domingo, 31 de julho de 2022
O contador de pessoas
sexta-feira, 29 de julho de 2022
Não, não é o único
E isso revolta-me. Revolta-me tanto!
Tanto, que em 2018, mais ou menos por esta altura do ano, não consegui conter a minha indignação após nova ronda de declarações avulsas e falsas sobre o assunto, creio que por parte da Conferência Episcopal, e, em desespero de causa, cedi à ingenuidade momentânea de enviar um email a um bispo amigo a quem eu devotava o maior respeito e admiração. Era um apelo.
"Caro [...],
Perdoe-me o atrevimento. Em nome da nossa amizade antiga, infelizmente breve, porém limpa, quero fazer-lhe um pedido urgente:
Por favor, não deixe que os seus colegas bispos digam que não têm denúncias sobre casos de pedofilia. Têm. Têm. E o jogo semântico da afirmação hipócrita é de uma habilidade patética e criminosa. Os bispos não precisam de denúncias, os bispos sabem. Sabem. Sabem.
Caro [...],
Rogo-lhe: diga, faça alguma coisa. Em nome das vítimas e dos que, como eu, e eu sou o menos, ainda esperam uma igreja justa, misericordiosa, amparo dos pobres e fracos. Seja, por favor, a voz do Papa em português, já que os seus colegas bispos fazem questão de desperceber o que ele diz."
Convenientemente de férias, o bispo amigo teve, ainda assim, a amabilidade de responder-me.
"Do Algarve, apenas te diria que teria muito gosto em falar contigo. Não tenho problemas em abordar qualquer assunto. Aparece ou diz-me onde te poderei encontrar para conversarmos."
Estão a ver? Percebem o que eu quero dizer quando falo em hipocrisia? Eu não precisava de encontrar-me com o bispo nem gosto que me mandem calar. E conversarmos o quê? Eu não fui vítima de pedofilia ou de qualquer outro abuso sexual, felizmente não careço desse exorcismo. Eu, na minha boa intenção, só pedi ao bispo que fizesse ouvir a sua influente voz, que chamasse os seus colegas bispos ao bom caminho. Enfim, eu só implorei ao meu amigo bispo que ele revelasse o que eu sei que ele sabe. Mas quanto a isso, nem um pio...
P.S. - Mais sobre o assunto, na síntese de textos abaixo.
Os nossos bispos e os abusos sexuais
José Ornelas, bispo de Setúbal, é o novo presidente da Conferência Episcopal Portuguesa. E na sua primeira entrevista nacional vai logo directo ao assunto: a Igreja não pactuará com abusos sexuais. Os abusos sexuais de que a Hierarquia portuguesa nunca soube, não sabe, nunca viu, nunca ouviu, não tomou conhecimento nem desconfiou, mas está contra, pelo menos de quinze em quinze dias, o que não deixa de ser curioso e suspeito. Em Fevereiro do ano passado já o cardeal de Lisboa, Manuel Clemente, encurralado pelo discurso de Natal do Papa Francisco, admitira "reforçar" o que é feito pela Igreja Católica em Portugal para prevenir os abusos sexuais e apoiar as vítimas. Isto é: nada.
Por pensamentos, palavras, actos e omissões
Deus ensinou-nos - porque foi Deus que inventou a religião, católica apostólica romana evidentemente, e inventou a liturgia, a cor dos paramentos, as mitras e o báculos, o beijo no anel e as isenções fiscais, as côngruas e as catequistas, e inventou as orações e a culpa -, Deus ensinou-nos a confessar que pecámos "muitas vezes por pensamentos e palavras, actos e omissões". Deus, que não dá ponto sem nó, deixou as omissões para o fim para que não nos esquecêssemos. Como se nos avisasse: - Meu filho, deixa-te de tangas, omitir, sim, é pecado, é pecado, e já me tens à perna!...
Quanto à pedofilia e outros abusos sexuais no seio da Igreja portuguesa, os nossos bispos são sobretudo omissos, quer-se dizer, pecadores. Não fizeram, não viram, não ouviram, não conhecem, não sabem. São omissos com quantos dentes têm. O último a meter o pé na argola foi o arcebispo de Braga, Jorge Ortiga, numa recente entrevista ao Observador. O Dr. Jorge Ortiga, que em tempos segui e admirei pelo seu entusiasmo e contagiante militância em favor da actualização e abertura da Igreja pós-Concílio Vaticano II (dizia-se aggiornamento, lembram-se?), subiu a bispo, ainda por cima de Braga, e parece que caducou. Também ele não sabe nada sobre pedofilia e outros abusos sexuais no seio da Igreja. Embora eu saiba que muitas pessoas sabem que o arcebispo sabe muito mais do que diz não saber. Omisso? Homessa!
