quinta-feira, 30 de junho de 2022

Eu não lhe admito, senhor deputado!

- Eu não admito que o senhor deputado diga que eu disse isso, senhor deputado!
- Então o que é que o senhor deputado disse, senhor deputado?
- Eu disse aquilo, senhor deputado.
- Aquilo, senhor deputado? E só agora é que o senhor deputado diz isso, senhor deputado?
- Eu não admito que o senhor deputado diga que eu disse isso, senhor deputado!

Relativamente a essa matéria

- Relativamente a essa matéria, senhor deputado, devo esclarecer que não tenho nada a acrescentar relativamente a essa matéria.
- E relativamente à outra matéria, senhor primeiro-ministro?
- Relativamente à outra matéria, senhor deputado, devo esclarecer que não tenho nada a acrescentar relativamente à outra matéria.
- Bem me parecia, senhor primeiro-ministro!
- Ainda bem que nos entendemos, senhor deputado!

Realmente. O que seria de nós, do País, da Nação, do nosso amado Portugal, sem os nossos senhores deputados, sem os nossos senhores primeiros-ministros, gente assim de categoria?...

P.S. - Hoje é Dia Internacional do Parlamentarismo. 

Outros voos

Foto Hernâni Von Doellinger

quarta-feira, 29 de junho de 2022

Do Reino do Ponto a Freixo de Espada à Cinta

Paulo de Tarso, ou Saulo de Tarso, também conhecido como Apóstolo Paulo, São Paulo Apóstolo, Apóstolo dos Gentios ou simplesmente São Paulo, nem sempre foi o santo que hoje se pinta. Tem atrás de si um passado, como todos nós, mas um passado mais negro do que o da maioria de nós. Saulo era um fariseu radical, impiedoso, feroz, um zelota que se dedicava sem descanso à perseguição dos seguidores de Jesus. Era portanto do piorio, mau como as cobras, o diabo em pessoa, e só amansou e ganhou juízo quando Deus Ele mesmo lhe saiu ao caminho, dando-lhe um valente safanão e cegando-o temporariamente, a ver se ele aprendia. E ele aprendeu.
Assim miraculosamente convertido, Paulo resolveu pôr a correspondência em ordem e desatou a escrever missivas. Para além da algumas cartas com destinatário individual, sempre para homens, que fique devidamente registado, epistolou aos Romanos, aos Coríntios, aos Gálatas, aos Efésios, aos Filipenses, aos Colossenses, aos Tessalonicenses e eventualmente aos Hebreus. Catequizou também os Gentios, e quando eu graças a Deus descobri a Bíblia, em pequeno, julgava que os Gentios eram um povo assim como os Helvéticos ou os Teutónicos, naturais e residentes num país de que era proibido ou eventualmente pecado dizer o nome.
Os nomes na Bíblia sempre me fascinaram. Tanto que eu pensava (e ainda penso) que se São Paulo fosse hoje e se por acaso resolvesse escrever aos portugueses só se dirigiria, arrisco dizer, aos Albicastrenses, aos Egitanienses, aos Escalabitanos aos Brigantinos, aos Freixenistas ou Freixienses ou Freixonistas ou Freixonitas, gente assim de nome fidalgo ainda que indeciso e nunca abaixo disso.
E Melquisedeque? Ai o que eu gostava do nome Melquisedeque! E Ponto e Bitínia e Capadócia e Antioquia, nomes assim de perlimpimpim. Antioquia que me fazia sonhar aventuras das mil e uma noites, lamentando embora que São Paulo, que aqui terá pregado o seu primeiro sermão, nunca tenha mandado uma epístola na volta do correio, uma sequer para amostra, aos simpáticos e desamparados Antioquenses.
Já quanto aos sodomitas, habitantes de Sodoma, continuo a achar que ficaram com a pior parte da fama. Os gomorritas safaram-se, vá-se lá saber porquê, e nem constam nos dicionários. A História às vezes é muito injusta e parece-me que a Bíblia devia ter aqui uma palavra a dizer...

