a pintura exposta não tem culpa dos nomes que lhe chamam.

A Última Ceia, As Meninas, Doze Girassóis Numa Jarra, Guernica, Les Demoiselles d'Avignon, Mona Lisa, O Beijo, O Casal Arnolfini, O Grito, Rosa e Azul. Quem terão sido os palermas que pintaram quadros com nomes assim tão foleiros?

Praticamente a mesma coisa

Eu escrevo e peço à Leya que retome a publicação da Série Pepe Carvalho, de Manuel Vázquez Montalbán. A Leya informa-me que está aí o "novo livro de António Sala". Também está bem.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Bênçãos e benzeduras

Parece que alguns espíritos se espantaram e confundiram com a minha afirmação de que "acredito nas bênçãos". Vamos lá esclarecer o seguinte: eu disse que acredito em bênçãos, não disse que acredito em benzeduras. Como acredito na oração e não acredito em rezas. Gosto que me digam "O Senhor te abençoe", gosto que me digam "Vai com Deus", gosto que me digam "Até amanhã, se Deus quiser", é disto que gosto, tão simplesmente. Porque sim e porque sim e sobretudo porque sim. Dispenso os novos profetas e as mensagens em cadeia. Não os ouço, não as abro. Lixo! Dispenso intermediários sejam de que marca forem. A minha ligação com Deus é directa, de barbas para barbas.

E agora tomem todos muita atenção, porque eu só vou dizer isto uma vez: acredito em Deus. E rezo.

Aproveito geralmente a hora e pico da minha caminhada matinal para pormos a conversa em dia. E fui apanhado, há coisa de um mês, por outro caminhante madrugador, que me conhece de vista e atirou, no grandessíssimo gozo: - Ó colega, também a falar sozinho? Está tudo fodido...
Ele riu-se e eu ri-me. Mas, já que a chamada fora abaixo, achei por bem suspender também a marcha e explicar ao meu inesperado interruptor o seu próprio ponto de vista. Disse-lhe: "Está tudo fodido, realmente. Aí, tem o colega toda a razão. Já quanto à questão de eu estar a falar sozinho, isso depende. Se o colega não acredita em Deus, então voltou a acertar: estou, de facto, a falar sozinho. Mas se acredita, olhe que não, colega, olhe que não"...

Sem desculpa

Errar é próprio do homem. A mulher não tem desculpa!

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Quando os anjos caem de pé

Sejamos justos. O PSD não é só feito de malabaristas morais como o ministro Miguel Macedo e o secretário de Estado José Cesário. Tem também gente séria. É preciso cavar um bom bocado para a descobrir, é verdade, mas sempre há-de aparecer alguém. Estava a lembrar-me, por exemplo, de André Almeida. Não estão a ver quem é André Almeida? Aquele jovem deputado de Arouca que substituiu Luís Marques Mendes na Assembleia da República, entre 2007 e 2009. Não estão mesmo a ver, pois não? Pronto, o melhor é eu contar a história de André Almeida.
Cheio de ideias e boas intenções, André Almeida chegou ao Parlamento e ficou encantado com o que encontrou. O encantamento foi de tal ordem que, em Fevereiro de 2008, o promissor político arouquense surpreendeu tudo e todos ao declarar que os deputados da Nação ganhavam demais, anunciando, ainda por cima, que ia dar dez por cento do seu ordenado mensal a uma instituição de solidariedade social do seu círculo eleitoral, Aveiro. “As ajudas de custo chegam perfeitamente para o que um deputado faz, porque temos condições excelentes”, explicou André Almeida ao jornal 24horas.
Avisado pelo jornalista que o entrevistava para a perigosidade da matéria em que estava a mexer (matéria altamente inflamável e explosiva, e que ainda lhe poderia rebentar nas mãos), o jovem deputado limitou-se a encher o peito e a declarar-se "preparado para as críticas". Mas não estava. Dois dias depois, foi humilhado pelo seu próprio grupo parlamentar e obrigado a fazer um lamentável pedido de desculpas. Para a humilhação ser completa, o puxão de orelhas colectivo, que até foi privado, saiu imediatamente para os jornais.
Ficou a saber-se que o jovem André Almeida se defendeu dizendo que as suas declarações tinham sido "irreflectidas" e que pediu formalmente desculpas aos seus indignados colegas de bancada. Mas nem esta triste figura bastou ao inquisidor-mor Agostinho Branquinho, um dos falcões do velho PSD, que insistiu no enxovalho, argumentando que o pedido de desculpas não era suficiente para fazer desaparecer os danos entretanto causados. Nesse dia, André Almeida já não atendeu o telefone do 24horas.
Quanto aos "danos", foram sendo meticulosamente reparados. De oitavo na lista de candidatos do PSD por Aveiro às Legislativas de 2005, André Almeida desceu para décimo em 2009 e para décimo primeiro em 2011. Isto é: nunca mais sentou o cu na Assembleia. André virou-se então para a política local e foi líder da concelhia do PSD de Arouca até há pouco. No início do mês de Setembro anunciou que não se recandidatava ao lugar, "por razões profissionais, familiares e pessoais".

O André sabe que eu sei que as suas declarações ao 24horas, em Fevereiro de 2008, não foram "irreflectidas". Foram corajosas. E eu gostaria de pensar que, enquanto deputado, o ingénuo arouquense nunca se vergou ao sarro do PSD (que é igual ao sarro do PS), apesar da famosa sessão de pedido de desculpas em que os colegas de bancada fizeram dele gato-sapato. Gostaria de pensar que André Almeida nunca se deixou transformar no Calisto Elói que eles queriam e são.

P.S. - Mais sobre o mesmo assunto, aqui.

Perspicácia

Aquilo é que foi chover ontem. Será do tempo?

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Sabença, senhor abade!

No tempo em que havia padres em Portugal, Fafe tinha um senhor abade. Uma vez por semana, o nosso senhor abade descia a minha rua de terra e tílias para ir dizer missa na capela de ricos da Casa do Santo Velho, e a minha mãe mandava-me ir ter com ele para lhe pedir sabença. Eu interrompia os deveres da escola primária e ia a correr, todo contente. Fazia fila atrás dos outros miúdos todos e, quando chegava a minha vez, lá dizia, com o respeito que me fora ensinado, "Sabença, senhor abade!", beijando a mão branca que me era estendida. O senhor abade fazia-me uma pequena festa na cabeça, com a mão que tinha de vago, e respondia-me "Deus te abençoe, meu filho", que era o que eu queria ouvir. O senhor abade seguia o seu caminho e eu tornava a casa num sino. Acreditam que aquilo é das coisas mais felizes da minha infância?
O senhor abade cheirava bem, a tabaco e perfume. Andava sempre de batina e, no Inverno, usava uma capa negra revoante que parecia de filme de espadachins. Com o correr dos anos, o senhor abade subiu a senhor arcipreste, pendurou a sotaina e começou a sair à rua de fato preto e cabeção de gola alta, passou a cumprimentar-me de mãozada e fizeram-no senhor cónego, uma desfeita, no meu modesto ponto de vista. Cónego Leite de Araújo. Era um homem elegante, distinto, culto, bom e pobre. Dava. E tinha um sorriso. Era um ser humano com defeitos e extraordinário. E foi meu amigo. Não sei se Fafe tem a contabilidade em dia com a sua memória.
No tempo em que havia padres em Portugal, o senhor abade de Fafe tinha consigo ao serviço da paróquia, para além do padre Adélio que ensaiava o orfeão, dois jovens coadjutores, palavra que eu não sabia dizer mas que me fazia rir, porque imaginava que, com um título assim, aqueles dois eram padres de acender e apagar. Tanto quanto sei agora, apagaram-se quase todos os que por lá passaram. Apagaram-se como padres, quer-se dizer. Tiveram muitos filhos, foram muito felizes e casaram, geralmente por esta ordem. Em todo o caso, a esses já eu não beijava a mão, mas pedia sabença. Tínhamos isso combinado. E eu ganhava o "Deus te abençoe" que me dava tanto jeito.

