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terça-feira, 3 de junho de 2025

Mulheres nuas no Vaticano

As notícias
Mas que grande desgraça! Que tragédia! O dia mais negro daquela terra! O ambiente só aliviou um bocadinho quando os jornalistas encontraram o cadáver do sobrevivente...

Madeleine McCann desapareceu. E o desaparecimento da "pequena Maddie" foi o melhor que aconteceu ao meu jornal naquele ano de 2007. As notícias saíam que nem pãezinhos quentes, para delícia de um público ávido de drama, coscuvilhice e sangue cor-de-rosa. E se não havia notícias, "inventavam-se" notícias. O monstro precisava de ser alimentado e as vendas iam de vento em popa.
Uma vez o chefe mandou-me ligar ao Presidente da República, a todos os antigos presidentes da República vivos, ao primeiro-ministro, a todos os ex-primeiros-ministros vivos, ao presidente da Federação Portuguesa de Futebol, ao seleccionador nacional, que era o Scolari, aos presidentes e treinadores de FC Porto, Benfica e Sporting, ao Freitas do Amaral (já não me lembro como é que este apareceu na lista, mas ele aparecia sempre), ao cardeal-patriarca de Lisboa e... ao Papa. "Ao Papa?", perguntei eu, só para ter a certeza. "Sim, pá! Liga ao Papa! Queremos um depoimento do Papa sobre o desaparecimento da Maddie". Foi assim, palavra de honra, que o chefe me respondeu.
Portanto tinha de ligar ao Papa, que era Bento XVI. O resto era fácil, era como se já estivesse feito. Pelo prestígio, pelo rigor e seriedade, pela sua inatacável ética editorial, pelo respeito e admiração que impunha na sociedade portuguesa, o jornal onde eu trabalhava, e que só fazia merda, tinha praticamente linha directa com aquela gente toda. Agora, falar com Sua Santidade, isso, sim, seria um desafio, e ainda por cima eu estava muito mal visto no Vaticano, pelo menos desde 1987, quando lá fui com Cavaco Silva, no seu tempo de primeiro-ministro. É claro que eu podia enfiar-me no bar o dia inteiro a "tentar ligar ao Papa" e à hora do fecho da edição avisava o chefe, em Lisboa, de que "Não consegui, pá, desculpa, o gajo armou-se em difícil, não fala, eu ainda disse que ia da tua parte, mas nem assim o tipo se descoseu, sabes como são os alemães, teimosos do caralho". Porém, apesar da fama que faço render, eu não frequentava o bar.
Pensei então: o que é que há de mais parecido com o Papa e a que eu possa realmente chegar? E lembrei-me: o cardeal português D. José Saraiva Martins, que também estava em Roma como o outro, o Ratzinger, e creio que ainda era prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. Meti as mãos ao caminho, fiz chamada atrás de chamada e ao fim da tarde consegui enfim falar com ele. Atendeu-me cheio de bondade e essessss nassss palavrassss. Conhecia o caso, sim, e deu-me a sua opinião numa conversa de quase um quarto de hora. Falou-me da menina desaparecida, disse-me que rezava por ela, mas lembrou, com lucidez e sabedoria, que é fundamental que os pais não se ponham a jeito (a expressão é minha) para que semelhantes tragédias aconteçam. Vocês também percebem, tal como eu percebi, para quem é que o nosso cardeal enviava este recado. Sim, para os estranhíssimos paizinhos da "pequena Maddie". E estranhíssimos também sou eu que digo.
No fim, D. José Saraiva Martins fez-me um pedido: "Olhe, depois mande-me o jornal, se faz favor". E eu mandei. O meu jornal era o 24horas. Exactamente. O jornal com fotografias de raparigas todas boas e as mamas ao léu. Deve ter sido um sucesso no Vaticano.

