Foto Hernâni Von Doellinger |
sábado, 30 de novembro de 2024
sexta-feira, 29 de novembro de 2024
Adopte um e leve dois
Número de circo
Pediram-lhe que indicasse alguns dos principais números de circo. Lembrou-se apenas do 69.
P.S. - É. Estamos no Natal, meus meninos!...
quinta-feira, 28 de novembro de 2024
Palhaço, mas palhaço completamente
Que se segue: já há muito que sou grande e, francamente, sou Tarzan e é um pau. Sou Tarzan como a maioria dos portugueses: estamos de tanga e isso é indesmentível, somos portanto tarzões.
Mas palhaço é que era! Alguns amigos, lisonjeiros, dizem-me que eu às vezes até sou um bocado palhaço. Por outro lado - o das costas -, alguns filhos da mãe que não me gramam acusam-me de eu às vezes ser um bocado palhaço. Palavra de honra, às vezes e um bocado não me chega: eu queria ser palhaço, mas palhaço completamente.
Quem com ferros ferros com ferros ferros
Havendo vida em Marte
Havendo vida em Marte suponho que haja mídia. Césio, tédio, prédio, sexo… pouco senso, pesticida.
Havendo vida em Marte suponho que haja brigas.
Havendo vida em Marte suponho que haja morte. Dor, enfarte à la carte… internet, fone, sorte.
Havendo vida em Marte suponho que haja corte. Belas-artes, vôo charter, Robocop fraco forte.
Havendo vida em Marte suponho que haja morte.
Itamar Assumpção, "Cadernos Inéditos"
quarta-feira, 27 de novembro de 2024
O tempo da nabiça e do tomate
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Foto RTP Arquivos |
Dezembro a bater à porta e o Borda D'Água manda resguardar as plantas do gelo. Arrotear terras e mato para as sementeiras da Primavera. No crescente, continuar as covas e a estrumagem. As sementeiras de trigo e centeio continuam se não houver geadas, bem como a de cebola, couves, beterraba, nabiça, pimentos, tomate e salsa. Em sítios abrigados pode-se ainda semear agrião, espinafre, alfaces, fava e ervilha. Plantar ainda macieiras e pereiras. Cortar madeiras, no minguante. Continuar a poda das vinhas e mergulhia das vides. Fim da apanha da azeitona e limpeza dos lagares. No jardim, prossegue a plantação de roseiras, gladíolos, cíclames e lírios, a proteger das geadas. Semear ervilhas-de-cheiro, goivos e jacintos. Quanto aos animais, abrigue o gado do frio e chuva, e acarinhe-o.
Quer-se dizer: em Dezembro descansa mas não durmas, como recomenda, por seu lado, O Seringador.
E pronto. É este tempo, senhores. O tempo. Ou, como dizia o outro na rádio a preto-e-branco: na aldeia do Senhor Costa, assim vai a agricultura. E quem diz Costa, diz Montenegro.
Isto à conclusão do engenheiro Sousa Veloso, que faleceu faz hoje dez anos. José de Sousa Veloso, engenheiro agrónomo e mítico apresentador do programa TV Rural da RTP. Durante três décadas, o Senhor Engenheiro deu as notícias e a táctica aos lavradores e outros telespectadores portugueses. Morreu no dia 27 de Novembro de 2014, com 88 anos. Conheci muito bem o engenheiro Sousa Veloso. Ambos frequentávamos o velho café Peludo. Ele no televisor pendurado logo à entrada, do lado esquerdo, por cima dos bolos-reis previamente encomendados e comprados fora para o Natal, e eu sentado no canto contrário, atento à TV e aos bolos, ouvindo uma e desejando os outros, nem que fosse só um bocadinho. No final, o Senhor Engenheiro dizia, num largo sorriso, já em cima da música: "Despeço-me com amizade, até ao próximo programa". Era para mim.
O circo sem lentejoulas
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Foto Santiago Andreu |
Havia uns circos muito jeitosos, pequeninos, descapotáveis, que andavam de terra em terra. Eram circos de rua, de esquina, próprios para terras de remediada dimensão. Nada de tendas, rulotes, camiões, jaulas, luzes, altifalantes, cartazes, grandes trupes, nomes extraordinários, antes pelo contrário. Eram circos de bolso, anónimos, amiúde unifamiliares - uma velha carripana, o homem, a mulher, duas ou três crianças, todos artistas, e o cão, magro como um faquir, mas não praticava. A fome devia ser muita. E o guarda-roupa deixava demasiado a desejar. A carripana era transporte, armazém, camarim e casa.
