Foto Hernâni Von Doellinger |
As árvores da minha rua crescem muito. Crescem tanto, que os seus vigorosos ramos costumam dar no focinho aos turistas que por aqui passam nos autocarros descapotáveis de dois andares. E os turistas, é preciso que se note, viajam lamentavelmente sem capacete.
A Câmara de Matosinhos, que faz de conta que liga very much ao turismo e aos turistas, mais até do que aos próprios matosinhenses, não mexe uma palha para meter na ordem as árvores insolentes e mal agradecidas. E, para vergonha da abandonada vizinhança, os incautos visitantes continuam a ser diariamente seviciados mesmo à frente dos nossos indesmentíveis olhos, vergastada atrás de vergastada. Continuavam.
No passado domingo, a cada vez mais despovoada procissão do Senhor de Matosinhos desceu a minha rua, como quase todos os anos, mas este ano movimentando-se em suspeitíssimo ziguezague, exactamente para que o andor com a preciosa e imponente cruz de Bouças pudesse passar sem mais violência ou outras avarias por entre as irrequietas pernadas das árvores que crescem muito, e os pegantes à rasca e os irmãos da confraria com o credo na boca e até eu com o coração nas mãos a ver quando é que aquilo tudo caía de cangalhas...
Ora acontece que atrás da cruz e do pálio cerimonial caminhava elegantíssima, como manda a tradição, a senhora presidente da Câmara, isto é, Nossa Senhora de Todas as Procissões, acenando para as varandas festivas, ao lado do inefável vereador Fernando Rocha, que também não falha uma, no seu fatinho de ver a Deus e naquele passinho bem ensaiado de autoridade local.
Que se segue: como que por milagre, as árvores da minha rua que crescem muito estão sendo finalmente desbastadas. Agora mesmo. Os serviços camarários entraram em acção de mansinho logo na segunda-feira, ordens de cima, como quem não quer a coisa, e hoje já atacam de motosserra em punho - estão a ouvir? É. Desalapar o cu dos gabinetes e ver como é que corre, cá fora, a vida real, às vezes até poderia ser boa ideia. Nem que seja só para dar nas vistas...
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