O jornal 24horas nasceu em 1998, com dinheiro suíço, muito, e morreu oficialmente em 2010, um ano depois de os seus alegados responsáveis terem liquidado a redacção do Porto, a sangue frio e pelas costas. Podem limpar as mãos à parede. Mas tinha piada o pasquim, que até chegou a ser bem feito e é a bíblia do jornalismo que hoje se faz em Portugal. No meu tempo, em 2004, o 24horas atingiu uma circulação de 60 mil exemplares por dia.
Há vinte anos, quando por lá suava as estopinhas esgravatando lixo, e os jornalistas de referência, gravata e fato às riscas faziam pouco de nós, eu dizia-lhes que se rissem baixinho, porque um dia todos os jornais portugueses seriam como o 24horas. E são. Todos. E as televisões também. Embora feitos e feitas evidentemente por jornalistas de referência, gravata e fato às riscas que trabalham pouco e agora já não têm vergonha nenhuma, nem do prejuízo que dão. O bom jornal 24horas de Alexandre Pais, que uma certa e determinada rapaziada depois estragou e descarregou sanita abaixo, está hoje em dia muito bem representado na imprensa nacional. "Je suis 24horas", dizem eles todos os dias, sem saberem que dizem, porque eles também não sabem o que fazem. Mas o 24horas, o genuíno, faz falta, e então nesta época tão asinina seria um mimo. Não fazem ideia do que eu me rio ao ler os momentosos assuntos que saem agora nos jornais e a pensar no que nós teríamos feito com eles. Seria um sucesso, diariamente a malhar e a chusma e pedir bis, coisa para anos. A desgraça que nos caiu em cima foi ter-se-nos acabado o folhetim da "pequena Maddie", que era o nosso abono de família.
A mirabolante CMTV e respectivo jornal andam agora a desenterrar o assunto e devem estar a facturar que se fartam. Recensões disparatadas, notícias a martelo, falsas maddies ou novas buscas, velhos novos suspeitos ou nem por isso, vale tudo, é sempre a bombar, e depois ainda há a "grávida da Murtosa". Porque o público merece...

P.S. - Versão optimizada, publicada no meu blogue Mistérios de Fafe, no passado dia 12 de Janeiro. Notícia de hoje: 18 anos depois do desaparecimento de Madeleine McCann, a PJ volta a fazer buscas no Algarve, a pedido da polícia alemã.

domingo, 31 de março de 2024

Jesus Cristo, procura-se!

A polícia anda à procura de Jesus. O Ministério Público pretende acusá-l'O dos crimes de promoção de ajuntamento em Mt 15, 29-39, incentivo à violência em Jo 8, 7 e subtracção e ocultação de cadáver em Lc 24, 1-3. A CMTV está em cima.

Jesus, Jesus, o que sente neste momento?

Se fosse hoje, a CMTV transmitiria em directo a paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo. Reportagem de Tânia Laranjo, no local, ou pelo menos o nome de Tânia Laranjo no local, e comentários e molduras penais a cargo do ex-ministro Rui Pereira, em estúdio. Ou em casa, por teletrabalho, com uma inapelável biblioteca atrás das costas.

domingo, 30 de julho de 2023

O Papa está bem acompanhado

A apresentadora Teresa Guilherme e a astróloga Maya "reforçam mega operação da CMTV para acompanhar visita do Papa Francisco a Portugal", anuncia o Correio da Manhã. Estou mais descansado. O Papa fica realmente em boas mãos.

segunda-feira, 26 de junho de 2023

O nome é que nos destina

Lúcia de Jesus Rosa dos Santos nasceu no dia 28 de Março de 1907 e morreu no dia 13 de Fevereiro de 2005, portanto aos 97 anos. Isto é, foi por um triz que não fez 100, e então é que havia de ser bonito. Nascida com um nome assim, tão predestinado, Jesus e também dos Santos, apesar de Rosa, a Irmã Lúcia viu Nossa Senhora em cima de uma azinheira, guardou o segredo de Fátima, entalou Salazar e a Igreja, escreveu livros de memórias, encontrou-se com papas e é praticamente santa. Quer-se dizer, o Papa aprovou há menos de uma semana a publicação do decreto que reconhece as "virtudes heróicas" da Irmã Lúcia, e esta é a fase do processo que leva à proclamação de um fiel católico como beato, penúltima etapa para a declaração da santidade. Por outro lado, a SIC fez-lhe agora uma minissérie de três episódios, com Márcia Breia a protagonista e música de Rodrigo Leão, o que quer dizer que, para a beatificação, já só falta a aprovação de um milagre atribuído à santinha, mas essa parte ficará certamente a cargo da CMTV.
E é isto. Cada um é para o que nasce, e o nome é que nos destina. Eu nasci Américo Hernâni Von Doellinger e, espero que me perdoem, com um nome assim escaganifobético, desinspirador, insignificante e incréu, nunca tive, não tenho a mínima hipótese.