Eram circos sazonais e breves. Precisavam apenas de um cantinho, vinham num pé e iam noutro. Chegavam numa tarde de Verão, estendiam uma lona no chão, chamavam o povo ali à volta e iniciavam a função. Sempre a toque de caixa. Umas palhaçadas, umas cabriolas, sucintos números de malabarismo, equilibrismo e contorcionismo, às vezes até uma amostra de funambulismo ainda que curta e a baixa altitude, mas sim, porque circo que é circo obviamente trabalha no arame. Meia hora, se tanto, e estava feito. No final da apresentação e dos merecidos aplausos, uma das crianças, geralmente menina, passava pela roda do excelentíssimo público com um chapéu ou um prato na mão, recolhendo o dinheiro que cada um resolvesse dar de paga, e havia quem atirasse moedas de agradecimento para a lona coçada e rota. Assim, uma ou duas matinés, três no máximo, se a plateia o justificasse ou o dinheiro em caixa ainda não chegasse para a sopa, depois as crianças desvestiam-se do circo, os pais arrumavam os tarecos, a lona era recolhida, e toca a entrar na carripana, partiam todos, ainda de dia, decerto por causa da imensidão da viagem e aparentemente em direcção a Guimarães, que, no meu ponto de vista, naquele tempo, era em direcção ao mundo. E eu ficava como a noite.
Estes circos de porta a porta, estes extraordinários espectáculos, ando capaz de dizer que seriam os sucessores ou, pelo menos, uma derivação directa dos "Saltimbancos" que itineravam o Portugal mais profundo durante as décadas de cinquenta e sessenta do século passado, apresentando o famoso show da cabra ou "cabrinha", outro assombro dos antigos. Uma cabra, ou cabrito, vá lá, que fazia equilibrismos em cima, por exemplo, do gargalo de uma garrafa de cerveja, ela própria, a garrafa, colocada, por sua vez, em cima de um banco de madeira, dos de cozinha. Uma coisa realmente de pasmar!
A cabra, ou cabrito, vá lá, às vezes era um cão ou um gato, mais raro um macaquito marca sagui ou, também acontecia, um burro. Mas eu não me lembro de ver, nem essa parte me interessava por aí além. Não tinha, naquela idade, qualquer posição estruturada sobre a problemática da exploração de animais domésticos em sede de circo de pé-rapado, mas sabia, sempre soube, que de burros já estava Fafe bem servido. Basta pensar na burra do Reigrilo, e não é preciso ir mais longe...
terça-feira, 26 de novembro de 2024
Adeste infideles
Massa ao quartilho
segunda-feira, 25 de novembro de 2024
Anticomunismo ao serão
Foto Hernâni Von Doellinger |
Portugal ardia no ano de 1975. Em Fafe, o ambiente político e social também se extremava, de uma forma particularmente artificial e burgessa, manobrada à distância, os artífices sem darem a cara e os burgessos na linha da frente, e com consequências tão trágicas, tão localmente desestruturantes, deixando feridas tão a céu aberto, que a nossa terra nunca mais foi a mesma - mas isso, a história dessa irreparável tristeza, fica para outro dia.
O País a ferro e fogo, e Fafe também. Havia ameaças, tiros, atentados, punham-se bombas, assaltavam-se e incendiavam-se sedes partidárias. Sobretudo a Norte. Sobretudo do PCP. Com a bênção do cónego Melo. Dava na televisão, saía nos jornais, que tomavam posições. No Comércio do Porto, dois jornalistas experientes e com agenda, Ercílio de Azevedo e Fernando Barradas, assinavam uma coluna que viria a dar brado, "Os Cravos na Ferradura", um espaço militante com o seu quê de reaccionário, como então se dizia à esquerda. Essas crónicas, geralmente bem esgalhadas, escritas às vezes com graça, foram o consolo e o farol doutrinário de muito boa e santa gente durante o PREC (Período Revolucionário em Curso) e o Verão Quente, do 11 de Março ao 25 de Novembro, e com tal sucesso entre os leitores mais conservadores ou fascistas recentemente desmamados que as tiragens do Comércio terão subido aos cem mil exemplares, contando-se até que houve jornais, em certos dias, a serem vendidos na candonga a 100 escudos cada um.
O êxito foi tal que alguns daqueles artigos transformaram-se rapidamente em livro, com prefácio de Paradela de Abreu. A obra, com o mesmo título da rubrica original, "Os Cravos na Ferradura", ainda hoje pode ser encontrada por aí, na internet, em diversos sítios de alfarrabistas e simpatizantes, mais ou menos recomendados.