No tempo em que havia padres em Portugal, não havia Paula Bobone, graças a Deus. Por isso o beija-mão era uma coisa, por assim dizer, pouco higiénica. Porque o beijo era mesmo beijo e não a mariquice do beijo de faz de conta, a "simulação de beijo" recomendada pela etiqueta da treta. Eu pedia sabença com beija-mão também ao meu avô e à minha avó da Bomba e ao meu avô e à minha avó de Basto, gente de trabalho que tinha as mãos como calhava quando eu lá esparramava o reverencial ósculo. Sim, seria talvez pouco higiénico, mas era verdadeiro. E ainda cá estou.
Durante toda a minha vida pedi sabença. Ao meu pai, à minha mãe, ao meu padrinho, à minha madrinha, aos meus tios e às minhas tias. Até às tias chegadas à família por casamento, que no princípio achavam aquilo um bocado estranho, mas que depois se habituaram e creio que gostam. Aos poucos fui desfazendo a corruptela, passei pela "sabênção" até chegar ao que peço há anos: "a sua bênção". É verdade, continuo a pedir a bênção à minha mãe e aos meus tios e tias, alguns apenas um pouco mais velhos do que eu. E não é só por respeito ou porque me ensinaram em pequenino. Eu acredito nas bênçãos. Por falar nisso: sabença, senhor abade!

É de homem 3

Homem que é homem gosta de mamas grandes. Mas os implantes estão caríssimos!

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Aníbal Passos Coelho

A ver se nos entendemos. Não há crise nenhuma entre Belém e São Bento por causa das medidas de austeridade. Nem há sequer "uma tempestade num copo de água" nas relações do Presidente da República com o primeiro-ministro, como ardilosamente sugere o professor Marcelo Rebelo de Sousa, que sabe disto mais do que o Papa. Não há nada, nem podia haver. Porque Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho são uma única e mesma pessoa em dois cargos diferentes: Aníbal Pedro António Manuel Cavaco Mamede Silva Passos Coelho, omnipresente e omnipotente, porém não omnisciente, nas chefias do Estado e do Governo. São uma espécie de Santíssima Trindade, mas em versão para dois, laica e republicana.
O falso diferendo entre ambos, que são um só, é um serviço combinado. É uma farsa para distrair o País. Ou uma fábula, com monstros e tudo. Embora denotando evidente falta de jeito, Passos Coelho e Cavaco Silva representam a cena do polícia mau e do polícia bom. Por caminhos tortuosamente diferentes - um oferecendo pancada, o outro oferecendo colo -, têm o mesmo objectivo: sacar tudo o que puderem aos suspeitos do costume. E os suspeitos do costume somos nós.

Parlamento ou manicómio?

Ricardo Rodrigues, o deputado socialista que roubou os gravadores aos jornalistas da revista Sábado que o entrevistavam, e que brevemente vai ser julgado por isso, foi nomeado pela Assembleia da República para o Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários (CEJ), que é a escola de formação dos nossos magistrados. Está tudo maluco, não está?

Os moinas

Gente séria estes Miguel Macedo e José Cesário! O ministro da Administração Interna e o secretário de Estado das Comunidades do Governo da austeridade-para-todos andavam a moinar um chorudo subsídio de alojamento por não terem casa em Lisboa, mas foi-se a ver e têm. Agora que se soube da habilidade e deu escândalo, um e outro mostram ao País do pé-descalço a honradez de que afinal são feitos: o primeiro "renuncia" à mama, o segundo "abdica" da teta. Vão passar para o leite em pó.
Miguel Macedo foi o primeiro a pôr a consciência a corar. "Vou formalizar a renúncia a este direito que a lei me dá", disse ontem o ministro, apertado pelas notícias, fazendo notar que toma a decisão "por vontade pessoal" e sublinhando que o famigerado subsídio "está há muito tempo previsto na lei". Mas, atenção, mesmo apanhado de calças na mão, o acrobático governante conseguiu aproveitar a indecorosa oportunidade para dar uma de superioridade moral: "Não quero estar a perder um minuto da minha atenção com uma polémica deste género". Só por isso é que ele "renuncia" à mama! De resto, não estava a fazer nada de mal.
Macedo recebia 1.400 euros mensais só de subsídio de alojamento, que é o máximo da tabela, portanto 400 euros a mais do que o ordenado dos portugueses ricos aos quais o Governo vai roubar os subsídios de férias e de Natal para salvar o País. O seu rendimento bruto como ministro é de 4.240 euros.
José Cesário não se ficou, e horas depois fazia saber que também ele "pretende abdicar do subsídio de alojamento que lhe é atribuído por lei". E, a Cesário o que é de Cesário, toma esta altruística atitude "para não introduzir qualquer tipo de ruído na gestão política da secretaria de Estado que tutela". Só por isso é que ele "abdica" da teta. De resto, não estava a fazer nada de mal.
Reparem no chico-espertismo destes tipos. O que eles nos dizem, basicamente, é: sim, nós estávamos a mamar, mas como manda a lei; e não somos os primeiros; temos lá culpa que a lei esteja por nós!
Mas têm. São estes tipos e outros tipos como eles que fazem as leis. Leis geralmente más para a enorme maioria dos portugueses e particularmente boas para a mais pequena minoria, a dos políticos no activo e a caminho da reforma (dourada). Eles próprios! E depois ainda têm a lata de abrirem a gabardina e exibirem-se-nos em pelote e todos pudicos. Desavergonhado país da imoralidade legal...

sábado, 22 de outubro de 2011

Para cus quadrados

Desculpem a minha ignorância, mas só agora é que descobri a sanita rectangular. E pergunto: será que os cus mudaram de feitio e o meu não foi informado?

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Antes que o mundo acabe

O mundo vai acabar dentro de exactamente 59 minutos. Pelas contas do pastor evangélico norte-americano Harold Camping, que se costuma enganar muito, mas desta vez é que é, o Apocalipse chega daqui a um bocado: às 20 horas de sexta-feira na terra dele, uma da manhã de sábado em Portugal continental. Foi o que ele disse aos seus discípulos. E eu só espero que ninguém se aleije. Mas não ficou claro, pelo menos para mim, se o fim do mundo é o fim da América, porque, para os americanos, a América é o mundo, ou se nos toca a todos, incluindo o principado de Sealand e essa pequena adjacência chamada China.