Cardeal-patriarca fala do que não sabe
Manuel Clemente, cardeal-patriarca de Lisboa, não sabe nada de casamento - o que até se compreende, porque é solteiro. Também não sabe nada de sexo - o que se pode aceitar, porque certamente nunca praticou. Ainda assim, ignorante em toda a linha, debita palpite sobre os dois assuntos, defendendo que os católicos recasados "em situação irregular" devem ser aconselhados a viverem sem relações sexuais.
Manuel Clemente, cardeal-patriarca de Lisboa, sabe muito bem da pedofilia na Igreja portuguesa. Falando do que sabe e do que realmente lhe diz respeito, gostaria de o ouvir propor que os padres devem ser aconselhados a deixarem as pilinhas dos meninos em paz.
Bispo pede campanha contra pedofilia na Igreja
O título deste texto é mentira, e o que se segue também. O bispo de Viana do Castelo, Anacleto Oliveira, apelou hoje ao Presidente da República para "liderar a mobilização de toda a nação" numa "causa nacional" contra a pedofilia na Igreja, por considerar que o que tem sido feito "não chega".
"Nada há de mais poderoso e eficaz [do] que um povo inteiro unido pela mesma causa, no comum modo de viver e pensar, numa mesma cultura", fez notar o prelado, defendendo que "chegou a hora" de o País "gritar bem alto: basta de pedofilia nos colégios católicos, nos seminários e nas sacristias".
A última parte desta última parte também é inventada. A versão verdadeira, que tem a ver com incêndios e é um bocado de rir, está no jornal Público, que copiou da agência Lusa.
Repiro: o título deste texto é mentira. E é pena.
Os gays, ou quando a Igreja não sabe ser mãe
Diz que vai por aí uma certa e determinada confusão a propósito de umas tais declarações da "psicóloga católica" Maria José Vilaça. A Psicologia Católica é uma especialidade clínica (suponho) que eu ignorava, mas não sou dos que negam à partida uma ciência que desconheço. Portanto...
Maria José Vilaça diz que disse à revista Família Cristã que ter um filho homossexual é como ter um filho toxicodependente. "Eu aceito o meu filho, amo-o se calhar até mais, porque sei que ele vive de uma forma que eu sei que não é natural e que o faz sofrer", diz que disse a senhora doutora. Quer-se dizer, ter um filho homossexual ou toxicodepente é o mesmo que ter um filho trolha que a mãezinha sempre soube que nasceu para ser presidente da república. Isto é, ter um filho homossexual, toxidependente ou trolha é praticamente como ter um filho propriamente dito...
Também não sabia dos homossexuais católicos, que certamente serão completamente diferentes dos homossexuais protestantes, dos homossexuais ortodoxos, dos homossexuais judeus, dos homossexuais budistas, dos homossexuais islâmicos, dos homossexuais agnósticos, dos homossexuais ateus, dos homossexuais bissextos e dos homossexuais apenas. Mas, palavra de honra, não quero saber o que é que objectivamente os diferencia...
Mas sei que, por exemplo, a Igreja Católica Apostólica Romana, que impõe o celibato aos seus funcionários de topo (de padres ao Papa) e lhes exige a castidade, desculpa-lhes o pinanço com mulheres, ainda que casadas, e varre para debaixo do tapete o abuso sobre rapazinhos, posto que inocentes. Os clérigos homossexuais que exigem os seus direitos também me fazem rir, porque não sei qual foi a parte que eles não perceberam quando, no acto da ordenação, perante família e testemunhas, se deitaram no chão aos pés do bispo e aceitaram e juraram desatarraxar a pila para todo o sempre, amém.
A ver se me explico: os padres católicos, enquanto a "Lei" for lamentavelmente assim, não podem reclamar direito a sexualidade de marca nenhuma - nem homo, nem hetero, nem bi, nem pan, nem tudo ao monte e fé em Deus, nem sequer à punheta, escusam de vir com paninhos quentes. Não há sexo para ninguém! Os padres não podem ser sexuais.
O lamentável, o triste, o nojo é que a Igreja instrumental, especialista circense em malabarismos hipócritas, cirrosada em pecado e vício até aos entrefolhos, continue a oprobrizar os seus filhos homossexuais que afinal nunca juraram a Deus castidade e que só querem ser felizes com quem escolheram e acreditando e vivendo em Jesus, tenham ou não cartão de católico em dia. Uma Igreja assim não é boa mãe...