O Comércio do Porto era objecto de culto. No país beato e de direita revanchista, guerrilheira, e em Fafe também. Um dia, 11 de Outubro de 1975, estava eu no tasco do Nacor com o meu tio Américo, eu e os meus 18 anos, na cozinha da Dona Isabel, que era um brinco e um mundo, e o Landinho Bacalhau, o antigo, anunciou que um grupo de ilustres fafenses iria homenagear naquela noite os jornalistas do Comércio. Seria com uma ceia, altas horas, no restaurante do Café Académico, e os homenageados fariam o favor de comparecer.
Eu quis logo saber se admitiam penetras, como quem diz, a minha pessoa. Eu queria conhecer jornalistas a sério, precisava de ver como é que eles eram. Se eram praticamente como nós, as pessoas normais. O Landinho explicou-me que "a condição sine qua non" para participar na coisa era ser leitor do Comércio do Porto, e isso eu era, porque o Comércio do Porto era o meu jornal, isto é, o jornal do café, do Peludo, mas que tinha de perguntar ao organizador do evento, que era o Senhor Francisco Oliveira, que disse que sim, eu podia ir. Por outro lado, aquela foi a primeira vez na minha vida em que ouvi a expressão cagona sine qua non e gostei bastante, embora esta seja também a primeira vez em que a uso motu proprio, e logo duas vezes.
Portanto lá fui. O grupo de ilustres fafenses era composto, se não me engano, pelo vimaranense Fernando Roriz, que foi deputado, presidente do Vitória e vice-presidente da Federação Portuguesa de Futebol, entre outras encomendas, pelo Dr. Marques Mendes, Dr. Antunes Guimarães, Chiquinho Gonçalves, Manel da Pinta, o Landinho, o Francisco Oliveira, eu a um canto a tirar apontamentos de cabeça, decerto mais alguém ou alguéns de que não me lembro e, não sei porquê, gosto de pensar que o Dalmo Pinto também por lá passou ou esteve, antes, durante ou depois.
Um curioso painel, aparentemente heterogéneo, unido talvez, pelo menos naquela altura, por um certo anticomunismo, mais semântico do que primário, num ou noutro caso, se é possível dizê-lo, gente de alguma forma ligada ao PSD e ao PS locais, e eu, que não era de um nem de outro, antes pelo contrário, lá estava destoando como sempre e ainda hoje me sinto muito bem com isso.
Da parte do Comércio do Porto, o Fernando Barradas primou pela ausência, mas apresentou-se o Ercílio de Azevedo, acompanhado por dois futuros directores do jornal, o Silva Tavares e o Manuel Teixeira, que era então um rapazinho e que viria a ser também administrador da Lusomundo e chefe de gabinete de Rui Rio na Câmara do Porto, sendo mesmo considerado, ainda hoje, o principal conselheiro do ex-líder do PSD. Não eram os únicos, que nisto, quando é para comer e beber, os jornalistas aparecem sempre, mas varreram-se-me os outros.
A ceia foi a madrugada inteira e os pormenores mais delicados ficam, para já, comigo. Mal eu sabia como é que viria a ser a minha vida alguns anos mais tarde. Comeu-se e bebeu-se bem, isso posso desde já dizer. Falou-se muito. Eu não. Anticomunistou-se com assinalável pertinácia, atrevo-me a supor. O Dr. Guimarães meteu os jornalistas na ordem quando um deles, entusiasmado, se pôs em bicos de pés. Percebemos porque é que Ercílio de Azevedo, autor das famosas "Tripas à moda do Porto", escrevia melhor, segundo nos contaram, quando decilitrava. No centro da mesa havia um bolo que o Senhor Francisco Oliveira mandara fazer na Pastelaria Monumental. O bolo exibia uma ostensiva pena alegórica e decerto alguns dizeres alusivos aos plumitivos convidados. Não sei quem é que pagou a conta, bolo incluído, que deve ter tido uma saída do caraças, não faço sequer ideia se havia preço de inscrição ou multa de presença. Se havia, eu fiquei isento.
Agora. O Senhor Francisco Oliveira (1928-2021) era um querido amigo. Não naquela altura, mas nos últimos anos. Ligava-me de vez em quando, avisava-me que vinha ao Porto, a tratamento, mas só nos pudemos encontrar uma vez. Passámos um pedaço de tarde à conversa na Rua Sampaio Bruno, na esplanada de um cafezinho, falou-me do livro que queria escrever, tirei-lhe o retrato que pus lá em cima, visitámos a Feira do Livro, que por acaso naquele ano era ali ao lado, na Avenida dos Aliados. Ele comprou e eu não. Também ia sabendo dele pelo Bertinho Dantas.