(Por falar em China, falemos também na Hungria. O que é que deu aos chineses e aos húngaros para julgarem que são mais infelizes do que os portugueses? Nem uns nem outros tiveram o Sócrates e o Teixeira dos Santos, não têm o Passos Coelho nem o Vítor Gaspar, não fazem ideia de quem é Cavaco Silva, queixam-se de quê? A que propósito é que chineses e húngaros ficaram à frente de Portugal num inquérito da OCDE, envolvendo 40 países, sobre os mais insatisfeitos com a vida?)

Antes que o mundo acabe, quero, porém, esclarecer o seguinte: bacalhau à espanhola não é caldeirada de bacalhau, tão-pouco ensopado de bacalhau. Bacalhau à espanhola é um prato que pede azeite e não água. É quase um guisado, de molho grosso e aveludado, e com o tempero apurado até aos limites legais de sal, pimenta, alho, louro e salsa. Por mim, também malagueta. Colorau, um nada só para dar cor. E, tomem nota, o pimento e o tomate são duas desnecessidades usadas apenas por quem pensa, mas não sabe, que só assim é que é "à espanhola". Erro crasso. O bacalhau à espanhola é à portuguesa!
O bacalhau até pode ser de quarto, daquele que, inteiro, não mede mais do que um palmo. E pode ser pouco. Não faz diferença nenhuma. O importante é o gosto que o bacalhau empresta, o equilíbrio do tempero geral, a consistência da molhanga. Quando eu era pequeno e os tempos eram de pobreza como os de agora, a minha mãe fazia um bacalhau à espanhola a que, honestamente, chamava batatas à espanhola. E vocês não fazem ideia do que perderam por nunca terem provado as batatas à espanhola da minha mãe...
E pronto, era isto. O mundo já pode acabar. Estou preparado, enfim de consciência tranquila. Andava com esta espinha atravessada na garganta desde o almoço da passada terça-feira, aí num sítio. E agora, se me dão licença, vou à cozinha salgar uns ossinhos da suã para o jantar de logo à noite.

Austeridade e justiça social

No fundo, estamos todos lixados. Lá em cima é que não.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Na cozinha em cuecas

O senhor da Optimus Fibra tocou-me ontem à porta, eram para aí 18h15. Não abri, mas disse-lhe pelo buraco da fechadura que não o podia atender. A verdade é esta: eu estava em cuecas e de avental a cozinhar umas moelas por acaso de coelho, as quais, não é para me gabar, até me saíram uma especialidade, e um homem em cuecas e de avental não é homem que se apresente ao senhor da Optimus Fibra, a não ser que o senhor da Optimus Fibra também se apresente em cuecas e de avental.
Irritam-me solenemente as visitas e os telefonemas de todos os vendedores de fibra da cobra, que são mais que as mães e andam todos ao mesmo, e a minha vontade é mandá-los à merda. Mas olho por mim abaixo, ponho-me no lugar deles e resolvo respeitar quem precisa. Lá abro a porta ou atendo a chamada e... é um erro. São abusadores estes tipos: se mostramos simpatia, começam logo a fazer perguntas atrás de perguntas a que acham que nós temos obrigação de responder, e eu, que afinal não estou para os aturar, respondo-lhes torto, fecho-lhes a porta na cara ou desligo o telefone. E depois arrependo-me da malcriadez, fico cheio de remorsos.
Portanto fiz muito bem em não ter aberto a porta, ontem, ao senhor da Optimus Fibra. Ainda por cima, estou de relações cortadas com a Optimus e as moelas de coelho, para ficarem em condições, devem ser cozinhadas sempre em cuecas.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Parabéns, Vinicius!

 Porque hoje é quarta, 19 de Outubro, copiei este texto de Vinicius de Moraes:

Se eu morrer antes de você, faça-me um favor. Chore o quanto quiser, mas não brigue com Deus por Ele haver me levado. Se não quiser chorar, não chore. Se não conseguir chorar, não se preocupe. Se tiver vontade de rir, ria. Se alguns amigos contarem algum facto a meu respeito, ouça e acrescente sua versão. Se me elogiarem de mais, corrija o exagero. Se me criticarem de mais, defenda-me. Se me quiserem fazer um santo, só porque morri, mostre que eu tinha um pouco de santo, mas estava longe de ser o santo que me pintam. Se me quiserem fazer um demónio, mostre que eu talvez tivesse um pouco de demónio, mas que a vida inteira eu tentei ser bom e amigo. Se falarem mais de mim do que de Jesus Cristo, chame a atenção deles. Se sentir saudade e quiser falar comigo, fale com Jesus e eu ouvirei. Espero estar com Ele o suficiente para continuar sendo útil a você, lá onde estiver. E se tiver vontade de escrever alguma coisa sobre mim, diga apenas uma frase: Foi meu amigo, acreditou em mim e me quis mais perto de Deus! Aí, então derrame uma lágrima. Eu não estarei presente para enxugá-la, mas não faz mal. Outros amigos farão isso no meu lugar. E, vendo-me bem substituído, irei cuidar de minha nova tarefa no céu. Mas, de vez em quando, dê uma espiadinha na direcção de Deus. Você não me verá, mas eu ficaria muito feliz vendo você olhar para Ele. E, quando chegar a sua vez de ir para o Pai, aí, sem nenhum véu a separar a gente, vamos viver, em Deus, a amizade que aqui nos preparou para Ele. Você acredita nessas coisas? Sim??? Então ore para que nós dois vivamos como quem sabe que vai morrer um dia, e que morramos como quem soube viver direito. Amizade só faz sentido se traz o céu para mais perto da gente, e se inaugura aqui mesmo o seu começo. Eu não vou estranhar o céu. Sabe porquê? Porque... ser seu amigo já é um pedaço dele!

(Marcus Vinicius da Cruz de Mello Moraes, que há quem diga que morreu no dia 9 de Julho de 1980, faz hoje 98 anos. Boémio, uisqueiro, fumador e mulherengo, casou nove vezes que se saiba por cá. Mas não acredito que tenha parado. Saravá, meu irmão!)