P.S. - Hoje é Dia de São Paulo, um santo, por assim dizer, impopular, e derivado a isso não tem direito a cascata. É também Dia do Papa, de São Pedro, do Pescador, da Lama e do Telefonista.

Cinquenta certinhos

Foto Hernâni Von Doellinger

terça-feira, 28 de junho de 2022

Lourenço da Arrábida

O problema do Lourenço da Arrábida era o equívoco. Ou o gozo. O inocente equívoco ou o gozo premeditado, ele ainda não chegara à conclusão. O certo é que as pessoas estavam sempre a perguntar-lhe pelo Omar Sharif, pelo Anthony Quinn, pelo Alec Guinness, ou se realmente ele viu Judas a cagar no deserto. Chamavam-no à televisão para comentar a situação no Médio Oriente, mas admiravam-se por ele ainda estar vivo, uma vez que para os devidos efeitos morrera num acidente de mota. Perguntavam-lhe também, se, por falar nisso, a Guinness deve ser bebida fresca ou à temperatura ambiente como alguns têm a mania. Enfim, já se sabe como são as pessoas. 
O bom do Lourenço primeiro ia aos arames, afinava. Cego pelos nervos, num repente rapava da adaga e desatava a gritar "mouros!" e a matar a torto e a direito felizmente só da boca para fora. Quantas tragédias foram assim prometidas e adiadas, para enorme desconsolo da CMTV e assinalável prejuízo da indústria funerária da região. Mas com o tempo o nosso herói assentou, ganhou calo no cu, como se diz. Agora se o azucrinam com as tretas do costume, encolhe os ombros largos de desdém, pigarreia uma e outra vez, sacode duas valentes chibatadas no camelo de estimação e desaparece dali a galope, ondulando o manto branco por entre hordas descontroladas de turistas e outros infiéis que descem e sobem aos encontrões a completamente escangalhada Rua Mouzinho da Silveira.

Quando apontar é lindo!

Foto Hernâni Von Doellinger

segunda-feira, 27 de junho de 2022

Mas havia altifalantes...

Pardelhas, Fafe. Festa de São Pedro. A Internet ainda estava no cu dos americanos, parece impossível mas não havia Facebook nem Twitter, o telemóvel chamava-se telefone, trabalhava a manivela e só se deslocava da mesinha de cabeceira para a cama, se o fio deixasse, e o e-mail chamava-se telegrama. A comunicação era boca a boca, como a respiração, as conversas seguiam de bicicleta e as mais prementes voavam de motorizada, as redes sociais iam num pé e vinham noutro. Mandavam-se recados, levavam-se "repostas" - assim se dizia na minha terra, e eu gostava. Era ainda a idade das trevas, pelo menos até ao nascer do sol, geralmente por volta das seis da manhã naquele altinho e naquela parte do ano.
Mas havia altifalantes, e urgências são urgências. A meio do "Carrapito da Dona Aurora", que estava a correr tão bem, alguém corta o pio aos do Conjunto António Mafra, sopra asmaticamente no velho microfone Philips, "um, dois, um, dois, experiência", e, desassossegando a aldeia inteira, grita na maior das aflições:
- Atenção, muita atenção! Ó Silva, trazei-me cá o martelo, caralho...

Sea for two and two for sea

Foto Hernâni Von Doellinger

domingo, 26 de junho de 2022

Crime imperfeito

Tirando as minhas caminhadas matinais à beira-mar, passo o dia inteiro enfiado em casa. Sozinho. Quer-se dizer: vivo sem testemunhas. E isso começa a assustar-me. Tenho medo de ser apanhado. Porque - bem vejo o que acontece nos policiais da televisão - sozinho em casa não serve como álibi.

Pas de trois

Foto Hernâni Von Doellinger

sábado, 25 de junho de 2022

Eu gosto muito do SNS

Era só isto que eu tinha para dizer. Gosto muito do nosso Serviço Nacional de Saúde. Para mim, o Serviço Nacional de Saúde é as pessoas. As pessoas do Serviço Nacional de Saúde. As pessoas que cuidam de nós. De mim. Com ou sem pandemias. Muitíssimo obrigadíssimo!