P.S. - Faz hoje anos. No dia 26 de Junho de 1927, o bispo de Leiria presidiu, pela primeira vez, a uma cerimónia oficial na Cova da Iria. No dia 26 de Junho de 2000, o Vaticano publicou o terceiro segredo de Fátima.

segunda-feira, 12 de junho de 2023

Os santos populares, o início

Fez-se um concurso na televisão. Uma espécie de concurso do vestido de chita para santos, organizado e transmitido pela CMTV, com apresentação da astróloga Maya. Ganhou São Sebastião. Mas na votação do público, isto é, de Portugal, os mais populares foram Santo António, São João e São Pedro, ex aequo, porque a coisa tinha de meter latim senão não valia. E foi assim que começou a tradição.

domingo, 4 de setembro de 2022

A problemática do bairro problemático

Não se pode dizer preto, não se pode dizer cigano, não se pode dizer anão, não se pode dizer maneta, não se pode dizer drogado, não se pode dizer gatuno, não se pode dizer pedinte, não se pode dizer pistoleiro, não se pode dizer sexo. Mas problemático pode dizer-se. A CMTV é especialista em problemático, sabe tudo sobre a problemática do problemático, e as outras cmtv também. Ainda agora, agora mesmo, olhei para a televisão e verifiquei que foi falecido a tiro um jovem de 24 anos num "bairro problemático". Um bairro problemático, querem eles dizer, é um bairro onde moram pretos, ciganos, anões, manetas, drogados, gatunos, pedintes, pistoleiros e gajos e gajas que se dedicam à indústria do género. Mas isto que não saia daqui.

quinta-feira, 14 de julho de 2022

Ai que desgraça tão grande!

Foto Hernâni Von Doellinger

Quando eu era mocico e a ambulância acudia a um desastre com a sirene em altos berros, as pessoas de Fafe corriam para as escadas do hospital. Ali se plantavam, esperavam, prognosticavam, diagnosticavam, e finalmente assistiam ao espectáculo. Ao vivo. Em casos mais graves e raros, assistiam também ao morto. As escadas do hospital eram um palco de desgraças e caldeirão de emoções, cenário de reality show sem que Portugal sequer soubesse o que isso viria a ser. Eram também muito jeitosas para tirar fotografias de grupo a casamentos, bombeiros em festa e bandas de música, palavra de honra. Eram, portanto, o sítio mais in da vila e só estorvavam naquilo em que deveriam melhor servir, que era carregar macas com feridos e doentes por aqueles degraus acima ou por aqueles degraus abaixo, às vezes de cangalhas até ao chão.
Mas o espectáculo. A ambulância saía e o povo corria. O bom do Senhor Ferreira via-se à rasca para manter na ordem aquela gente toda e tola que fazia guerra por um lugar na primeira fila, sobretudo mulheres afogueadas e gordas, com os socos e o coração nas mãos ou enrodilhados no avental arregaçado. Faço notar que não foi por distracção que escrevi "a" ambulância. O artigo definido é aqui propositado e certo, porque naquele tempo, dará para acreditar?, os Bombeiros de Fafe tinham apenas uma ambulância, uma velha Skoda vermelha que regularmente ficava sem travões no meio das descidas. Pois, como dizia, as pessoas de Fafe corriam para as escadas do hospital e regalavam-se de braços decepados e orelhas arrancadas e narizes esborrachados e fémures a céu aberto e pés desfeitos e tripas de fora e miolos ao léu e espinhelas partidas e... - Foi tiro?, Foi facada?, Foi sachola?, Foi o home?, Foi a amante? Foi desastre?, Foi o vinho? Ai que desgraça tão grande! E muitos Uis! e muitos Ais! e muitos Coitadinhos! e muitos Valha-nos Deus! Esqueciam-se ali no relambório, a dar água sem caneco e a benzerem-se na direcção da Igreja Nova, convenientemente ao lado, mas sem perder pitada. Vampiros mirones, iam ao sangue, queriam sobretudo molhanga, muita, vermelha vermelha como a ambulância que chegava enfim, esbaforida e ganinte. Era um fartote! Uma comoção! E nas cozinhas abandonadas e sombrias, os tachos esturricando ao lume pachorrento, azul e resmungão da máquina a pitroil...

Agora as pessoas não precisam de ir a correr para as escadas do hospital. Sentam-se em casa, ligam a televisão e vêem a CMTV.

P.S. - Publicado originalmente no dia 10 de Fevereiro de 2016. Hoje é Dia Mundial dos Hospitais. Porque é dia de São Camilo, protector dos enfermos e padroeiro dos hospitais.

segunda-feira, 6 de junho de 2022

Os santos populares

Fez-se um concurso. Uma espécie de concurso do vestido de chita para santos, transmitido em falso directo contínuo pela CMTV. Ganhou São Sebastião. Mas na votação do público, evidentemente supervisionada por um representante do Governo Civil que já não há, os mais populares foram Santo António, São João e São Pedro. E aí começou a tradição.

sábado, 4 de junho de 2022

É para a televisão?...