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Carisma

Uma vez era campanha eleitoral e saí do trabalho, em Santa Catarina, para apanhar o 37 nos Lóios. E quando cheguei aos Aliados, que é a meio caminho, esbarrei num enorme ajuntamento que rodeava e seguia um Carocha de tecto de abrir. Era muito povo, agitando bandeiras e gritando palavras de ordem tão desordenadas que eu não percebia o que as pessoas diziam. Aproximei-me, chamado pela curiosidade ou não sei por quê, furei pelo meio daquele fervor todo e consegui chegar ao carro. Quem é que lá estava de cabeça de fora e braço pré-presidencial em aceno à multidão? Mário Soares em pessoa. Era ele!
Eu fiquei a um metro do homem. E deixei-me ficar. O Volkswagen careca andava devagar. E eu deixei-me ir. Mas só percebi depois, muito depois. O cortejo desceu à Praça, subiu a Rua dos Clérigos, passou pelos Leões e pelo Hospital de Santo António, entrou na Rua D. Manuel II e quando dou fé Mário Soares está em frente ao Palácio de Cristal. O esquisito, o inexplicável, é que eu também lá estava. A um metro do homem. Eu fui atrás dele e não sabia.
Foi no ano de 1986 e é a história que eu costumo contar quando quero explicar o que é o carisma. Carisma é aquilo: aquele íman, aquele poder sobre as massas, mesmo sem abrir a boca, aquela força invisível que uns poucos têm de aglutinar e empolgar tudo e todos à sua volta, até a mim, que sou um cínico. Para se perceber melhor o meu ponto de vista, costumo recomendar também que se olhe para Cavaco Silva. Olhem bem! Estão a ver? Pois é: não tem, pois não?
João Paulo II é outro caso exemplar. Vamos esquecer os anos de atraso que o papa superstar deu à Igreja, a marcha-atrás que ele impôs à verdadeira linha inovadora saída do Concílio Vaticano II, e concentremo-nos apenas no poder impressionante que a figura de Wojtyla exercia sobre as multidões que o viam ao longe ou sobre aqueles que conseguiam aproximar-se dele. Um poder tão extraordinário que o vai transformar no primeiro turbossanto da milenar história do catolicismo. Um poder tão eucalíptico que eu acho que não habemus papam desde que o pontífice polaco morreu. A sério, eu ainda não reconheci Bento XVI, acho que ele não está lá, por mais que se esforce por estar. Falta-lhe qualquer coisa, que eu sei muito bem o que é. O carisma é assim: ou se tem ou não se tem.

Por isso é que eu digo que Vítor Pereira não tem futuro no FC Porto. E peço desculpa por esta descida tão brusca à terra, e ainda por cima ao futebol nacional, que descer mais era impossível. Vítor Pereira não tem o carisma de José Mourinho, o carisma de André Villas-Boas ou até o carisma de Jesualdo Ferreira. Lamentavelmente, também não tem o seu próprio carisma. E o carisma não se ensina nem se aprende. É um dom especial, inato, pessoal e intransmissível.
O actual técnico dos dragões é uma personalidade insegura, rígida, tensa, cinzenta, uma excelente pessoa. Falta-lhe a chama dos líderes, carece de umbigo. O treinador Vítor Pereira não é natural, não sorri, não ri, não cativa, não empolga, não leva ninguém com ele. Na hora da batalha final, vai olhar para trás, para as suas tropas, e estará sozinho.
Vítor Pereira poderá saber muito de futebol (já me disseram que sim), poderá ser um profissional sério e esforçado (acredito que é), poderá até ser campeão (Deus me ouça), mas é um mero entre parênteses no FC Porto.

Indignados 2

A indignação é a mãe de todas as revoluções. Era! Até aparecer a pílula do dia seguinte.

Portugal, o outro

Há portugueses que francamente. Há pessoas que parece que ainda não perceberam as ordens do senhor primeiro-ministro. Há empresários que parece que ainda não se capacitaram de que a crise só se ultrapassa à custa do povo, como manda a troika e o Governo muito mais. Porque, se o povo não pagar a crise, quem é que paga? O Estado? Não. O Estado é caloteiro. Os ricos? Não. Os ricos são ricos porque não pagam. É preciso, portanto, subir os impostos ao povo, é necessário e urgente aumentar os preços ao povo. Tudo isto é claro e justo, mas há por aí uns quantos que, sorrateiramente, insistem em minar o trabalho do nosso Passos Coelho. Isso deixa-me indignado. Estou indignado e já disse à minha mulher que estou indignado, porque nisto de indignações eu cá também não me fico!
Olhem o escândalo. Ontem, no campo do Castanheira, em Paredes de Coura, a equipa da casa recebia o Caminha. Quem me conhece, sabe muito bem que um Castanheira-Caminha me divide o coração. Custa-me muito. Custa-me tanto que nem pus os pés no jogo (ainda nem sei o resultado) e fui para o café em frente, que estava a rebentar pelas costuras, provavelmente cheio de fervorosos divididos como eu, cada um já na sua nona ou décima sexta mini.
Eu, foram duas Super Bock e um panaché, simpaticamente trazidos à mesa. E escusam de perguntar o que é que estava ali a fazer o panaché, porque eu não digo. Pedi a conta. E o senhor: "Um euro e noventa". E eu, que sou uma pessoa séria: "Não, amigo. É tudo! Quanto é as três coisas, as duas cervejas e o panaché?", corrigi-o, com toda a paciência do mundo e este meu jeito natural para corrigir tudo o que está à minha volta, mexa ou não mexa. "Exactamente. Um euro e noventa", insistiu o homem. Bem... Para não andarem cadeiras pelo ar, como na cantiga dos outros, paguei o euro e noventa cêntimos e saí dali sem sequer olhar para trás, jurando a pés juntos (e ia caindo) nunca mais lá voltar.
Estes tipos estão a roubar o País! O café, palavra de honra, chama-se Café Portugal. Com gente assim, com preços destes para o povo, como é que Portugal pode ir para a frente?

sábado, 15 de outubro de 2011

Doente da treta

Sou eu. Como doente, sou uma nódoa, um ignorante, uma vergonha para a classe dos doentes. Devia ser expulso.
Vejam bem isto: no outro dia fui à farmácia aviar uma receita com os medicamentos do costume, remédios de manutenção que tomo há anos, e pergunta-me o farmacêutico:
- O Xpghtywçtor, como é que é a embalagem?
- Desculpe lá, mas esse é para quê? - atrapalhei-me eu, sem saber de que é que o homem estava a falar. Na verdade, era a primeira vez que me faziam perguntas destas na farmácia.
O profissional sorriu, cheio de paciência e esferográficas no bolso da bata branca, disse-me para que era o medicamento e, na posse dessa preciosa informação, eu já lhe pude explicar que era uma caixa assim e coisa e tal.
- E o Gvmkzxqumnarc? É em frasco ou...- voltou o farmacêutico à carga, e eu outra vez à nora.
- E esse é para... - pedi novamente ajuda, corado de vergonha, no meio de um estabelecimento à cunha de especialistas.
O farmacêutico parou de sorrir. E desatou a rir. Mas lá me esclareceu, e eu lá lhe respondi que sim, era em frasco.
Percebem o que eu quero dizer? Como doente, sou de uma incompetência a toda a prova. Sou uma anedota. Como é que eu posso entrar naquelas interessantes conversas de sala de espera de consultório médico, conversas de doentes como deve ser, doentes encartados, e discutir e confrontar com os meus pares colesteróis, internamentos e bicos-de-papagaio, cardiologistas, bruxas e medicamentos, se nem sei o nome dos remédios que tomo? Não posso! Não estou capacitado.