Cabeleireiro masculino

"Cabeleireiro masculino". Olho para o reclame e fico sempre naquela. Mas quê, será masculino porque é homem? Ou será masculino porque atende homens, isto é, barbeiro? E se o cabeleireiro masculino for mulher, não deveria dizer-se, sem ofensa, cabeleireira masculina? E se o cabeleireiro for feminino, o que é que temos a ver com isso? E se o barbeiro for mulher, não vamos mais longe, porque é que não é barbeira? E em caso de indefinição ou escolha múltipla, coisa absolutamente natural, poderá ser, por exemplo, barbeire? Cabeleireire? São problemas assim que de facto me afligem - quero lá saber da guerra na Ucrânia, do aborto nos EUA ou da pobreza de todos os feitios em Portugal...

Pede meia, pede atleta, pede cabra

Foto Hernâni Von Doellinger

sexta-feira, 24 de junho de 2022

São João, agora só em Maio

E pronto, lá se foi mais uma noitada de São João. A noite mais longa do Porto, como também lhe chamam. Agora só em Maio do próximo ano, quando terminar o campeonato...

A última impressão

"A última impressão é a que fica", dizia repetidamente. E sabia do que falava. Era tipógrafo, especialista em offset.

P.S. - Hoje é Dia das Empresas Gráficas. No Brasil.

Como uma rocha

Foto Hernâni Von Doellinger

quinta-feira, 23 de junho de 2022

De luto

Hoje é Dia Internacional das Viúvas. Lamento informar.

Olimpicamente

Como é que ele se sentia? Ora, sendo ele quem era, vindo ele de onde vinha, como haveria de sentir-se? Pois sentia-se olímpico, homérico, plutónico, titânico, vulcânico, erótico, apolíneo, afrodisíaco, epicúrio, hermético, báquico. Absolutamente. Mas sobretudo olímpico. Quiçá também um pouco messiânico, salomónico, angélico porém satânico, vá lá. Era realmente muito dado à antiguidade clássica, às mitologias, à espiritualidade primordial e definitiva, ao desporto amador. E daí não transigia. Compreenda-se portanto a potência da ira que o acometeu quando inesperadamente lhe disseram que ele parecia estar, assim visto de fora e tão depois de Cristo, um tudo-nada dantesco, algo sádico às tantas...

P.S. - Hoje é Dia Olímpico. E todos os golos devem ser marcados de canto directo.

Do pé para a mão

Foto Hernâni Von Doellinger

quarta-feira, 22 de junho de 2022

Crónicas da emigração

Daniel Bastos apresenta em Guimarães, no próximo sábado, o seu mais recente livro, "Crónicas - Comunidades, Emigração e Lusofonia". A obra reúne os textos que o autor tem publicado nos últimos tempos em meios de comunicação dirigidos às comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo. Apresentação a cargo de Luís Soares, deputado na Assembleia da República. A partir das 21h30, na Fnac do GuimarãesShopping.

São João pum e São João pim

(Como toda a gente sabe - como ficou muito bem aprendido no filme "O Pai Tirano", o antigo, o verdadeiro, o de António Lopes Ribeiro que eu ainda conheci pessoalmente, o a preto e branco, o de 1941, o que tem mesmo piada -, como toda a gente sabe, dizia, há duas qualidades de botas de caça: as botas de caça pum e as botas de caça pim, Vasco Santana dixit. Pois, por estranho que possa parecer, com os Sãos Joões sucede exactamente o mesmo. Quer-se dizer.)

O azar do nosso São João, o Baptista, é não ter sido o outro, o Evangelista. O nosso São João era um bocado esquisito mas muito homem: profeta ambulante, vestia-se de peles de camelo, usava um cinto de couro, comia gafanhotos e mel e convivia muito bem com cabritinhos e cabritinhas. Clamava no deserto. Um deserto que inopinadamente tinha um rio chamado Jordão como o cinema de Guimarães, e foi ali mesmo, no rio que não no cinema, que João, o nosso, inventou o baptismo e baptizou o primo Jesus. O nosso São João era a Ana Gomes daquele tempo. Punha a boca no trombone sem pauta nem contenção e isso haveria de custar-lhe a cabeça, ainda nem chegara aos trinta anos. Os amigos do Baptista tinham uma certa vergonha dele e muito gosto na própria cabeça, e por isso deram-lhe o nome de código de O Precursor, para que não se soubesse de quem falavam quando falavam. Hoje em dia, o analfabetismo instalado chama-lhe O Percursor.

