domingo, 15 de junho de 2025
Cuidado com as correntes de ar!
quarta-feira, 15 de junho de 2022
Vá para dentro!
terça-feira, 15 de junho de 2021
O senhor do monte
O flato mágico
Infelizes, sim, os que nunca ouviram o Moisés a peidar-se pelo soleno da noite, ali para os lados da Feira das Galinhas, hoje parece-me que parque de estacionamento e Praceta Egas Moniz. Aquilo é que era um artista, um verdadeiro predestinado. O Moisés. Os peidos do Moisés, impõe-se que aqui se diga, eram poderosos como pragas, abriam mares, incendiavam sarças, escreviam lei na pedra, abanavam os alicerces da Igreja Nova, mesmo em frente, Deus nos perdoe. Os peidos do Moisés seriam hoje considerados e explorados e exportados como energia alternativa. Mas também eram mansos, melodiosos, trinados, sin-co-pa-dos, contidos, meditabundos, quase confidenciais. O Moisés solfista trabalhava, com efeito, em vários registos, um dos quais, de execução particularmente exigente, mezzo piano, chamava-se "rasgar chita" e costumava encerrar o concerto, com mais dois ou três encores. (O Moisés aceitava pedidos.) Os peidos do Moisés eram um tremendo êxito, embora infelizmente nunca tenha gravado e apenas actuasse para plateias restritas e altamente seleccionadas. Cumpre-me finalmente fazer notar que o sintetizador, tal como actualmente o conhecemos, ainda não tinha sido inventado...
Uma questão de tempo
Se dormir no chão, ponha capacete
Sempre gostei de me deitar no chão. Desde pequenino. O Verão em Fafe
era um forno, e a nossa mãe punha-nos a dormir a sesta no chão da casa,
não no chão estreme mas por cima de um cobertor fininho e fofo, e
dormíamos como anjos de barriguinha ao léu. Porque o ar rasteiro é mais
fresquinho, está provado cientificamente, e a nossa mãe sabia também
disso, embora nunca tivesse ouvido falar de correntes de convecções,
fluidos, átomos ou moléculas.
Habituei-me. Sempre que pude na vida, dormi a minha soneca no chão do
campo, do monte e até da praia, se pela fresca da manhã. Casei e fui
morar para a Foz, no Porto: a casa dos meus sogros tinha um
quintal-jardim que era um mimo, e era ali que eu me estendia, no cimento
do caminho ou na relva do coradoiro, em tardes e noites de suar em
bica. Depois bebia uma ou duas garrafas de espadal frigorificadas e já
estava em condições de ir para a cama...
Agora, há mais de trinta anos em Matosinhos, com o mar a passar na minha rua:
agora custa-me a deitar, ainda por cima no chão, que me fica cada vez
mais longe,
e preciso de um guindaste para me levantar. Mas não resisto: de quando
em
quando dá-me para a toléria - é a idade -, ponho o capacete e, em quatro
ou cinco
movimentos muito complicados e perigosos, às vezes doze, consigo
deitar-me no chão da sala, com muitos ais e uis pelo meio e a televisão
ligada só para que o som me
faça companhia. Às tantas a minha mulher entra, assusta-se e grita: -
Ai, meu Deus, que ele morreu! Que é da motorizada?...
E eu, de olhos fechados e mãos cruzadas sobre o peito: - Morri, o
caralho! Estou apenas deitado no chão. Chama a polícia, que a culpa foi
do outro...
Mural da história: este calor será do tempo? Pinte-se!
P.S. - Publicado originalmente no dia 2 de Julho de 2017.