Igreja reúne-se de emergência
"A Igreja vai reunir-se de emergência na segunda-feira, em Fátima", avisa o JN. Não sei se é verdade, mas, a ser, é preciso tomar nota: em Fátima evidentemente, e de emergência. E por que razão reúne a Igreja portuguesa, de emergência, em Fátima? Por causa da pedofilia interna? Não. Por causa da fome externa? Não. Por causa da pobreza geral? Não. Por causa do desemprego dos outros? Não. Por causa da crise de vocações sacerdotais? Não. Por causa da falta de povo e de fé nas igrejas e nas procissões? Não. Por causa do burquíni? Não. Por causa dos incêndios de Verão? Não. Por causa do terramoto em Itália? Não. Por causa dos atentados na Turquia? Não. Por causa da guerra na Síria? Não, não e não. "A Igreja vai reunir-se de emergência na segunda-feira, em Fátima, para decidir a resposta a enviar ao Estado, que recentemente notificou a maioria das 4376 paróquias a nível nacional para pagarem imposto municipal sobre imóveis dos seus edifícios e terrenos."
O homem que sabia uma coisa terminada em "ia"
José Policarpo sabia de uma coisa terminada em "ia". Pedofilia?, perguntaram-lhe logo. Não, de pedofilia não sei nada, respondeu. Compaixão?, insistiram. Vão-se lixar, isso não interessa para nada e nem sequer termina em "ia", protestou o príncipe da Igreja na reforma. Economia, sei é de economia, acabou por se abrir o emérito, parece que um tudo nada afrontado com a maneira leviana como sindicatos e oposição estão a governar Portugal. Ou então seriam gases.
E as provas? E os nomes?
A Conferência Episcopal Portuguesa garante ter dado "passos muito concretos na luta contra a pedofilia". Deu? Pois então que apresente provas, que diga nomes, como exige àqueles que denunciam os abusos praticados no interior da Igreja. Porque "não se deve dizer mais do que a verdade".
Os bispos e a pedofilia: mais um pequeno passo
Eurico Dias Nogueira, antigo arcebispo de Braga, é da minha opinião: a Igreja Católica portuguesa "esteve demasiado calada" sobre os casos de pedofilia que aconteceram no seu seio. Em entrevista à rádio Antena 1, o prelado confirma ter informações de casos de abusos sexuais de menores dentro da instituição, que critica por ter tentado "abafar" as situações, sem "resolver" o problema. "Fazia-se isso secretamente", diz.
E querem saber como é que a Hierarquia "abafava" os casos? Por exemplo, mudando os padres pedófilos de paróquia em paróquia e de escola em escola, assim multiplicando o número de vítimas.
Os nossos bispos, a pedofilia e a hipocrisia deles
José Policarpo, cardeal-patriarca de Lisboa, garantia em Dezembro do ano passado, meia dúzia de dias antes do Natal, que não conhecia casos de pedofilia na Igreja portuguesa. Mas também dizia que o melhor era não "deitar foguetes antes da festa, porque um caso pode sempre aparecer". Pois pode e é preciso ter cuidado. Não faltam por aí manetas, por eles, os foguetes, lhes terem rebentado nas mãos - avisei eu.
Ontem, José Policarpo anunciou que os bispos portugueses querem que as vítimas de abusos sexuais por parte de membros do clero participem os casos "às autoridades civis competentes".
Não sei se o cardeal arrepiou caminho apenas para salvar as mãozinhas ou se teve um rebate de consciência. Mas este desafio dos bispos, tal como foi lançado cá para fora, enrodilhado em alegadas questões legais (e não morais, valha-nos Deus), é uma indecência e de uma hipocrisia e crueldade para com as vítimas que envergonham o Jesus Cristo que as excelências reverendíssimas deviam pregar e viver.
Quem é esta gente que fala em nome da minha Igreja e já não sabe o que é o amor ao próximo e a caridade cristã? O que é que acontece a esta gente quando se veste de vermelho, para tão escandalosamente desdenhar dos mais fracos e indefesos, dos estropiados?
E, no entanto, José Policarpo e os seus bispos (não sei quem os empurrou) deram um passo em direcção à verdade: há pedófilos e vítimas de pedofilia na Igreja portuguesa. A Hierarquia anda muito devagar e por isso eu só lhe peço que tente, para já, mais um passo. Um pequeno passo até ao enorme tapete para baixo do qual tem varrido, pelo menos ao longo dos últimos quarenta anos, os diversos casos de abusos sexuais sobre menores que conhece e a que fecha os olhos. E que tenha a dignidade mínima de expor, expurgar e fazer castigar os violadores e não as vítimas.
O cardeal e os foguetes
O cardeal-patriarca de Lisboa garantiu ontem, em entrevista à rádio TSF e ao jornal Diário de Notícias, que não conhece casos de pedofilia na Igreja portuguesa. Mas, à cautela, acrescentou que "não podemos estar a deitar foguetes antes da festa, porque um caso pode sempre aparecer". Faz muito bem o senhor D. José Policarpo. Foguetes, não! Ainda lhe rebentam nas mãos.