O São João que não é nosso, o Evangelista, era mais manso e teve uma vida flauteada. Morreu velho e de morte natural. Filho de Zebedeu, irmão de Tiago Maior e eventualmente sócio de André e Pedro no negócio das pescas, seria o mais novo dos doze apóstolos do Nazareno, segundo consta. De pescador quiçá analfabeto, fez-se teólogo e escritor. De evangelho e epístolas, apocalíptico então. Discípulo dilecto, João, o que não é nosso, era aquele a quem Jesus amava, o que se lhe aninhou no peito durante a Última Ceia, está nos retratos. O assunto continua a prestar-se, ainda hoje, às mais diversas e variadas.

No meu tempo de Fafe, quanto a santos populares, o São João era um hospital muito grande no Porto, felizmente com a camioneta da João Carlos Soares a passar-lhe à porta. Tínhamos, isso sim, o Santo António da minha rua, o São Pedro da Recta e creio que ainda frequentei o São Pedro da Granja. Quanto ao resto, deixe estar que está bem.
O mais que se sabia do São João eram uns versinhos muito antigos que certamente pertencem ao cancioneiro fafense e era de norma cantar à mesa na noite de passagem de ano, quando já estavam todos mais para lá do que para cá. Assim fazíamos na nossa família. Insisto, para quem não é de Fafe: fafense deve ler-se e dizer-se fafénsse. E os versinhos contavam mais ou menos assim:

O São João, ó dlindlindlim,
tem um carneiro, ó dlandlandlam,
com dois guizos no pescoço.
E quando toca, ó dlindlindlim,
o guizo fino, ó dlandlandlam,
também toca o guizo grosso.

P.S. - Publicado originalmente no dia 22 de Junho de 2019, sob o título "Os Sãos Joões".

Tapetes de ver a Deus

Foto Hernâni Von Doellinger

segunda-feira, 20 de junho de 2022

Faziam-se homens e pronto

No meu tempo era mais fácil fazer homens. Levavam-se os rapazes às putas, mandavam-se os rapazes para a tropa, e estava o assunto resolvido. Hoje em dia a coisa exige outros mimos, ciência... 

Sereias da borda d'água

Foto Hernâni Von Doellinger

domingo, 19 de junho de 2022

O periquito da Carolina, ó i ó ai

O último periquito-da-carolina morreu no dia 21 de Fevereiro de 1918, em cativeiro, no Jardim Zoológico de Cincinnati, EUA. Chamava-se Incas e era macho. Que pena o nosso Quim Barreiros não saber destas coisas. Conhecesse ele a triste história do periquito-da-carolina e certamente já lhe teria feito uma cantiga a condizer.

P.S. - O admirável Quim Barreiros nasceu no dia 19 de Junho de 1947. Faz hoje 75 anos e nem uma branca. Parabéns, ó Quim!

Subpessoas

Já repararam que para efeitos de restaurante as crianças não são pessoas. A mim não me parece bem.

O pior é acordar

Foto Hernâni Von Doellinger

sábado, 18 de junho de 2022

Pela família, tudo!

Convidou a parentela considerada mais próxima, vinte pessoas e treze crianças. Marcou restaurante para as duas em ponto. Encomendou azeitonas, bacalhau assado no forno e tripas à moda do Porto, bebidas e sobremesa à escolha de cada qual. Pediu pratos de plástico, copos de plástico, talheres de plástico, correntes de ar, moscas e se possível formigas. Era a sua vez de organizar o tradicional piquenique de família e queria tudo como deve ser.

P.S. - Hoje é Dia Internacional do Piquenique.