O Senhor Oliveira, Francisco Oliveira Alves, era um homem bom, generoso, às vezes de uma desarmante pureza, e esforçava-se por fazer parte da História. Fez. Houve quem o usasse, e ele queixava-se. É um fafense excelentíssimo, certamente um dos melhores da sua geração. Para além disso, era pai do Chico, meu colega de escola e amigo de infância, mas isso já seriam outros quinhentos.
Só hoje, entre parágrafos deste texto, é que apaguei do meu telemóvel o número do Senhor Francisco Oliveira. Era assim que lá estava: Senhor Francisco Oliveira. Apaguei e, caramba, agora parece-me que perdi alguma coisa e não sei o que hei-de fazer ao velho cartão-de-visita corrigido à mão que ele um dia também me deu...
domingo, 24 de novembro de 2024
Os do 28 de Maio
Canção do Salgueiro (Maia)
Esta recebi-a do Jaime Froufe Andrade. Foi em Abril, no tempo dela, mas vale a pena lembrá-la hoje. E amanhã. E sempre! No blogue Campainha Eléctrica, li que "o tema "Canção do Salgueiro" tem música e letra de Carlos Tê, que também assegura a produção ao lado de Mário Barreiros e Pedro Vidal. Barreiros é responsável pela mistura e masterização, pela bateria, guitarra eléctrica e teclados, cabendo a Pedro Vidal, director musical de Jorge Palma e parceiro dos Blind Zero e Wraygunn, outra guitarra acústica e eléctrica e também o banjo. Na canção participam ainda Rui David na voz, Patrícia Lestre na voz e violino, Paulo Gravato, saxofonista de Pedro Abrunhosa ou dos Azeitonas, e Rui Pedro Silva no trompete. A voz principal é de Carlos Monteiro." A canção pode ser ouvida aqui. E a letra do Tê diz assim:
Canto agora ao salgueiro
Que um dia abriu os olhos
E viu reinar o vampiro
Sobre a lezíria cansada
De tanto choro e suspiro
E gente tão aviltada
Saiu em fúria da margem
E foi bradar ao terreiro
No seu cavalo de ferro
Pediu contas ao vampiro
E ali lhe fez o enterro
Sem disparar um só tiro
Ai ó meu velho salgueiro
Dá-me a tua sombra amiga
Se há bom tronco lusitano
És da cepa mais antiga
Ai ó meu velho salgueiro
Estás aí tão mudo e quedo
És filho dum ferroviário
Que fez um manguito ao medo
E depois voltou à margem
E ficou a salgueirar
Junto ao Tejo em Santarém
Onde as Tágides vão dançar
Quando a lua harpeja as águas
Certas noites de luar
No poleiro da capital
Cantiga logo esquecida
Mas tu estás de pedra e cal
Mesmo em terra batida
Alto é teu pedestal
Ai ó meu velho salgueiro
Dá-me a tua sombra amiga
Se há bom tronco lusitano
És da cepa mais antiga
Ai ó meu velho salgueiro
Estás aí tão mudo e quedo
És filho dum ferroviário
Que fez um manguito ao medo
O grande naufrágio
sábado, 23 de novembro de 2024
Isto está perigoso
Adopte uma árvore!
Jornalista, disse ele
- Profissão?
- Jornalista.
- Imprensa, televisão, rádio, agência noticiosa ou multimédia?
- Câmara municipal.
sexta-feira, 22 de novembro de 2024
Bolinha baixa
Abaixo de Braga
Não se faz
Pela sombra
Cu de Judas
Banho ao cão
Cavalinho da chuva
Com os ursos
quinta-feira, 21 de novembro de 2024
Pedimos desculpa por esta interrupção
Os animais da minha infância
Televisão de faca e alguidar
Grande momento de televisão
Redacção (exactamente: cção)
Nas redacções onde eu trabalhei as cadeiras eram todas mancas e andávamos à pancada por uma que se segurasse mais ou menos. O sobrevivente marcava a sua cadeira para toda a vida, mas quando virava costas já ela estava debaixo do cu de outro. E andávamos outra vez à pancada. Foi por isso que, quando chegou a altura de nos mandarem para o olho da rua, e mandaram, e continuam a mandar, estávamos sem forças para irmos às ventas dos bandalhos que fazem ofício de destruir redacções e que têm cadeiras da televisão. Feitas de cortiça.
A televisão é muito boa porque dá na televisão. Eu gosto muito da televisão.