P.S. - Textos publicados originalmente entre Dezembro de 2011 e 21 de Junho de 2020, do mais recente para o mais antigo.
Trunfo é paus
Quatro tigres-de-bengala. Jogam sueca e contam dos netos na fresquinha do jardim.
P.S. - Hoje é Dia Internacional do Tigre.
quinta-feira, 28 de julho de 2022
Consumir de preferência antes de
Chancas à porta
Chancas é calçado de pau, valha-me Deus! E no entanto chancas era bom. Porque abaixo de chancas eram socos, ainda mais miseráveis e lavradorescos, e abaixo de socos era descalço. Sim, descalço. Andava-se descalço no Portugal pré-25 de Abril, tal qual como agora nos querem. Andava-se descalço por necessidade e quem andasse descalço era multado pela polícia, ia para o posto e até podia acabar na Pide e na cadeia. Não é altamente suspeito que nos tenham deitado ao lixo a memória daqueles anos?
Mas, perdi-me, era apenas para dizer mais isto: as chancas, exactamente como as galochas, estão na moda. Suponho que os netos, as netas, os bisnetos e as bisnetas dos ricos da minha terra correm todos a comprar chancas. Anacrónicos por maldição, os pobres da minha terra calçam sapatinho dirópito - e choram. E eu só me dá para rir.
As galochas, da parolice à passarela
O nosso homem no terreno
Quando ela falava do seu homem no terreno, havia logo quem imaginasse histórias de espiões, acção, aventura e romance. Mas não. Ela falava do marido e da hortazita que o desgraçado fabricava nas traseiras da casa em horário pós-laboral.
O mito urbano e o mito rústico
- Faz favor de desculpar, o senhor é o tipo do mito urbano, não é?
- Mito quê?
- Mito urbano. Urbano. Citadino, civilizado, cortês, polido, gafonha, urbanita, urbícola, correcto, afável, aprazível, fruitivo, lisonjeiro, mavioso, amorável, charmoso, peralta, lhano, tirone, refinado, esticadinho, delicioso, educado...
- O que são as palavras, veja lá o senhor. Não, não sou o tipo do mito urbano. Na verdade fiz-me homem em Valnogueiras, Vila Real de cima, sou portanto e pelo contrário, se me está a acompanhar, o mito do tipo rústico.
- Tipo quê?
- Tipo rústico. Rústico. Rusticano, rural, aldeão, camponês, campino, campesino, campesinho, campestre, campónio, agrário, casca-grossa, labrego, parolo, lavrador, grosseiro, bruto, boçal, besta, bronco, grunho, labrego, malcriado...
- Realmente o que são as palavras. Mas é tão parecido com ele...
- Porém, não sou ele. Por favor, não me comprometa. Se o senhor disser que eu sou ele, eu nego. Ene-é-gê-ó. Nego!
- Palavra de honra, aqui que ninguém nos ouve, o senhor nunca foi o tipo do mito urbano nem por um bocadinho? Ande lá...
- Nunca, meu caro senhor. Aliás, se me permite, desafio qualquer um a recordar alguma intervenção ou escrito que eu tenha tido nesse sentido e que, de uma ou outra forma, me possa conectar a essa lamentável problemática. Desafio. Eu sou o mito, não sou o tipo, e ponto final.
P.S. - Hoje é Dia do Agricultor. No Brasil.
quarta-feira, 27 de julho de 2022
terça-feira, 26 de julho de 2022
Pai duas vezes
A bó, o bô e o bu
segunda-feira, 25 de julho de 2022
O taxista-leninista
Velhos hábitos
Afogamento
Deixou afogar o motor e isso marcou-o para toda a vida.
P.S. - Hoje é Dia Mundial da Prevenção do Afogamento.
domingo, 24 de julho de 2022
sábado, 23 de julho de 2022
Corte e costura
Era alfaiate. Mas não era de modas. Podia ser uma ave pernalta limícola da família dos recurvirrostrídeos, de bico comprido, fino e muito curvado para cima, patas azuladas e plumagem branca e preta, mas não. Era um insecto aquático, hemíptero, da família dos hidrometrídeos, de pernas longas, que se desloca sobre as águas. Exactamente. Alfaiate.