Sushi, a verdadeira história

Façam o obséquio de tomar nota! Sob o generoso fio corrente de água fria da torneira, desfiar meticulosamente uma boa posta de bacalhau da peça, sem pele e sem espinhas. Passar os fiapos do bacalhau por mais uma, duas ou três águas, sempre frias, agitando-o, ao bacalhau, e espremendo-o, até que fique no ponto de sal. Regar com azeite do melhor e três ou quatro pingas de vinagre, cobrir e misturar com cebola cortada às rodelas bem fininhas, picar um quase nada de alho, salpicar ao de leve com pimenta branca e enfeitar com azeitonas pretas. Está pronto! Sushi de bacalhau - inesperado, inovador e chique. Os antigos chamam-lhe punheta.

P.S. - Hoje é Dia Internacional do Sushi.

Também faço isto muito bem

Foto Hernâni Von Doellinger

quinta-feira, 16 de junho de 2022

Tanques para a Ucrânia

Portugal mandou tanques para a Ucrânia. Para além dos tanques, Portugal vai também mandar estendais, cestos e molas.

Missais terra-ar

Portugal acaba de enviar missais para a Ucrânia. Pequenos missais de rito bracarense praticamente novos. As ordens eram para mandar mísseis, mas alguém da intendência fez confusão ao aviar a encomenda.

Vai passar a procissão

Foto Hernâni Von Doellinger

quarta-feira, 15 de junho de 2022

Vá para dentro!

Evite sair de casa. Feche bem, reforce e proteja janelas e portas. Fixe todos os objectos exteriores que possam ser arrastados, recolha cadeiras, mesas, toldos e guarda-sóis. Se tiver mesmo de ir à rua, mantenha a calma e abrigue-se em lugares seguros, não toque em cabos ou fios eléctricos, afaste-se de árvores, materiais suspensos com risco de queda e superfícies envidraçadas. Na estrada, limite a velocidade e redobre cuidados especialmente se conduz veículos longos ou com reboque. Não saia da viatura, feche vidros e ligue as luzes de sinalização, mantendo-se longe dos edifícios. Isso mesmo. Hoje é Dia Mundial do Vento e tudo pode acontecer... 

Fitness?

Foto Hernâni Von Doellinger

terça-feira, 14 de junho de 2022

A omissão de Deus

- Deus diz-lhe alguma coisa?
- Não, Deus nunca me disse nada.
- É portanto ateu, agnóstico talvez, ou digamos indiferente...
- Por acaso até sou crente, religioso e bastante praticante.
- Mas diz que Deus nada lhe diz...
- Pois é. Falo muito para o boneco...

P.S. - Hoje é Dia Universal de Deus.

Ó solo mio

Dizia o famoso guitarrista: - Mais vale solo do que mal acompanhado...

O solista

Com aquela mania de falar de cor, entrou na conversa dois compassos antes do tempo. Quer-se dizer: ficou a falar sozinho...

P.S. - Hoje é Dia do Solista. Pelo menos no Brasil.

Os meus cromos 71: Maria Rita

Foto Hernâni Von Doellinger

domingo, 12 de junho de 2022

Santos impopulares

Hoje é dia de Santo Onofre, considerado, por exclusão de partes, um dos mais de vinte mil santos impopulares da Igreja Católica. Por tradição, na noite de Santo Onofre desfilam as marchas e comem-se sardinhas assadas, mas isso já derivado ao santo do dia de amanhã, o nosso Santo António, um dos três únicos santos da corda.

sábado, 11 de junho de 2022

Mas quando o Barnabé nos deixou...