P.S. - Hoje é Dia Mundial da Televisão.
quarta-feira, 20 de novembro de 2024
Tocavam sempre duas vezes
Mulher amiga...
terça-feira, 19 de novembro de 2024
A actriz
O Super-Homem
O problema do homem invisível
O problema do homem invisível era a sombra, a sua própria sombra. Dava muito nas vistas.
P.S. - Hoje é Dia Internacional do Homem.
Levado ao engano
Era uma vez o homem-sanduíche
Terminado o serviço, o homem-sanduíche chegou a casa e comeu-se.
P.S. - Hoje é Dia Internacional do Homem.
O homem-rã
O homem-bala
O homem-crocodilo
P.S. - Hoje é Dia Internacional do Homem.
O Homem-Prazol
O homem-tocha
O homem-máquina
O homem de ferro
O problema do homem de ferro era o sexo. Não ia lá sem lubrificação.
P.S. - Hoje é Dia Internacional do Homem.
O homem-aranha
O Homem de Gelo
A deslocalização do homem-estátua
P.S. - Hoje é Dia Internacional do Homem.
segunda-feira, 18 de novembro de 2024
O fim do papel
Para cus quadrados
Os médicos, as farmácias e o sistema
- O mais barato, se faz favor. Pode ser de saldo, se tiver, ou mesmo em segunda mão, se for em conta - respondi.
Veio o antibiótico. Genérico.
- São seis euros e setenta e nove - informou-me a senhora doutora farmacêutica.
- Seis euros e setenta e nove?! - espantei-me. - Mas o senhor doutor médico escreveu aqui na receita que, e passo a citar, "esta prescrição custa-lhe, no máximo, 77 cêntimos, a não ser que opte por um medicamento mais caro", e eu manifestamente não optei...
- Pois, mas não ligue a isso. É o que eles têm lá no sistema. O preço muda ao fim de três meses - disse-me a senhora doutora farmacêutica.
- Mas a receita é de hoje, fresquíssima - atalhei.
- Pois, mas é o sistema - reiterou a senhora doutora farmacêutica.
- E o sistema não é o mesmo para as farmácias? Entre 77 cêntimos e seis euros e setenta e nove vai uma diferença de quase dez vezes mais, como é que isto é possível? - inquiri e tornei a inquirir.
- Faça o favor de ver aqui no computador. Na verdade há mais barato, este de três euros e quinze, mas que hoje, por acaso, até já custa cinco euros e trinta e sete, e não temos - explicou-me a senhora doutora farmacêutica.
- Mas a custar 77 cêntimos é que nada - insisti.
- Nem de perto nem de longe, é o sistema - insistiu, por seu lado, a senhora doutora farmacêutica.
- E os senhores doutores médicos sabem? - eu.
- Sabem, sabem - a senhora doutora farmacêutica.
- Desculpe voltar ao mesmo: mas então porque é que os senhores doutores médicos escrevem estes preços nas receitas se sabem que estão a enganar os doentes?
- É para pressionar as farmácias - segredou-me a senhora doutora farmacêutica, chegando-se-me ao ouvido.
- E tem resultado, não tem? - devolvi-lhe eu, no mesmo tom confidencial...
O ocultismo
O feitiço contra o feiticeiro
domingo, 17 de novembro de 2024
A mulher, o bronco e as piriscas
Foto Hernâni Von Doellinger |
Era assim. Mas há uns meses que o vejo sozinho pelas esquinas, desamparado, perdido, praguejante. A franzina senhora desapareceu de cena. De tão sumária e submissa que me parecia, temo, sinceramente temo, que lhe tenha acontecido o pior: que tenha resolvido morrer devagarinho só para não incomodar. O bronco continua por aí, agora solitário e sempre bandalho, sem escrava nem saco de pancada pelo braço, enfim obrigado a vergar a mola se quer matar o vício. O Governo criminalizou as piriscas, a ciência inventou os cigarros electrónicos e a covid desbastou cafés e restaurantes, no chão da porta dos quais ele costumava abastecer-se e rir-se das imbecilidades do Governo e da ciência. Risinhos à parte, que o gajo é tolo, a vida corre-lhe de mal a pior. E é o que eu lhe estimo.
O filhodaputa continua, portanto, às piriscas, no outro dia sem mais nem menos malcriou com a minha mulher, que não lhe liga mas tem medo dele, mais cedo ou mais tarde vou ter de lhe foder o focinho, ao porco, e já não estou em idade para semelhantes flostrias. O indivíduo continua às piriscas, que fuma acto contínuo, mas, actualizado com os tempos da pandemia, que ainda estão quentinhos, anda de máscara. A máscara padece de evidentes sinais de que foi sacada ao lixo. Mas de máscara, o burgesso. É outra limpeza, outra segurança.