Quem me dera ser cão

"Portugueses já gastam mais com cães do que com bebés", diz a capa do semanário Expresso. Está a acontecer no país certo.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

O meu tio Al Pacino

Eu tenho um tio que se parece com o Al Pacino quando o Al Pacino parece bem. O meu tio Zé de Basto não é actor e nunca foi a Hollywood. É um mestre pedreiro de mão cheia, arte que herdou do pai, o meu avô Bernardino, e tentou duas vezes a emigração, em Inglaterra e em França, mas não se deu. As saudades matavam-no. Saudades da mulher, a querida tia Margarida, do sino da igreja de Passos, das leiras suadas mas generosas, da comida feita à lareira, dos amigos do peito, de uns tiros às perdizes, de umas boas malgas de vinho verde e sobretudo dos filhos, duas "moças" e dois "moços" que lhe enchem o coração.
Eu e o meu tio Zé de Basto, que trato por você e a quem peço a bênção, fazemos pouca diferença de idade. Ainda fomos parceiros de aventuras durante os dias das férias grandes que eu, em miúdo, passava na aldeia. Ele era já um rapazola. E juntos éramos um desastre.
Foi o meu tio quem me ensinou a andar de mota de pau, o que correu muito bem e até nem lhe deu grande trabalho, porque, se não sabem ficam agora a saber, nas motas de pau não se anda, cai-se. E eu nasci para aquilo: era trambolhão de criar bicho!
O meu tio largava-me carreiro abaixo e ao fim de dois metros eu já tinha deixado a mota para trás, enrodilhado em séries de espectaculares e descontrolados vira-cus que só acabavam lá no fundo da ribanceira, com as costas espetadas numa árvore e a mota a cair-me em cima e em cheio, de rodas para o ar, a girarem, a girarem, como nos filmes...
Eu punha-me a pé no meio de uma nuvem de pó, zonzo, pronto a chorar, com a boca cheia de sangue e de terra, os joelhos a discutirem com os cotovelos quem é que estava mais esfolado, e o meu tio só se ria lá de cima. O que é que eu havia de fazer? Ria-me também. Vinham buscar a mota para o local de partida e lá ia eu outra vez de cangalhas até bater na árvore que já me conhecia de ginjeira, e quando íamos dois ainda era pior.

O Al Pacino não conhece o meu tio Zé de Basto. Calha bem, porque o meu tio Zé de Basto também não conhece o Al Pacino. Por aí, estão ela por ela. Onde o meu tio fica a ganhar ao americano é no alambique. Exactamente. O meu tio tinha um extraordinário alambique, onde queimava o vinho estragado da vizinhança, e fazia uma aguardente tão medonha que era um sucesso. As autoridades fecharam-lhe o alambique. Acho que mais do que uma vez! E sendo certo que, no seu tempo, Al Pacino também não destilava nada mal, a verdade é que não me consta que tivesse um alambique.
Ao contrário do outro Al Pacino, o meu tio Zé de Basto nunca ganhou um Óscar. Mas merece o Nobel. Foi ele quem inventou uma talhadura de infalibilidade papal para curar bebedeiras, sejam elas de que tamanho forem. O revolucionário método, experimentado e comprovado pelo meu próprio tio, consiste basicamente em arriar as calças e chapinar o traseiro na água fresca de uma levada. A versão urbana, descartado o uso do rio Douro ou do oceano Atlântico, por questões de segurança, passará inevitavelmente pelo bidé, devendo juntar-se gelo à água do cano, para recriar as condições naturais do tratamento original. E é remédio santo!

O meu tio Zé de Basto é um homem geralmente feliz, às vezes austero e honrado sempre. Teve sorte com os filhos que tem. Ele e eu também somos compadres, baptizei-lhe o rapaz mais velho: é "o nosso Nane" como eu. E é como compadres que gostamos de nos abraçar, "Eeehhh!, compaaaaaaaadre!!!...", com umas valentes palmadas no lombo, quando nos reencontramos. E eu gosto muito de abraçar o meu tio Al Pacino.

Há gajos com sorte!

E pensa Quitério, a esfregar as mãos de contente: "A minha sorte é estar desempregado. Eu é que os fodo! A mim não me roubam eles os subsídios de férias e Natal"...

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Moncosos

Esta merda já mete nojo! Estou farto destes gajos todos topo de gama, todos cheios de "perdão!" e "veja bem!", só Armani e botões de punho em ouro, doutores da mula ruça e notórios montadores das mulas dos outros, com três Jaguares na garagem, um de colecção, e que basta meterem os pés numas sapatilhas e enfiarem uns calções de atletismo para libertarem o grandessíssimo badalhoco que há dentro de si. E as cagonas é a mesma coisa. Qualquer dia, digo nomes!
Porque será que esta gente tão fina não leva um lenço ou uma folha de couve para as suas deslumbrantes sessões de footing ou jogging pela marginal de Matosinhos/Porto e vice-versa ou pelo Parque da Cidade? Porque é que esta gente tão jet-set parece que está sempre à espera da minha passagem, como ainda ontem, para assoar o nariz com os dedos e solo de trombone fanhoso, primeiro um buraco, depois o outro e finalmente em coro, acabando a abanar a mão como quem toca o bicho, para largar os moncos que se espetam como medalhas na camisola de marca? Porque é que esta gente tão cheia de nove-horas, não satisfeita com a javardice, ainda remata o serviço arrancando um enorme e sonoro escarro que só não me atingiu em cheio porque passou um cão que levou com ele no focinho?

E por falar em escarros. O primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, confirmou ontem à noite o que Marcelo Rebelo de Sousa já tinha anunciado ao País, com os malabarismos do costume, durante a tarde: o Governo vai roubar o subsídio de férias e o subsídio de Natal, nos dois próximos anos, aos funcionários públicos e pensionistas que ganham mais de 1.000 euros por mês. Deixo o resto para os analistas da treta, mas eu pergunto: será que o Passos Coelho (que não tem a mínima ideia do que faz e, tomem nota, está à beira de dar o tilt...), o Vitor Gaspar, ministro das Finanças, o Álvaro da Economia e restantes moinas da comandita acham que os mais de 1.000 euros mensais que a maioria dos portugueses recebe são iguais aos mais de 1.000 euros mensais que eles e as famílias todas deles ganham? Será? Moncosos!

A última palavra

- Senhor deputado, tem vosselência direito à última palavra.
- Muito obrigado, senhora presidente. Senhora presidente, senhoras e senhores deputados: zus!

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Foge, Isaltino, foge!

A questão é: Isaltino foge ou não foge? Eu acho que foge e tomara que fuja. Só se for parvo é que Isaltino não foge. E Isaltino é muitas coisas (que, apesar de provadas em tribunal, eu não vou dizer), mas parvo é que não é. Antes pelo contrário. Para mim, Isaltino é um pirata, o pirata Isaltino que abocanhou quanto pôde enquanto pôde e agora tem um tesouro escondido num país que ninguém sabe, como, por exemplo, a Suíça. E pirata que se preze não se entrega. Vai mas é gozar a massa.
Se Isaltino fosse para a cadeia, cadeia a sério, os outros piratas todos iam fazer pouco dele, sobretudo dois: o pirata Alberto João e o pirata Vale e Azevedo, cada qual na sua ilha de piratas privativa. Gargalhariam, no intervalo de mais uma caneca de rum, bebida por videoconferência: este gajo é mesmo parvo! Mas, repito, Isaltino não é parvo, é Morais.
Nos filmes americanos, mesmo antes do The End, gosto de ver os malandros diplomados, piratas de todos os feitios, já livres de perigo e refastelados ao sol, lambuzando-se com lagostas e gajas boas numa praia tropical mais conhecida do que os tremoços, mas que a justiça portuguesa, por não ter GPS, nunca sabe onde é que é. E penso: quem me dera ser pirata...
É o que eu estimo, do fundo do coração, ao nosso Isaltino, que não é menos do que os outros piratas só por ser um pirata português. Palavras para quê? Vai, Isaltino, vai, e não olhes para trás! Vai pela sombra e encontra a tua ilha ao sol. E deixa um milhãozito na conta deste teu sincero admirador, que não te faz diferença nenhuma e ficas aqui com um sobrinho para toda a vida.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Comi um Feast Chocolate