Foto Hernâni Von Doellinger

Que é que tem o Barnabé que é diferente do outro? Para começar, é baixinho, abreviado como estampa. Por isso o Senhor Barnabé ele próprio se resume, humilde, e diz que o povo todo o conhece por Bé, e é assim que gosta de ser chamado, contou-me ele. Bé. Estão a ver aquele homenzinho gentil, doce, dez-réis de gente num ar pândego de pinto-calçudo, sacola de merenda a tiracolo, sempre mortinho por concordar com tudo e com todos, estaca aqui para falar com um, estaciona ali para conversar com outro, e na cara, em vez de cara, um sorriso maroto, cândido, inextinguível? Estão a ver? É o meu Senhor Bé. Eu e Senhor Bé partilhamos todas as manhãs o Passeio Atlântico de Matosinhos e suponho que somos amigos. Há também quem o conheça por "São Pedro da Cova", porque é de lá que ele vem diariamente de autocarro para passear vagaroso a borda do mar. Nos seus oitenta e picos bem medidos, são quase duas horas de viagem para cada lado, com transbordo, todos os dias ou quase, mas sem lamúrias. O Senhor Bé - que também se lembra, como eu, de quando Fafe e São Pedro da Cova andaram à pancada por causa da bola - faltou-me ao convívio no tempo de estado de emergência, mas logo que pôde tirou outra vez o passe e voltou. Diz que estava cheio de saudades.
Eu contei-lhe do outro Barnabé, que dava dois dele, ou três. O Senhor Barnabé de Fafe, funileiro de alto gabarito, morador e estabelecido naquele escondidinho do Santo Velho e músico vitalício da Banda de Revelhe. O Senhor Barnabé fafense devia ser uma enorme despesa em farda e tocava tuba porque não havia instrumento maior, tirando talvez o bombo, e a tuba vinha-lhe realmente por medida. Quanto ao Senhor Bé, que certamente não gastaria metro e meio para um fato, eu às vezes até me ria imaginando-o, pequenino e gaiato, a tocar pífaro.
Que se segue? Aqui há coisa de três meses o Senhor Bé tornou a faltar-me e eu, confesso, escarmentado com o desaparecimento da minha abençoadora das 7h30, fiquei com medo de perguntar por ele. Mas três meses são três meses, estamos no Natal, e ontem ganhei finalmente coragem. Fui tirar nabos do púcaro junto de outro dos habitués do Passeio, e ouvi o que não queria. O Senhor Bé não vem mais. Morreu. Exactamente há três meses. Foi mudar uma válvula ao coração "e ficou na máquina", disse-me o amigo. Ficou na máquina. Assim.
Quer-se dizer: o Senhor Bé morreu e eu, palavra de honra, acho isto muito mal organizado.

P.S. - Publicado originalmente no dia 23 de Novembro de 2021, sob o título "Que é que tinha o Barnabé?". Hoje é dia de S. Barnabé, e portanto...

sexta-feira, 10 de junho de 2022

A culpa é sempre do povo

Já não bastava tudo o que lhe chamam e tudo o que lhe fazem e desfazem, tudo o que lhe atiram e tiram, o tratamento de merda que lhe dão desde que isto começou a ser Portugal. Agora acusam o povo de ser a pátria...

Pedimos desculpa por esta interrupção

Hoje é feriado, amanhã é sábado, depois de amanhã é domingo e segunda-feira é outra vez feriado. Viva! Portugal é realmente um grande país! E estará de volta, se Deus quiser, na próxima terça-feira...

Ó mar salgado

Foto Hernâni Von Doellinger

quinta-feira, 9 de junho de 2022

Na véspera de Portugal

Hoje é véspera de Portugal. Amanhã é Portugal. Depois de amanhã é sábado.

E os casamentos de Santo António?

Sim, os casamentos de Santo António, esse ancestral, nunca desmentido e bem aferrolhado segredo das catacumbas vaticanas. Quantos foram afinal? Quantas vezes se casou o santo? Duas, como a Luciana Abreu? Três, como o Pedro Santana Lopes? Quatro, como o José Cid e o Nicolas Cage? Não se sabe quantas, como o Pinto da Costa? Oito, como a Elizabeth Taylor? Vinte e três, como Linda Wolfe? Vinte e oito, como Glynn Wolfe? E os divórcios do fradinho - amigáveis ou litigiosos? Poligamia eventualmente? E filhos, houve-os? E os noivos de Santo António, serão apenas um boato? Má-língua? Descarada homofobia? O silêncio da Igreja Católica sobre este escândalo é ensurdecedor. A ignorância da revista Lux sobre este ensurdecedor é um escândalo.