Foto Hernâni Von Doellinger

Topei-o da minha varanda e desci a correr mas pelo elevador. Atravessei a rua, aproximei-me e perguntei, educadamente: - Faz favor, é para a TVI?...
O senhor da câmara e bloco de apontamentos mediu-me de cima a baixo, tomou nota e respondeu-me, igualmente polido: - Não, meu caro senhor, isto é para... olhe... é preciso ser muito estúpido...
E eu: - Ah!, é para a CMTV...

P.S. - Hoje é Dia do Engenheiro Agrimensor.

sábado, 11 de setembro de 2021

O drama, a tragédia, o horror. O sangue...

Quando eu era mocico e a ambulância acudia a um desastre com a sirene em altos berros, as pessoas de Fafe corriam para as escadas do hospital. Ali se plantavam, esperavam, prognosticavam, diagnosticavam, e finalmente assistiam ao espectáculo. Ao vivo. Em casos mais graves e raros, assistiam também ao morto. As escadas do hospital eram um palco de desgraças e caldeirão de emoções, cenário de reality show sem que Portugal sequer soubesse o que isso viria a ser. Eram também muito jeitosas para tirar fotografias de grupo a casamentos, bombeiros em festa e bandas de música, palavra de honra. Eram, portanto, o sítio mais in da vila e só estorvavam naquilo em que deveriam melhor servir, que era carregar macas com feridos e doentes por aqueles degraus acima ou por aqueles degraus abaixo, às vezes de cangalhas até ao chão.
Mas o espectáculo. A ambulância saía e o povo corria. O bom do Senhor Ferreira via-se à rasca para manter na ordem aquela gente toda e tola que fazia guerra por um lugar na primeira fila, sobretudo mulheres afogueadas e gordas, com os socos e o coração nas mãos ou enrodilhados no avental arregaçado. Faço notar que não foi por distracção que escrevi "a" ambulância. O artigo definido é aqui propositado e certo, porque, naquele tempo, dará para acreditar?, os Bombeiros de Fafe tinham apenas uma ambulância, uma velha Skoda vermelha que regularmente ficava sem travões no meio das descidas. Pois, como dizia, as pessoas de Fafe corriam para as escadas do hospital e regalavam-se de braços decepados e orelhas arrancadas e narizes esborrachados e fémures a céu aberto e pés desfeitos e tripas de fora e miolos ao léu e espinhelas partidas e... - Foi tiro?, Foi facada?, Foi sachola?, Foi o home?, Foi a amante? Foi desastre?, Foi o vinho? E muitos Uis! e muitos Ais! e muitos Coitadinhos! e muitos Valha-nos Deus! Estavam ali no relambório, a dar água sem caneco e a benzer-se na direcção da Igreja Nova, mas sem perder pitada. Vampiros mirones, iam ao sangue, queriam sobretudo molhanga, muita, vermelha vermelha como a ambulância que chegava enfim, esbaforida e ganinte. Era um fartote! Uma comoção!...
Agora as pessoas não precisam de ir a correr para as escadas do hospital. Sentam-se em casa, ligam a televisão e vêem na CMTV.

P.S. - Publicado originalmente no dia 10 de Fevereiro de 2016.

domingo, 13 de junho de 2021

Os santos populares

Fez-se um concurso. Um concurso do vestido de chita para santos, transmitido em diferido contínuo pela CMTV. Ganhou São Sebastião. Mas na votação do público, evidentemente supervisionada por um representante do Governo Civil que já não há, os mais populares foram Santo António, São João e São Pedro. E aí começou a tradição.

domingo, 4 de abril de 2021

Jesus, Jesus, o que sente neste momento?

Foto Hernâni Von Doellinger

Se fosse hoje, a CMTV transmitiria a Ressurreição em directo. Reportagem de Tânia Laranjo, no local, ou pelo menos o nome de Tânia Laranjo no local, e comentários e molduras penais a cargo do ex-ministro Rui Pereira, em estúdio. Ou em casa, por teletrabalho, com uma biblioteca às costas... 

sábado, 11 de abril de 2020

Jesus, Jesus, o que é que sente neste momento?