A selecção perdeu no reino da Dinamarca e eu comi um Feast Chocolate. Trinquei a língua mais uma vez ao jantar, e esta é uma desculpa como outra qualquer para um não praticante comer um gelado. Eu, sou sincero, prefiro o pequenino Magnum After Dinner - não dá tanto nas vistas, é menos doce, lembra-me o Clint Eastwood e, tal como o nome também indica, é recomendado para a merda que vou ter amanhã de manhã na boca: a afta propriamente dita -, mas já não havia no frigorífico.
Repararam: eu disse selecção nacional. Não disse Portugal. Portugal é outra coisa. Coisa séria. Portugal é o buraco da Madeira, é o buraco em que estamos todos metidos. Portugal é o desemprego e a troika, o Sócrates e o Passos Coelho, o Cavaco e a Angela Merkel. Portugal é Saramago e Lobo Antunes, Camilo e os camelos. Portugal é Gentil Martins e Corino de Andrade, José Castelo Branco e pouca vergonha. Portugal é nojo e desesperança. É Afonso Henriques, Nuno Álvares Pereira e Vasco da Gama. Portugal é Eça de Queirós. É orgulho e ilusão. Portugal é o que fomos. Portugal é o que somos. Portugal é o futuro sem futuro.
Portugal são os 129 militares portugueses que estão no Afeganistão. Aí é Portugal. Os onze rapazes muito bem pagos e em calções que ontem jogaram no reino da Dinamarca são a equipa da Federação Portuguesa de Futebol ou, deixem-me ser bonzinho, a selecção nacional. Não por terem perdido, quero lá saber!, mas porque é o que são. Não mais do que isso. E não são Portugal.
Acerca do jogo de ontem, digo-vos o seguinte: não fiquei cliente do Feast Chocolate. Continuo a preferir o Magnum. Faz-me ganhar o dia.

Quadrúpedes

Foto Hernâni Von Doellinger

O cavalo é um quadrúpede. Meio polvo também.

Ainda há boas notícias nos jornais

"DIAP pede 3 anos de prisão para Hulk" (Correio da Manhã)
Carrega Benfica!

"Prescrição evita condenação a 1489 arguidos em 2009"
(Público)
Atenção Benfica!

"Portagens nas SCUT: "Via verde para a asneira", diz ACP" (Expresso)
Cá em cima já pagamos há um ano. O ACP estará informado?

"5 jovens espancados por 5 polícias à paisana" (Jornal de Notícias)
Uso de violência mais proporcional era impossível.

"Tocador de flauta não vai ter de pagar à Câmara" (Gazeta das Caldas)
Bendito vazio legal.

"Ser Presidente da República? Eu digo claramente: não" (António Barreto, ao Expresso)
A sério? Mas engana muito bem!

"António Barreto: Portugal pode deixar de existir como país" (Expresso)
Porreiro! Este país já mete nojo.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

O último comunicador

A minha missinha das oito é ouvir o Prof. José Hermano Saraiva a contar histórias na RTP Memória. Já o sei de cor como ao padre-nosso, mas gosto de o ter ali, exactamente ali, a servir de música de fundo ao meu jantar. Aqui que ninguém nos ouve, o homem tem tanto de historiador como eu de monge tibetano, o que lhe dá ainda mais valor: porque não há quem invente História tão bem como ele, não há quem estraçalhe com tanto panache tudo o que os verdadeiros especialistas escreveram com rigor, substituindo-o num estalar de dedos pelos seus próprios supores, e não há quem depois diga tudo o que acha com tanta graça, com tanta clareza, com um português tão perfeito e tão acessível e com tanta convicção. José Hermano Saraiva é único. Ele é o comunicador.
O professor sabe compor os "factos" como ninguém, sabe pintar a "realidade", consegue fazer com que a sua História seja sempre melhor e mais bonita do que aquilo que de facto se passou. E é cativante a contar. Vende bem. Muitas vezes não é verdade o que ele diz, mas podia ter sido, e a sua versão é sempre muito mais interessante do que a verdade ela mesma. Quase que se poderia dizer que, inadvertidamente, José Hermano Saraiva foi o inventor do moderno jornalismo português.

Ministro da Educação de Salazar, José Hermano Saraiva esteve no centro do vulcão que foi a crise académica de 1969. Figura polémica, criticado nos meios intelectuais e políticos, o professor ganhou o coração de sucessivas gerações de portugueses através dos programas que faz para a RTP. Penso, porém, que o fantasma do seu passado fascista às vezes ainda o incomoda. Num episódio onde revisitava os retratos dos vários presidentes da República, no Palácio de Belém, o professor deixou cair um curioso comentário sobre Canto e Castro, creio, que era monárquico convicto e assumido, que foi mesmo deputado no tempo da monarquia (eu percebi "ministro"), mas que ocupou depois, ainda que por pouco tempo, o cargo de chefe de Estado no novo Portugal republicano. "Fez a transição com elegância...", concluiu José Hermano Saraiva, e foi óbvio para mim que ele estava era a falar de si próprio, aproveitando para meter a ficha, como quem não quer a coisa, em mais um pouco de Omo.

Comecei por dizer que gosto de ouvir o professor na RTP Memória. Ali, onde ele é ainda um jovem de 80 anos cheio de genica. Incomoda-me ver os seus novos episódios na RTP 2. Não consigo. Não lhe deviam fazer isto. Não o deviam deixar fazer isto.
José Hermano Saraiva tem 92 anos e continua na TV. É uma boa notícia em absoluto, apesar dos meus incómodos, que para o caso são irrelevantes. Hoje como ontem, novas gerações poderiam continuar a aprender com ele, se não História a sério, pelo menos a falar bom português e a respeitar e a amar o nosso património. Mas era preciso que se percebesse o que o homem diz naqueles monólogos inenarráveis.
Já não há Vitorino Nemésio, lembram-se? E acreditem no que eu digo: isto, sim, são comunicadores. O resto são habilidosos, meros entertainers. No dia em que José Hermano Saraiva, não o de agora, sair de vez dos ecrãs, acabou o que era bom. Destes já não há mais!