P.S. - Publicado originalmente no dia 8 de Junho de 2019. Os respectivos números de casamentos poderão estar entretanto desactualizados. Por defeito, evidentemente.

quarta-feira, 8 de junho de 2022

A senhora de Matosinhos

Foto Hernâni Von Doellinger

As árvores da minha rua crescem muito. Crescem tanto, que os seus vigorosos ramos costumam dar no focinho aos turistas que por aqui passam nos autocarros descapotáveis de dois andares. E os turistas, é preciso que se note, viajam lamentavelmente sem capacete.
A Câmara de Matosinhos, que faz de conta que liga very much ao turismo e aos turistas, mais até do que aos próprios matosinhenses, não mexe uma palha para meter na ordem as árvores insolentes e mal agradecidas. E, para vergonha da abandonada vizinhança, os incautos visitantes continuam a ser diariamente seviciados mesmo à frente dos nossos indesmentíveis olhos, vergastada atrás de vergastada. Continuavam.
No passado domingo, a cada vez mais despovoada procissão do Senhor de Matosinhos desceu a minha rua, como quase todos os anos, mas este ano movimentando-se em suspeitíssimo ziguezague, exactamente para que o andor com a preciosa e imponente cruz de Bouças pudesse passar sem mais violência ou outras avarias por entre as irrequietas pernadas das árvores que crescem muito, e os pegantes à rasca e os irmãos da confraria com o credo na boca e até eu com o coração nas mãos a ver quando é que aquilo tudo caía de cangalhas...
Ora acontece que atrás da cruz e do pálio cerimonial caminhava elegantíssima, como manda a tradição, a senhora presidente da Câmara, isto é, Nossa Senhora de Todas as Procissões, acenando para as varandas festivas, ao lado do inefável vereador Fernando Rocha, que também não falha uma, no seu fatinho de ver a Deus e naquele passinho bem ensaiado de autoridade local.
Que se segue: como que por milagre, as árvores da minha rua que crescem muito estão sendo finalmente desbastadas. Agora mesmo. Os serviços camarários entraram em acção de mansinho logo na segunda-feira, ordens de cima, como quem não quer a coisa, e hoje já atacam de motosserra em punho - estão a ouvir? É. Desalapar o cu dos gabinetes e ver como é que corre, cá fora, a vida real, às vezes até poderia ser boa ideia. Nem que seja só para dar nas vistas...

Lá vem a Nau Catrineta

Foto Hernâni Von Doellinger

Santos da casa

Santo António, São João e São Pedro são populares porque são nossos, são portugueses nados e criados, gente da nossa terra. Santo António de Lisboa, São João nascido no Porto ou em Braga, os entendidos ainda não se entenderam, e São Pedro da Afurada, conforme consta no Registo Civil.  

Jesus nasceu ali para os lados dos Jerónimos

As coisas em que a gente acredita quando é miúdo! Eu, por exemplo, acreditava piamente que o Menino Jesus era português - morra já aqui se estou a mentir. Eu ia à missa, ajudava, ouvia com gosto aqueles bocadinhos de Bíblia e fazia a conexão que se impunha: se a Samaritana é de Coimbra, se os apóstolos são todos portugueses, é só ver os nomes - João e Tiago, filhos de Zebedeu, Pedro, André, Mateus, Tomé, Bartolomeu, e por aí fora -, se o Jordão é em Guimarães e o Calvário em Fafe, se Roma é uma avenida em Lisboa, se Nazaré e Belém são nossos, então o Menino Jesus também é. Deus é nosso. Se Deus quiser até joga na Selecção e marca os golos que Lhe apetecer. Já grande, e após alguns anos de desengano e reeducação religiosa nos trabalhos forçados do seminário, passei a olhar com um certo carinho e determinada melancolia para esta minha crença infantil e patriótica. Depois veio Cavaco Silva, em 2006, e eu deixei finalmente de acreditar. Dediquei-me à exegese, à hermenêutica, à toponímia, à topogígia, à geografia e à natação sincronizada sob chuveiro, sem ofensa para os presentes e apenas às primeiras quartas-feiras de cada mês, de três em três meses, dez minutos antes de me deitar.