P.S. - Publicado originalmente, em versão curta, no dia 23 de Agosto de 2018. Hoje é Dia Mundial do Não Fumador.
Por obra e graça do espírito santo
sábado, 16 de novembro de 2024
Estamos no fim do ano, meus meninos!
O nosso galo do presépio é um galo de Barcelos, mas, atenção, não é o Galo de Barcelos. Nada de parolices, valha-nos Deus! É um galo de capoeira, obra de mestre barcelense, isso sim, 6x4 centímetros, a obra, um euro e meio, o preço. É arte.
Só presépios temos oito, para além de mais meia dúzia de Meninos Jesus avulsos, e nem a varanda e o escritório escapam ao nosso Natal. Pusemos o galo novo no presépio principal, evidentemente. O nosso é um presépio inclusivo, ao contrário do presépio do falecido papa Bento XVI, que em 2012 resolveu expulsar a vaca e o burro, porque, sentenciou, no local do nascimento de Jesus "não havia animais". Portanto, concluí eu, também não havia ovelhinhas, o que quer dizer que também não houve pastorinhos do deserto. Sobravam, inequivocamente, os três reis magos. Gente fina, vinho de outra pipa. Reis. E magos (porque o champanhe ainda não tinha sido inventado). Esses, é certo, estiverem lá, em representação de toda a humanidade - segundo Ratzinger. Estiveram os reis magos e os anjos cantadores. Os anjos também estiveram.
Os dias da intolerância
Vivemos no tempo das intolerâncias. Intolerância ao glúten, intolerância à lactose, intolerância aos sulfitos, intolerância à frutose, intolerância a hidratos de carbono. Intolerâncias tão pipis e tão woke. E depois vêm-nos dizer, estes, que hoje é Dia Internacional da Tolerância...
P.S. - Hoje é Dia Internacional da Tolerância.
Antes pelo contrário
O intolerante
A bola, como uma mulher
Foto Hernâni Von Doellinger |
Messi conhece como ninguém, a cada momento, o ponto G da jogada que ainda nem lhe chegou aos pés. Ele adivinha o sítio onde a bola o vai procurar. Recebe-a com um beijo, oferece-lhe flores, acaricia-a, leva-a a passear, e ela gosta, retribui os carinhos, abraça-se-lhe à chuteira num abraço só desfeito no exacto momento do remate. Digo mal. Mas qual remate? Messi não chuta, passa a bola à baliza e é golo. O pequeno Messi é um cavalheiro, um amante delicado e atencioso: trata a bola como ela merece. A bola, como uma mulher...
sexta-feira, 15 de novembro de 2024
É preciso ter lata
P.S. - Hoje é Dia Nacional das Conservas de Peixe.
Os que deixaram de fumar
P.S. - Foi neste dia, mas no ano de 1492, que o navegador Cristóvão Colombo anotou no seu diário de bordo o uso do tabaco entre os índios. A esse respeito, acrescente-se que depois de amanhã é Dia Mundial do Não Fumador.
O Senhor Órfo
Em Fafe, Órfão era nome próprio e dizia-se Órfo. O Órfo trabalhava no Talho, isto é, o Órfo era o Órfo do Talho, do Talho do Órfo, que realmente não se chamava desta maneira mas Talho Novo, decerto para se distinguir do outro talho da terra, localizado no início da Avenida, quem ia para a Estação, o talho do Tininho, ou dos do Souto, como então se dizia. Os do Souto eram os Barros, essa família antiga de futebolistas extraordinários - Nelo, Armando, Nelito, Zeca e Fernando, irmãos, nomes grandes que digo de cor, apenas de ler e ouvir dizer, porque já cheguei tarde para os ver jogar. E o Souto ficava à face da estrada que desce para a Fábrica de Ferro, quem deriva para o Lombo. Era ali a casa-mãe do clã, no Souto, e eles eram os do Souto. O nosso Talho, isto é, o Talho Novo, era, como o deles, no centro da vila e do mundo, no Largo, mas mais puxado ao lado do Mário da Louça e do Café Império, ali no enfiamento do Fernando da Sede, do Foto Jóia, do Romeu e outros que tais, tudo gente porreira, excelentíssima, o Órfo incluído. Para a mim, que era mocico e tinha medo à mão lampeira da minha mãe, o Órfo só podia ser Senhor Órfo, por respeito obrigatório, mas a expressão assim composta parecia-me um bocado parva só de a pensar da cabeça para dentro, e portanto eu nunca a disse da boca para fora. Quer-se dizer. A vida em Fafe era muito simples naquele tempo, mas às vezes fazia-me confusão...