P.S. - Hoje é Dia do Alfaiate e da Modista.
sexta-feira, 22 de julho de 2022
Armado aos cucos
O topa-a-tudo
Quem sai aos seus
Dão-se alvíssaras
quinta-feira, 21 de julho de 2022
Aos papéis... e às migalhas
Duas das principais especialidades da casa são o "pollo na brasa" e a "costilla de cerdo". Para além dos mais emblemáticos pratos da cozinha tradicional portuguesa, do cozido e da picanha aos diversos bacalhaus e pescada cozida com todos, passando pelo cabrito, pelo leitão, pela vitela, pelo arroz de tamboril e pelo polvo, e com capacidade para 400 - sim, quatrocentas - pessoas, tem também "francezinhas, pizzas e hamburguers". É a promessa de todo um mundo, posto que regional e com ar condicionado. A quem se apresentar com o papelinho na mão, o imenso restaurante diz que regala "una botella de viño para levar p/ casa".
quarta-feira, 20 de julho de 2022
Brothers in arms
O grande Jeremias
terça-feira, 19 de julho de 2022
Virtudes teologais
Fé, esperança e caridade. A fé move montanhas. A esperança é a última a morrer. A caridade tem dias.
Eram pobres e tinham dono
Antigamente a caridade tinha dia certo, e era um descanso. Às sextas-feiras, vamos supor, os pobres manquelitavam de porta em porta pedindo "uma esmolinha por alma de quem lá tem". Os pobres da parte de fora da porta eram uns desgraçados muito rotos e muito sujos e eram assim para se distinguirem dos pobres da parte de dentro da porta, que já tinham em cima da "cristaleira" umas moedinhas negras separadas e preparadas para a função. Éramos todos pobres, dum e doutro lado da porta, uns mais, outros menos, e, à falta de quem governasse por nós, em Lisboa ou na Câmara, nada mais nos restava senão sermos uns para os outros. Às sextas-feiras, vamos supor. O resto da semana, não.
(A "cristaleira" tinha sido comprada em terceira mão e paga em honradas prestações.)
Naquele tempo os ricos tinham os seus próprios pobres, privativos, pessoais porém transmissíveis. Os pobres eram deixados em herança. Ter pobres por conta era, pelo menos em Fafe, inequívoco sinal exterior de riqueza. Os pobres eram exibidos, bastas vezes à porta da igreja, como gado preso à argola do tasco em dia de moscas e feira semanal. Para o senso comum, quantos mais pobres alguém tivesse mais rico era. Os pobres eram, portanto, uma necessidade da Nação para que os ricos prosperassem. Quantos mais pobres Portugal tivesse e quanto mais pobres fossem os pobres portugueses mais ricos seriam os nossos ricos e isso certamente era bom para o Produto Interno Bruto.
Isto é: a pobreza convinha-nos, aos pobres. A pobreza era o progresso da Nação. O regime ensinava-nos desde os bancos da escola que felicidade era sermos pobres mas honrados e termos as unhas das mãos sempre limpas. E isso deixava-me cheio de pena dos ricos, infelizes, principalmente dos ricos muito ricos que ainda por cima tinham as mãos sujas.
(Os ricos, pelo menos os de Fafe, não davam a roupa nem o calçado que já não lhes serviam. Vendiam a roupa e o calçado, a pronto, aos pobres da parte de dentro da porta. Os pobres da parte de dentro da porta, passados alguns meses de uso, davam aos pobres da parte de fora da porta a roupa e o calçado que tinham comprado a pronto aos ricos. Às sextas-feiras, vamos supor. O resto da semana, não.)
Graças a Deus, isto era só antigamente.
P.S. - Publicado originalmente no dia 5 de Setembro de 2021, sob o título "A caridade tem dias". Hoje é Dia da Caridade. No Brasil.
segunda-feira, 18 de julho de 2022
domingo, 17 de julho de 2022
O dr. Castro e o dr. Vinagre
sábado, 16 de julho de 2022
O pecado original
Corria tudo bem no Paraíso. Quer-se dizer: corria tudo na paz do Senhor. Poder-se-ia até afirmar, creio que sem forçar demasiado a nota, que o Paraíso era, naquele tempo, um autêntico paraíso. Estava escrito, porém, que Adão e Eva tinham de asnear. Podiam ter cometido um pecado qualquer, um pecadinho de nada, um pecado repetido, copiado, um que estivesse na moda. Mas não! - quiseram ser originais. E deu na merda que deu. Até hoje.
O terceiro homem
O terceiro homem foi Abel. Adão foi o primeiro, como o próprio nome indica; Caim, o segundo; e Abel, o terceiro. A seguir veio Sete, que, pela ordem natural das coisas, deveria ter sido Quatro, mas a Bíblia é como é e quanto a isso nada. Caim matou Abel, numa história negra muito bem contada pelo jornalista, espião e escritor inglês Graham Greene, que morreu há coisa de trinta anos. O livro deu filme de Carol Reed, que meteu Orson Welles e ganhou Cannes, BAFTA e um Óscar da Academia. Óscar evidentemente acúrsio.