Se fosse hoje, a CMTV transmitiria a Ressurreição em directo. Reportagem de Tânia Laranjo, no local, ou pelo menos o nome de Tânia Laranjo no local, e comentários e molduras penais a cargo do ex-ministro Rui Pereira, em estúdio. Ou em casa, por teletrabalho, com uma biblioteca às costas...

domingo, 21 de abril de 2019

Jesus, o que é que sente neste momento?

Se fosse hoje, a CMTV transmitiria a Ressurreição em directo. Reportagem de Tânia Laranjo, no local, comentários e molduras penais do ex-ministro Rui Pereira, em estúdio.

sábado, 28 de abril de 2018

O reality show começou em Fafe

Foto Hernâni Von Doellinger

Quando eu era mocico e a ambulância acudia a um desastre com a sirene em altos berros, as pessoas de Fafe corriam para as escadas do hospital. Ali se plantavam, esperavam, prognosticavam, diagnosticavam, e finalmente assistiam ao espectáculo. Ao vivo. Em casos mais graves e raros, assistiam também ao morto. As escadas do hospital eram um palco de desgraças e caldeirão de emoções, cenário de reality show sem que Portugal sequer soubesse o que isso viria a ser. Eram também muito jeitosas para tirar fotografias de grupo a casamentos, bombeiros em festa e bandas de música, palavra de honra. Eram, portanto, o sítio mais in da vila e só estorvavam naquilo em que deveriam melhor servir, que era carregar macas com feridos e doentes por ali acima ou por ali abaixo, às vezes de cangalhas até ao chão.
Mas o espectáculo. A ambulância saía e o povo corria. O bom do Senhor Ferreira via-se à rasca para manter na ordem aquela gente toda e tola que fazia guerra por um lugar na primeira fila, sobretudo mulheres afogueadas e gordas, com os socos e o coração nas mãos ou enrodilhados no avental arregaçado. Faço notar que não foi por distracção que escrevi "a" ambulância. O artigo definido é aqui propositado e certo, porque, naquele tempo, dará para acreditar?, os Bombeiros de Fafe tinham apenas uma ambulância, uma velha Skoda vermelha que regularmente ficava sem travões no meio das descidas. Pois, como dizia, as pessoas de Fafe corriam para as escadas do hospital e regalavam-se de braços decepados e orelhas arrancadas e narizes esborrachados e fémures a céu aberto e pés desfeitos e tripas de fora e miolos ao léu e espinhelas partidas e... - Foi tiro?, Foi facada?, Foi sachola?, Foi o home?, Foi a amante? Foi desastre?, Foi o vinho? E muitos Uis! e muitos Ais! e muitos Coitadinhos! e muitos Valha-nos Deus! Estavam ali no relambório, a dar água sem caneco e a benzer-se na direcção da Igreja Nova, mas sem perder pitada. Vampiros mirones, iam ao sangue, queriam sobretudo molhanga, muita, vermelha vermelha como a ambulância que chegava enfim, esbaforida e ganinte. Era um fartote! Uma comoção!...
Agora as pessoas não precisam de ir a correr para as escadas do hospital. Sentam-se em casa, ligam a televisão e vêem na CMTV.

P.S. - Fui a Fafe e verifiquei, com desgosto, que ainda há algumas árvores. Espero que a Câmara faça o que lhe compete: é cortá-las pela raiz, sem dó nem piedade, é queimar flores, sementes e plantas, para acabar de vez com a raça. As árvores são piores que javalis imaginários ou perdizes amestradas. E não fogem ao tiro. Viva a solução final e a Volta a Portugal! Fafe livre de árvores, já!

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

É para a televisão?... 5

Foto Hernâni Von Doellinger

Abandonei a varanda, meti-me no elevador, saí à rua, a minha, aproximei-me e perguntei, educadamente: - Faz favor, é para a TVI?...
O senhor da câmara e walkie-talkie na mão mediu-me de cima a baixo, tomou nota e respondeu-me, igualmente polido: - Não, meu caro senhor, isto é para... olhe... é preciso ser muito estúpido...
E eu: - Ah!, é para a CMTV...

P.S. - Podia ter acontecido...

terça-feira, 12 de setembro de 2017

É para a televisão?... 4

Foto Hernâni Von Doellinger

Aproximei-me e perguntei, educadamente: - Faz favor, é para a TVI?...
O senhor da câmara e bloco de apontamentos mediu-me de cima a baixo, tomou nota e respondeu-me, igualmente polido: - Não, meu caro senhor, isto é para... olhe... é preciso ser muito estúpido...
E eu: - Ah!, é para a CMTV...