Ora bem. Para quem não sabe, hoje é uma efeméride. Aliás, hoje é várias efemérides, pelo menos cinco, mas centremo-nos na efeméride que nos interessa e que, modéstia à parte, nos diz respeito. Isto é: hoje é Dia Mundial do Órfão. Do Órfo, sim senhor! É realmente uma grande honra para Fafe. E é merecida...
quinta-feira, 14 de novembro de 2024
Operário di qualità, di qualità
Hoje é Dia Mundial da Qualidade, e eu acho justo. É preciso que se note que o meu primeiro emprego com descontos para a Caixa foi exactamente como "controlador de qualidade", que era o nome que deram ao meu trabalho de "fiel de armazém", que era o nome que não deram ao meu trabalho de faz-tudo, isto é, moço de recados, na Estamparia Marigam, em Fafe. Sei portanto do que falo e não sei se estão a ver que, sendo eu o operário que fui, estou plenamente capacitado para ser secretário-geral do PCP, tal e qual como o bom do Paulo Raimundo, que uma vez também foi operário. E no entanto desconheço a que qualidade de qualidade diz respeito o Dia Mundial da Qualidade. Isto é: estamos a falar de boa qualidade ou de má qualidade? De qualidade de vida ou de qualidade de morte? Afirmar-se apenas "da Qualidade" é muito pouco, é abstracto, é obscuro. Em última análise, até podemos estar a celebrar uma qualidade sem qualidade nenhuma. Pelo menos é o que eu acho.
P.S. - Hoje é Dia Mundial da Qualidade.
Os capados
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Foto Agência Ecclesia |
Houve uma maré em que a minha mãe lavava para fora. Na poça do Santo e no rio da Ponte do Ranha, à beira do Matadouro, carregava e lavava montanhas de roupa alheia. Eu às vezes ia com ela. Aquilo era um trabalho muito duro. Tão duro que eu, preguiçoso por idade e por feitio, fazia tudo para "ajudar". Mas não me deixavam. Nem a minha mãe nem as outras lavadeiras, sobretudo estas. Diziam-me, entre cantigas e caralhadas, que os meninos do sexo masculino não podiam lavar roupa. Se os meninos do sexo masculino lavassem roupa - dizia o mulherio -, quando fossem homens não lhes crescia a barba, ó terrível maldição!
Deus nos livre dos afrontamentos
quarta-feira, 13 de novembro de 2024
A morte da bezerra
Foto Hernâni Von Doellinger |
Antigamente as tragédias aconteciam com mais assiduidade, ao contrário do que se apregoa agora por aí, e nem é preciso recuarmos ao terramoto de 1755 ou ao lamentável dia, no ano de 1128, em que o jovem Afonso Henriques bateu na mãe, Dona Tarexa. Não. Basta centrarmo-nos na segunda metade do século passado, anos sessenta, setenta e pelo menos oitenta. Morria uma vaca e era uma tragédia. Ora as vacas, naquele tempo, morriam bastante, e nem estou a falar de matadouro e de talhos, de abates e de choupas. Morriam sem querer, as vacas, isto é, por exemplo esturricadinhas num palheiro que se incendiou sem mais nem menos, afogadinhas ou irremediavelmente escangalhadas no fundo de um poço sem guarda ou, até arrepia, abertas ao meio por um raio. E era uma tragédia.
Era uma tragédia porque a vaca, o boi ou o bezerro eram a riqueza única do pobre lavrador de microfúndio e Portugal era sobretudo isso. As vacas, permito-me generalizar assim, davam leite, faziam estrume, lavravam e aravam o campo, puxavam a água, transportavam as colheitas, ajudavam nas obras domésticas, acartavam pedra, erguiam muros, tinham a força de trabalho de um rancho de homens e mulheres, procriavam e, como se ainda fosse pouco, emprestavam o seu próprio calor ao jugo que as dominava, para, a seguir, talhar trasorelhos, eventualmente acabando vendidas na feira ou feitas em bifes, em todo o caso transformadas em indispensáveis notas de conto, e aí tudo começava outra vez.