Cobras e lagartos
Dizia cobras e lagartos. E dizia sanguessugas e borboletas e gaivotas e cangurus e macacos e sardinhas assadas com salada de pimentos vermelhos, nomeadamente. Enfim, dizia o que lhe apetecia...
Como as cobras
Era mau como as cobras. E como as moscas tsé-tsé e como os cães domésticos e como os escorpiões e como os crocodilos e como os hipopótamos e como os elefantes e como os tigres e como os leões. Era realmente do piorio.
P.S. - Hoje é Dia Mundial da Cobra.
sexta-feira, 15 de julho de 2022
Homem que é homem coça-os
quinta-feira, 14 de julho de 2022
Ai que desgraça tão grande!
Foto Hernâni Von Doellinger |
Quando eu era mocico e a ambulância acudia a um desastre com a sirene em altos berros, as pessoas de Fafe corriam para as escadas do hospital. Ali se plantavam, esperavam, prognosticavam, diagnosticavam, e finalmente assistiam ao espectáculo. Ao vivo. Em casos mais graves e raros, assistiam também ao morto. As escadas do hospital eram um palco de desgraças e caldeirão de emoções, cenário de reality show sem que Portugal sequer soubesse o que isso viria a ser. Eram também muito jeitosas para tirar fotografias de grupo a casamentos, bombeiros em festa e bandas de música, palavra de honra. Eram, portanto, o sítio mais in da vila e só estorvavam naquilo em que deveriam melhor servir, que era carregar macas com feridos e doentes por aqueles degraus acima ou por aqueles degraus abaixo, às vezes de cangalhas até ao chão.
Mas o espectáculo. A ambulância saía e o povo corria. O bom do Senhor Ferreira via-se à rasca para manter na ordem aquela gente toda e tola que fazia guerra por um lugar na primeira fila, sobretudo mulheres afogueadas e gordas, com os socos e o coração nas mãos ou enrodilhados no avental arregaçado. Faço notar que não foi por distracção que escrevi "a" ambulância. O artigo definido é aqui propositado e certo, porque naquele tempo, dará para acreditar?, os Bombeiros de Fafe tinham apenas uma ambulância, uma velha Skoda vermelha que regularmente ficava sem travões no meio das descidas. Pois, como dizia, as pessoas de Fafe corriam para as escadas do hospital e regalavam-se de braços decepados e orelhas arrancadas e narizes esborrachados e fémures a céu aberto e pés desfeitos e tripas de fora e miolos ao léu e espinhelas partidas e... - Foi tiro?, Foi facada?, Foi sachola?, Foi o home?, Foi a amante? Foi desastre?, Foi o vinho? Ai que desgraça tão grande! E muitos Uis! e muitos Ais! e muitos Coitadinhos! e muitos Valha-nos Deus! Esqueciam-se ali no relambório, a dar água sem caneco e a benzerem-se na direcção da Igreja Nova, convenientemente ao lado, mas sem perder pitada. Vampiros mirones, iam ao sangue, queriam sobretudo molhanga, muita, vermelha vermelha como a ambulância que chegava enfim, esbaforida e ganinte. Era um fartote! Uma comoção! E nas cozinhas abandonadas e sombrias, os tachos esturricando ao lume pachorrento, azul e resmungão da máquina a pitroil...
Agora as pessoas não precisam de ir a correr para as escadas do hospital. Sentam-se em casa, ligam a televisão e vêem a CMTV.
P.S. - Publicado originalmente no dia 10 de Fevereiro de 2016. Hoje é Dia Mundial dos Hospitais. Porque é dia de São Camilo, protector dos enfermos e padroeiro dos hospitais.
quarta-feira, 13 de julho de 2022
E tinha bailarinas
O rock e o amigo
Ali íamos, portanto. O Bertinho e eu. E, sim, era realmente liturgia, era festa. Glorificávamos a camaradagem desinteresseira e fiel. Éramos irmãos. Ali íamos afinal iguais, ambos de pés descalços, com as botas e as meias pela mão, trocando memórias e partilhando o riso. Passávamos em frente à Câmara e parámos - éramos, penso-o agora, uma procissão, os dois. Se naquele precioso instante soltassem revoadas de pombas brancas por sobre as nossas cabeças, creio que não nos espantaríamos...