Opções

Não tenho nada contra os animais, mas gosto muito das pessoas.

domingo, 9 de outubro de 2011

O impotente

O Álvaro da Economia entrou no Governo cheio de tesão. Dizia que assim não podia ser, que ia fazer e acontecer, que tinha uma data de ideias "históricas" para o País, que para a semana é que explicava tudo, mas mais de cem dias depois (e largas semanas têm cem dias) ainda não fez nada, ainda não mostrou para que serve. Chegado à hora H, o homem não consegue.
Já aqui lhe chamei ministro da propaganda, um mãos-largas de soundbytes, com uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma. Ele é tão só conversa que até o presidente da Confederação da Indústria Portuguesa (CIP) teve que dar razão ao Tarrenego! e acusar Álvaro Santos Pereira de só fazer "jogadas bonitas". "O ministro da Economia, lamentavelmente, anda há meses, desde que tomou posse, a prometer-nos reformas para a semana seguinte - e já passaram muitas semanas seguintes sem que tenha concretizado nada do que tem prometido", afirmou António Saraiva, que até parece que me leu.
Mas o ministro, que se exaure em promessas de promessas, acha sempre que para a próxima vai correr melhor. E ainda no sábado, no Porto, anunciou que vai anunciar esta semana a reestruturação do capital de risco público, que será "a maior das últimas décadas".
Ó Álvaro, isto cá entre nós, de homem para homem: era tesão do mijo, não era?

sábado, 8 de outubro de 2011

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

É de homem 2

Homem que é homem não teme leão. O pior são os ratos.

Eu tenho obra

Dei finalmente uso ao terrenito de onze hectares que tinha comprado há coisa de três anos ali para os lados de Caminha, entre o mar e a serra. Comprado é uma forma de dizer, porque não o paguei. Não tenho dinheiro! Construí uma mansão apalaçada, com 16 quartos e sete salões, 19 casas de banho, todas com jacuzzi e paparazzi, três cozinhas, biblioteca transformada em garrafeira, ginásio, discoteca, bar de alterne, capela e kartódromo interiores, garagem para 53 automóveis, todos meus, 14 motos, todas minhas, um sidecar, meu, dois autocarros, meus, e uma retroescavadora, minha, três campos de ténis, dois campos de milho, quatro piscinas, um rio que mandei fazer de propósito e uma ligação privada à auto-estrada por túnel de 14 quilómetros em via dupla. A propriedadezinha, a que dei o nome de Quinta da Poncha, ficou-me por uma pipa de massa. A minha sorte é que mandei as contas dos arquitectos, engenheiros e empreiteiros para o tecto. Com um ordenado de mil euros por mês, eu não ganho para isto!
Chamo-lhe Quinta da Poncha para a distinguir da Primeira da Poncha, que construí em São João da Pesqueira, da Segunda da Poncha, que tenho na Manta Rota, da Terceira da Poncha, na zona do Estoril, e da Quarta da Poncha, em Ferreira do Alentejo. Todas mansões apalaçadas, envolvidas por estradas, viadutos e aquedutos navegáveis que eu mandei fazer, mas não gastei nem um cêntimo. Sou um teso! Se preciso de tudo isto?, perguntarão. Tenho uma família muito grande, e se disserem que sou só eu, a minha mulher e o nosso filho, eu nego! E se me acusarem de estar a esconder a Sexta da Poncha e a Sétima da Poncha, implantadas respectivamente na Madeira e na República Centro-Africana, eu digo que é calúnia.
Calúnia e inveja. Inveja e calúnia. Podem chamar-me manobrista financeiro, aldrabão, caloteiro, irresponsável, desgovernado, vigarista, criminoso. À vontade! A minha resposta é:
- Sim. E depois? Mas tenho obra!

É de homem

Homem que é homem não compra camisola de lã. Faz ele mesmo.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

E diz o inteligente que acabaram as ilusões

A esfinge de Belém decidiu ontem matar de vez os sonhos dos portugueses. "Acabaram os tempos de ilusões", decretou Cavaco Silva, ignorante como é seu timbre, sem sequer suspeitar o lado bom da palavra ilusão, o lado que nos mantém vivos e esperançados. Porque as palavras, ao contrário do Presidente da República, não têm apenas o lado mau.
Cavaco quer que os portugueses "redescubram o valor republicano da austeridade digna". Ele que vá explicar tão elevado conceito aos quase 700 mil desempregados, aos milhares de sem-abrigo que se multiplicam pelas ruas como cogumelos envenenados, às filas sem fim nas sopas dos pobres, às mães que se desfazem dos filhos recém-nascidos.
Cavaco quer que os portugueses - sem emprego, sem subsídio de desemprego, sem reforma, sem casa, tendencialmente sem direito à saúde, sem dinheiro, sem pão e finalmente sem ilusões - "cultivem estilos de vida baseados na poupança". Só se pouparem no ar que respiram e que ainda não paga imposto. Mas aqui Cavaco sabe do que fala: foram os seus amigos que inventaram o BPN, a maior burla da história de Portugal, e ainda lhe deram algum a ganhar.
"Perdemos muitos anos na letargia do consumo fácil e na ilusão do despesismo público e privado", diz Cavaco. A esfinge de Belém esfinge muito mal. Parece que não teve nada a ver com a merda que nos fizeram e nós deixámos fazer. Onde é que ele estava nesses anos todos, nesses tempos de regabofe? A tomar conta, sempre a tomar conta. No poder ou na sombra do poder, mas sempre a tomar conta. E agora finge que não é nada com ele. E nem tão-pouco esboça um pedido de desculpas aos portugueses.
Este país é uma tourada. Estamos entregues aos bichos. E diz o inteligente que acabaram as ilusões?

O 5 de Outubro deste ano só me deu desgostos. Que raio de língua é que estava a falar António Costa, presidente da Câmara de Lisboa, quando, no seu discurso, meteu a palavra perzeverança? Isto não é perzeguição, palavra de honra, mas em que gramática é que o edil lisboeta descobriu que um s a seguir a um r se lê z? Lá em casa tem perzianas? E será que vai perzistir no erro? É bem capaz, ele é um tipo muito perzistente.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Dá-me a tua camisola

Meio-dia. Hora do Angelus dominical na Praça de São Pedro, quase completamente cheia. É uma das melhores casas da época. No meio da multidão de freirinhas, jovens padres, padres reformados, falsos padres, carteiristas, japoneses de máquinas fotográficas, polícias, tarados sexuais no roço, a claque ultra do Santos Futebol Clube, vendedores de raspadinhas benzidas, católicos mais ou menos indiferenciados e sérios, uma excursão de Oliveira de Azeméis e hippies retardatários, há uma cartolina que se agita no ar, em direcção à janela papal. Está escrito: "Bento - 16 - Dá-me a tua camisola".

Viva o rei

de copas, dos copos, das fardas, das limas, do jet-set, das ferramentas, dos queijos, da sardinha assada, das assistências, das meias, do churrasco, das cópias, das bolas de berlim, da montanha, do kuduro, dos frangos, das bifanas, dos livros, do ioió, dos gnomos, dos leitões, do crime, dos sofás, dos filmes, do cachorro quente, do gado, da noite, dos candeeiros, do caracol, da sucata! E viva a república dos bananas!

