Eu e o meu tio Zé de Basto, que trato por você e a quem peço a bênção, fazemos pouca diferença de idade. Ainda fomos parceiros de aventuras durante os dias das férias grandes que eu, em miúdo, passava na aldeia. Ele era já um rapazola. E juntos éramos um desastre.
Foi o meu tio quem me ensinou a andar de mota de pau, o que correu muito bem e até nem lhe deu grande trabalho, porque, se não sabem ficam agora a saber, nas motas de pau não se anda, cai-se. E eu nasci para aquilo: era trambolhão de criar bicho!
O meu tio largava-me carreiro abaixo e ao fim de dois metros eu já tinha deixado a mota para trás, enrodilhado em séries de espectaculares e descontrolados vira-cus que só acabavam lá no fundo da ribanceira, com as costas espetadas numa árvore e a mota a cair-me em cima e em cheio, de rodas para o ar, a girarem, a girarem, como nos filmes...
Eu punha-me a pé no meio de uma nuvem de pó, zonzo, pronto a chorar, com a boca cheia de sangue e de terra, os joelhos a discutirem com os cotovelos quem é que estava mais esfolado, e o meu tio só se ria lá de cima. O que é que eu havia de fazer? Ria-me também. Vinham buscar a mota para o local de partida e lá ia eu outra vez de cangalhas até bater na árvore que já me conhecia de ginjeira, e quando íamos dois ainda era pior.
O Al Pacino não conhece o meu tio Zé de Basto. Calha bem, porque o meu tio Zé de Basto também não conhece o Al Pacino. Por aí, estão ela por ela. Onde o meu tio fica a ganhar ao americano é no alambique. Exactamente. O meu tio tinha um extraordinário alambique, onde queimava o vinho estragado da vizinhança, e fazia uma aguardente tão medonha que era um sucesso. As autoridades fecharam-lhe o alambique. Acho que mais do que uma vez! E sendo certo que, no seu tempo, Al Pacino também não destilava nada mal, a verdade é que não me consta que tivesse um alambique.
Ao contrário do outro Al Pacino, o meu tio Zé de Basto nunca ganhou um Óscar. Mas merece o Nobel. Foi ele quem inventou uma talhadura de infalibilidade papal para curar bebedeiras, sejam elas de que tamanho forem. O revolucionário método, experimentado e comprovado pelo meu próprio tio, consiste basicamente em arriar as calças e chapinar o traseiro na água fresca de uma levada. A versão urbana, descartado o uso do rio Douro ou do oceano Atlântico, por questões de segurança, passará inevitavelmente pelo bidé, devendo juntar-se gelo à água do cano, para recriar as condições naturais do tratamento original. E é remédio santo!
O meu tio Zé de Basto é um homem geralmente feliz, às vezes austero e honrado sempre. Teve sorte com os filhos que tem. Ele e eu também somos compadres, baptizei-lhe o rapaz mais velho: é "o nosso Nane" como eu. E é como compadres que gostamos de nos abraçar, "Eeehhh!, compaaaaaaaadre!!!...", com umas valentes palmadas no lombo, quando nos reencontramos. E eu gosto muito de abraçar o meu tio Al Pacino.
Ele há um natal de que não me lembro muito bem!... sei apenas que o passei com ele, em basto, e que lhe dei caminho a, pelo menos, um almude de vinho!
ResponderEliminarj.
E foste depois refrescar o cuzinho?...
ResponderEliminarNão! Mas devia...
ResponderEliminarj.
Viva, Hernâni
ResponderEliminarEste teu tio Al Pacino é o que eu conheço?
Abraço
Nestes
Exactamente, Nestes. Se me lembro bem, ainda deste lá uma mãozinha, a carregar uns molhos de gravetos, antes do copo da ordem.
ResponderEliminarBom recordar os momentos de familia, genial! É bom mesmo poderes escrever o que de facto te fez ser o GRANDE HOMEM que és! Esta declaração é sentida e sabes bem disso, pois fui aquele que muitos anos te conseguiu mijar nas costas quando eras o meu heroi na cama que dividiamos. P.S. - explica que sou nao vão pensar que sou alguma companheira estranha que tiveste.!!! Abraço e fico contente de conhecer por aqui um pouco a mais de ti. Miguel Doellinger
ResponderEliminarEstá bem Miguel (o Miguel é meu primo), mas deixa-te de lisonjas! Obrigado pela visita e pelo comentário. E, já agora, pelo quentinho das mijadelas.
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