Chamava-me "meu rico menino", e eu gostava. Eu gostava, meu rico menino!
terça-feira, 12 de julho de 2022
A praia, crime e castigo
A praia, é preciso que se note, não é obrigatória. Podem ser férias e não ir à praia. Pode ser Verão e não ir à praia. Pode ser sol e não ir à praia. Pode ser calor e não ir à praia. Pelo contrário: se for sol, se for calor, muito calor, o mais sensato será até ficar em casa ou procurar uma fresquinha no quintal mais próximo. Acreditem-se no que eu digo, há quarenta anos que moro à beira-praia e sei muito bem do que falo. E palavra de honra: não ir à praia não parece mal, não é crime e tampouco falta de educação...
segunda-feira, 11 de julho de 2022
A minha avó tinha negócios com São Bentinho
Aí pelos meus vintes, eu tinha uma plantação de cravos no meu braço direito, uma vez a minha avó viu, pediu-me licença e disse que ia falar com São Bentinho sobre o assunto. Quando queria falar com São Bentinho, a minha querida avó Emília ia pessoalmente, a pé, pequerricha e já velhinha, desde Passos, Cabeceiras de Basto, até Rio Caldo, em Terras de Bouro, onde o santo morava. Os cravos desapareceram.
Anos depois, o meu filho era criança e apareceu-lhe um cravo numa pálpebra, uma vez a minha avó viu, pediu-me licença e disse que ia falar com São Bentinho sobre o assunto. Quando queria falar com São Bentinho, a minha doce avó Emília ia pessoalmente, a pé, ainda mais pequerricha e ainda mais velhinha, desde Passos, Cabeceiras de Basto, até Rio Caldo, em Terras de Bouro, onde o santo morava. O cravo desapareceu.
Se eu puxasse pela cabeça, tenho a certeza de que me lembraria de um terceiro e definitivo milagre da minha avó em promessa com São Bentinho, mas não quero arranjar problemas ao Vaticano.
O Vaticano tem muito mais que fazer do que ocupar-se com a comezinha história da Bó de Basto, que, cada vez mais velhinha e e cada vez mais pequerricha, continuava a ir a pé entender-se pessoalmente com São Bentinho sempre que era preciso - até morrer. O Vaticano tem coisas muito mais importantes a tratar: por exemplo, convencer-nos de que João Paulo II é santo. Vai levar muitos anos, e eu mesmo assim nunca vou acreditar.
P.S. - Publicado originalmente no dia 3 de Maio de 2014. Hoje é dia de São Bento.
domingo, 10 de julho de 2022
O melhor dia do anho
A vitelinha guiava-se em casa, com vagar e carinho, com as voltinhas todas, se possível em forno ou fogão de lenha, e as tripas, regra geral, iam-se buscar num tachinho à Esquiça ou à Pacata, consoante a ideia que cada um tinha acerca da sua própria posição social - o que agora até dá para rir, vendo-se assim a coisa à distância...
Naquele domingo não havia vitela. E as tripas já tinham saído da mesa...
Moral da história: contar com a vitela no cu da galinha, por assim dizer, e com licença de vossências, pode ser realmente uma merda.
O textinho acima publiquei-o originalmente no dia 16 de Setembro de 2018. Hoje, 10 de Julho de 2022, o dilema gastronómico creio que nem se coloca em Fafe. É domingo da Senhora de Antime, com a procissão de volta após dois anos de fastio imposto pela pandemia. A procissão e o encontro das duas senhoras, das Dores e da Misericórdia. A procissão da Senhora de Antime, costumo ensinar a quem não sabe, é provavelmente a melhor procissão do mundo. É o povo que desce inteiro com as senhoras até à vila a que agora chamam cidade. É uma procissão tremenda e comovente, multitudinária e única, uma procissão a sério - A Procissão -, como tenho a mania de explicar aqui aos meus vizinhos que ficam banzados com a meia dúzia de almas penadas e a dúzia e meia de cabeçudos da Câmara que todos os anos acompanham a imagem do Senhor de Matosinhos pelas ruas desta cidade, num deserto que só visto.
sábado, 9 de julho de 2022
Desarmado em parvo
Missais terra-ar
Portugal acaba de enviar missais para a Ucrânia. Pequenos missais de rito bracarense praticamente novos. As ordens eram para mandar mísseis, mas alguém da intendência fez confusão ao aviar a encomenda.
Tanques para a Ucrânia
Contra os canhões
Às armas! Às armas!
Entre mortos e feridos, safam-se os de lá de cima. Como sempre.
sexta-feira, 8 de julho de 2022
Ao menino e ao bolacho
Entre outras alcavalas, o Landinho até fazia anos, coisa extraordinária, enquanto a nós só nos era permitido ficarmos mais velhos, somarmos dias, que remédio e a seco. Ao menino, a nossa mãe organizava-lhe uma festinha de aniversário, havia convidadozinhos, e do pequeno lanche constavam, só me lembro disso, umas curiosas sandes de bolacha maria com marmelada dentro, tipo oreos mas melhores e de fabrico caseiro. Eu, já espigadote, metia a mão sorrateira e rápida à passagem pela mesa, e foi assim que ficámos a conhecer-nos pessoalmente, eu e elas. As bolachas. Que estavam contadas, para mal dos meus pecados...