Cor de burro quando foge

Foto Hernâni Von Doellinger

terça-feira, 7 de junho de 2022

As marchas populares

De entre as marchas mais populares, creio que será justo destacar a Grande Marcha, a marcha luminosa, a Marcha Fúnebre, a marcha lenta, a marcha-atrás ou marcha à ré, a marcha forçada, a marcha atlética, a Marcha Nupcial, a Marcha Turca, a marcha tudo, a Marcha dos Pinguins, a Marcha Triunfal, a Marcha do FC Porto, a Marcha Radetzky e evidentemente The Stars and Stripes Forever.

Eu tenho a força!

Foto Hernâni Von Doellinger

segunda-feira, 6 de junho de 2022

Os santos populares

Fez-se um concurso. Uma espécie de concurso do vestido de chita para santos, transmitido em falso directo contínuo pela CMTV. Ganhou São Sebastião. Mas na votação do público, evidentemente supervisionada por um representante do Governo Civil que já não há, os mais populares foram Santo António, São João e São Pedro. E aí começou a tradição.

domingo, 5 de junho de 2022

O povo foi às farturas...

Foto Hernâni Von Doellinger

O ambiente tem dias...

No Parque da Cidade do Porto há cisnes-mudos, gansos-bravos, gansos-do-egipto, patos-reais, galinhas d'água, galeirões-comuns, guinchos, piscos-de-peito-ruivo, melros-pretos, chapins-reais, pardais-comuns e pegas. Esta é a população oficialmente recenseada. Mas também há coelhos e toupeiras, gatos e cães vadios, pombas e gaivotas, galinhas, galos e garnisés, papagaios e outros benfiquistas, corredores, andadores e passeadores afins, rãs, sapos e salamandras, lesmas e caracóis, grilos e gafanhotos, borboletas a certa hora, sardaniscas e lambisgóias, sardões com e sem rabo, espreitas, masturbadores e bicicletas, cavalos-republicanos às vezes, burros de um modo geral.
No tempo do Primavera Sound, que é no que estamos, há também camiões, guindastes e contentores, dezenas de geradores, megapalcos, supertendas, barracas, tonéis de cerveja, toneladas de lixo e pés, decibéis à solta, ameaços de terramotos, aluimentos, quem dera que não chova, Deus queira que não caia. Há vedações e avisos, pedimos desculpa pela interrupção, o parque segue dentro de dois meses. Quem estiver mal que se mude, prometemos deixar tudo como estava.
Não sei é se aquele fauna toda foi devidamente notificada.

P.S. - Hoje é Dia Mundial do Ambiente.

sábado, 4 de junho de 2022

É para a televisão?...

Foto Hernâni Von Doellinger

Topei-o da minha varanda e desci a correr mas pelo elevador. Atravessei a rua, aproximei-me e perguntei, educadamente: - Faz favor, é para a TVI?...
O senhor da câmara e bloco de apontamentos mediu-me de cima a baixo, tomou nota e respondeu-me, igualmente polido: - Não, meu caro senhor, isto é para... olhe... é preciso ser muito estúpido...
E eu: - Ah!, é para a CMTV...

P.S. - Hoje é Dia do Engenheiro Agrimensor.

À boleia

Foto Hernâni Von Doellinger

sexta-feira, 3 de junho de 2022

A moda pode ser fatal

As bicicletas estão na moda. As bicicletas e as trotinetas. As cenas de pancadaria, facadas, tiros e mortes entre jovens bandidos, por nada ou por quase nada, também. É. A moda tem muito que se lhe diga...

A bisculeta

A bisculeta é um utensílio doméstico com pelo menos quatro rodas: a roda da frente, a roda de trás, a roda pedaleira e o pinhão. Vulgarmente conhecida como velocípede sem motor ou bicicleta, há também quem lhe chame automóvel derivado exactamente àquilo das quatro rodas. 

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Bicicleta. Que também é a 19 de Abril...

Ó transitórias estátuas

Foto Hernâni Von Doellinger