terça-feira, 4 de outubro de 2011

A flauta das Caldas

As Caldas da Rainha estão em polvorosa com o escândalo do tocador de flauta e seu cão dorminhoco. A polícia já tomou conta do caso e a imprensa local também. A opinião pública divide-se, a Câmara Municipal prepara legislação de emergência e até a troika pode ser chamada a dizer como é que é. Eu só sei como é que foi:
Há três anos que o flautista que dorme num carro e o cão que passa a vida a dormir ganharam poiso na Rua das Montras das Caldas da Rainha. São já figuras típicas da cidade, segundo li. Mas há coisa de um mês, parece que devido à queixa de um comerciante, o homem foi abordado pela PSP, que, no final de todas as diligências tidas por convenientes, o mandou ir à Câmara tirar licença "para estar na via pública a tocar flauta, uma vez que o seu cão tinha as vacinas em dia e pedir dinheiro na rua não exige licença", como muito bem explica o Jornal das Caldas.
E o tocador de flauta lá foi. Só que a autarquia diz que a actividade de pifarista ao ar livre não está regulamentada (logo nas Caldas!) e que, consequentemente, não passa licença nenhuma. Ora cá está a aclamada e nunca desmentida problemática do vazio legal, que dá sempre muito jeito ter à mão.
“Não havendo enquadramento legal para esta situação, a Câmara entende não atribuir qualquer licença, todavia, é nosso entendimento que deverá existir um regulamento de animação de rua, à semelhança do que se passa noutras cidades, e estamos actualmente a estudar essa situação”, justificou o gabinete de imprensa autárquico, citado ainda pelo Jornal das Caldas.
Aqui, porém, como diria Chico Buarque, "a notícia carece de exactidão".
Com efeito, de acordo com a Gazeta das Caldas, outra fonte consultada pelo Tarrenego!, o flautista terá sido informado, na Câmara, de que "provavelmente terá de pagar dois euros por dias para actuar na rua (valor de um metro quadrado)". Será a taxa pela ocupação do espaço que é de todos, até do flautista? Talvez. Mas é mais do que isso, pelo menos tal como o percebeu o músico e o transmitiu ao jornal: "Eu posso tocar flauta, mas para poder receber dinheiro das pessoas tenho que ter a licença". Malabaristas, não? Seja como for, o artista até quer pagar a licença que não há, pelo menos para deixar de ser incomodado, mas entretanto não sabe para que lado se virar.
Ora bem, o que eu digo é: passem lá a licença ao homem, ou então não passem. Cobrem-lhe os dois euros por dia, ou então não cobrem. Mas resolvam-se, deixem-no viver em paz! Tivesse ele poderes parecidos aos do flautista de Hamelin, não para ratos mas para falos, e ainda me queria rir. De certeza que comerciantes, polícia e Câmara das Caldas lhe falariam mais fininho.

Cirúrgico

Mal terminou o curso de medicina, o experiente defesa esquerdo começou logo a fazer faltas cirúrgicas.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Apetecia-me bater-lhes

Deixei passar umas horas, para não dizerem que reagi a quente. Pensei bem no assunto, pesei os prós e os contras, medi os assim assins e os vice versas. Estou calmo e consciente das dramáticas consequências que este meu texto pode vir a provocar a nível nacional e internacional, mas há alturas na vida de um homem em que um homem tem que ser homem, venha quem vier, doa a quem doer e chova o que chover. As polémicas a mim não me assustam, antes pelo contrário. E eu vi. Eu estava lá e vi, com estes dois que hão-se ser cremados. Vi um jovem casal a comer bacalhau assado na brasa com batatas fritas. Batatas fritas, estão a perceber? Batatas fritas! Perante tão dantesco espectáculo, tenho ou não tenho direito à minha dose de indignação? Pois é claro que tenho, muito obrigado.
Fui aí a um sítio que faz o melhor bacalhau assado de Portugal e, portanto, do mundo. É servido com batata cozida (é claro), coberto com cebola e azeitonas e generosamente regado com um azeite e alho tão extraordinário que só apetece dar banho ao pão. Para cumprir todos os meus cânones, falta-lhe o ovo cozido, é certo, mas esta é uma falha que eu relevo com todo o gosto.
Na mesa ao lado, o jovem casal também estava no bacalhau. Acompanhado por cerveja, uma a dividir pelos dois, logo no berço do alvarinho e do trajadura. Eu ia perdendo o apetite! Mas o pior ainda estava para vir. E veio: uma travessa de batatas fritas, porque as cozidas não lhes serviam - ficaram todas - ou então nunca tal tinham visto.
Ainda pensei desculpá-los. "Está bem, são espanhóis (não consegui sequer considerá-los galegos, era doloroso de mais para mim), estes tipos não percebem nada disto". Mas não desculpei. E é preciso que se note que eu sou pela livre escolha. Para mim, cada um come do que gosta. Mas há comportamentos que, por escandalosos, devem ser guardados para o recato do lar. Eu próprio já comi bacalhau assado com feijoada à transmontana, mas foi em casa de amigos. Nunca por nunca o faria em público. Haja decoro! Para além do mais, gastronomicamente falando, a feijoada com o bacalhau na brasa é uma extravagância, enquanto que a batata frita não passa de uma indigência.
Apetecia-me bater-lhes. E ia bater-lhes, mas

reparei que um cliente, três ou quatro mesas à minha frente, estava a sentir-se indisposto, com a mulher já a pé, amparando-o e implorando auxílio com os olhos. Esqueci o resto. Vi ali a oportunidade por que esperei toda a minha vida. Pousei os talheres, cheio de classe, e preparava-me para levantar-me, ainda com mais classe, quando um atrevido se me antecipou pela direita e se dirigiu à senhora, de forma calma e discreta, dizendo exactamente o que eu ia dizer:
- Desculpe, eu sou médico. Então o que é que se passa? Posso ajudar?
Usurpador de merda! Apetecia-me bater-lhe. Aquela frase era minha. Minha! Aos anos que a ando a treinar. Eu diria aquilo muito melhor. A única vantagem do gajo é que era médico.

domingo, 2 de outubro de 2011

sábado, 1 de outubro de 2011

O buraco

Afinal são só 6.328 milhões de euros. E estava eu preocupado! Pode ainda ser mais, é verdade, mas, se for, não será muito mais, a não ser que seja. O vagaroso ministro das Finanças, Vítor Gaspar, anunciou ontem que a dívida da Madeira conta com mais 465 milhões de euros do que o Governo regional tinha admitido na sua última "confissão", vale, no seu total, 123 por cento do PIB da região e corresponde a 927 por cento das receitas fiscais e a 600 por cento da receita efectiva em 2010. Muito gostava eu de saber como é que alguém consegue gastar seis vezes o que recebe sem ir bater com os costados no xelindró. Dava-me jeito!
O Alberto João é que tem razão. Rima e é verdade. Andavam os "vigaristas" continentais - na oportuna expressão do presidente da república das bananas da Madeira - a dizer que aquilo era um buraco sem fundo, e afinal não é. São só 6.328 milhões de euros.
Umas horas antes (para que se perceba, em tempo de eleições regionais, que o cu não tem nada a ver com as calças), o secretário de Estado do Orçamento, Luís Morais Sarmento, já tinha avisado que o "desvio" verificado no défice do primeiro semestre deste ano vai obrigar o Governo da República a sufocar-nos com mais medidas de austeridade ainda antes do Natal.
Também está bem. O que interessa é que o buraco da Madeira é só de 6.328 milhões de euros. Esta noite vou dormir mais descansado. E vou pôr o despertador para me acordar às 7h30 do dia 1 de Outubro de 2021.

Manifesto

Depois de ter dado o corpo ao manifesto, Asdrúbal arrependeu-se e pediu-o de volta. Já foi tarde. Quem dá e volta a tirar ao inferno vai parar.