Mas não era de bolachas que eu queria aqui falar. É de bolachos. E o bolacho, faço deste já notar, é pitéu absolutamente indispensável, muito mais do que mero ornamento, nuns rojões à moda do Minho que se pretendam com todos os matadores. O bolacho é, versão curta e grossa, uma espécie de pão cilíndrico feito com farinhas de trigo, milho e centeio, a que se junta sangue de porco, fermento, caldo de carne, pimenta e cominhos. Depois de levedada, a massa é cozida em água temperada com sal, salsa, folha de laranjeira e louro. Cumprida a cozedura, o bolacho é cortado em rodelas e frito em pingue. O bolacho pode também chamar-se farinhato, pilouco, bica e, principalmente, beloura.
Eu trigo-me, tu trigas-te, ele triga-se
De tudo, como na padaria
As padarias hoje em dia são tudo: café, salão de chá, pastelaria, cervejaria, restaurante, casa de pasto, tasco, pensão, centro de convívio, sociedade recreativa, quiosque, tabacaria, meeting point, posto de turismo, guiché de informações variadas. E vendem de tudo, até pão, o que é curioso. São os tempos que correm: o meu talho também vende ovos, azeite, queijo, vinho, peixe congelado, feijão, ananás e pêssego enlatados. E a minha farmácia tem sempre a hortaliça mais fresca aqui da zona.
Sendo tudo, a minha padaria tem televisão e, portanto, milhões de opiniões. A campeona do palpite é a cliente residente, cuja, para mal dos meus pecados, padece de uma voz agreste e guinchada uma oitava acima como se fosse o Bruno de Carvalho mas ao contrário. Nunca a apanhei calada...
"Não. O meu filho não gosta de andar!...", anunciava um destes dias a senhora que mora na minha padaria. "Podes ter gosto", dizia eu cá para mim. "Um marmanjo com mais de trinta anos e que não gosta de andar. Está bem, Alfreda! Até eu ando, até eu me rendi à caminhada, e que bem que me faz...", continuei com os meus botões.
Mas ela insistia, parecia tola a mulher, cheia de orgulho no calaceiro: - O meu filho não gosta de andar. Não. Não gosta de andar...
"Ai que caralho!", ia eu pensar, quando a senhora que mora na minha padaria: - Não gosta de andar. Uma casa, nem que fosse pequenina, mas com tudo, ele preferia. Uma casinha. Andar, não!
Uma mulher de barba rija
Esta padeira realmente nunca existiu. Ainda assim, a lenda liga-a à Batalha de Aljubarrota e ao massacre que se lhe teria seguido, mas que também nunca aconteceu. Brites seria a líder de um grupo de populares, tipo claque de futebol, que perseguiu os castelhanos em fuga. Brites emboscou-se, fez-lhes espera, aos desgraçados dos espanhóis, e matou com as próprias mãos uns tantos, se por acaso fosse verdade e o Benfica tivesse claques.
Nessa noite de 14 de Agosto de 1385, a padeira chegou a casa tarde e a más horas como de costume e descobriu sete espanhóis escondidos no forno onde costumava cozer o pão. Ela percebeu logo que eles eram espanhóis porque diziam muito "qué rico!", "vale, vale!", "qué tal, qué tal?" e outros nomeadamentes. Sem pestanejar, ou ainda que pestanejando derivado à farinha, Brites pegou na pá e bateu-lhes até os matar, um a um, à medida que os infelizes iam saindo do forno. Foi muito bem feito e desde esse dia glorioso e imaginário nunca mais ninguém viu a padeira.
Se um elefante
- Reacção quê?
- Pélvica. Tipo à flor da pele, tás a ver? Pélvica.
- Queres dizer epidérmica?
- Não, essa cena é dos elefantes. Pélvica. Diz-se pélvica. Dããããã!...
O intolerante
quinta-feira, 7 de julho de 2022
Ele e os cigarros
Ele não fumava os cigarros. Ele comi-os, três a quatro maços por dia, um desastre para a saúde! Eram de chocolate e vinham embrulhados em pratinhas de cores variadas e apetitosas.
P.S. - Hoje é Dia Mundial do Chocolate.
L'été indien
quarta-feira, 6 de julho de 2022
O auto-suficiente
terça-feira, 5 de julho de 2022
A idade não tem idade
Quantos anos terá uma mulher que diz que tem cinquenta?
P.S. - Hoje é Dia de Angus Mac Og, deus da juventude e da beleza na mitologia céltica.