Era desta maneira em Fafe, terra de pequenos e remediados agricultores, nas aldeias à volta, principalmente, mas também no centro da vila mesmo, como outro dia aqui contei. A única diferença era que em Fafe a vaca era baca e o boi, em raros momentos de preciosismo linguístico, era voi. Tirante essa irrefutável idiossincrasia, Fafe era como o resto do Norte rural: em cada casa, uma, duas vacas, quer-se dizer, uma junta, quando muito, para fazer parelha no carro, turinas às vezes, leiteiras em alguns casos. As vacas eram a fartura, o dinheiro em caixa, a garantia de vida dos nossos persistentes lavradores. As vacas eram-lhes tudo.
Agora imagine-se que lhes morria um animal, tantas vezes o único, num desastre daqueles ou por doença fulminante e desconhecida. O gado não estava no seguro, é claro, o dinheiro da CEE ainda não tinha sido inventado e era o que faltava que alguém se lembrasse de pedir uma indemnização ao Governo. Dá para imaginar, então, o rombo? Era um prejuízo que só visto, a ruína de repente, a miséria, a fome à espreita, a vida parada, como se fosse ali o fim do mundo.
Mas não era. Podia muito bem não ser. A salvação do nosso desgraçado lavrador estava agora no peditório. Isso, no peditório, que era uma instituição. O peditório que ele fazia de aldeia em aldeia, nas ruas da vila antiga, de porta em porta, apresentando o seu triste caso, a sua tragédia, suscitando simpatias, solicitando ajuda, o que pudesse ser. Não era estender a mão à caridade, não, aquilo era um mecanismo de solidariedade, automaticamente accionado. Fazia parte, em Fafe.
Notáveis lá da terra, cidadãos de honra reconhecida, dois ou três, incluindo geralmente o presidente da junta ou o regedor da freguesia, acompanhavam o lavrador nesta sua via-sacra, atestando com documentos e tudo a veracidade do infausto acontecimento e as dramáticas condições em que ficaram o azarado homem e respectiva família.
E as pessoas davam. O que podiam. E é curioso porque as pessoas de dentro de casa eram, regra geral, ainda mais pobres do que o homem desesperado que lhes batia à porta a pedir. Davam, e não se fala mais nisso. Os modestos donativos ficavam assentes numa folha azul de 25 linhas, registados, consultáveis, até chegarem, conta certa, para comprar uma nova cabeça de gado, nem mais um tostão, mas nunca mais ninguém queria saber do assunto.
Terão acontecido umas quantas burlas, trampolinices das antigas, isso certamente, vacas que afinal eram virtuosas senhoras, lavradores que nunca puseram os pés na terra e presidentes da junta da colaça. Mas também terão sido assim criadas verdadeiras segundas oportunidades de vida para pessoas honestas, trabalhadoras, merecedoras, de repente atingidas pela tragédia a sério, e que sem a ajuda dos outros, sobretudo dos seus generosos camaradas de pobreza, nunca mais se levantariam. E Fafe era também isto.
A landre e o carvalho
Foto Hernâni Von Doellinger |
A landre, é preciso que se note, já serviu para a nossa alimentação. O povo - isto é, o pobo - chamava-lhe também bolota ou glande. E há quem agarre na glande e dela faça carvalho.
Os cartoleiros
Amai-vos uns aos outros (mas devagar!)
terça-feira, 12 de novembro de 2024
As cadelas
Foto Hernâni Von Doellinger |
As palavras têm vida, acusam a idade. Há palavras que enrijecem com o tempo e há outras que se amaciam. Cadela, por exemplo. A palavra cadela, antigamente, tinha uma pesada carga pejorativa, era um nome do piorio para se chamar a uma mulher, era um insulto violentíssimo, degradante. Cadela! Queria dizer prostituta, vadia, safada, desavergonhada, traiçoeira, vagabunda, tola, toleirona, má, malvada, crua. Mas hoje em dia, não. Hoje, as meninas e senhoras passeiam os seus cãezinhos e dizem-lhes que são a "mãe", a "mamã", a "mamãe". E dizem-no a toda a gente. Quer-se dizer: as meninas e senhoras reclamam a maternidade canina, apresentam-se como legítimas progenitoras dos seus cães-filhos, apregoam aos quatro ventos esse incontroverso estatuto. E está certo. Neste novo contexto, chamar-lhes cadelas, às meninas e senhoras mães dos cães, só pode ser, agora, um elogio, um simpático reconhecimento.
Entrou para o seminário aos 11 anos...
Rui Valério entrou para o seminário aos 11 anos, conta a CNN Portugal, e hoje o Papa escolheu-o para ser o novo patriarca de Lisboa. Eu também entrei para o seminário aos 11 anos, mas, lá está, mais uma vez não fui o escolhido. Em todo o caso, não me dava jeito. Tenho a produção toda tomada até ao final do ano e, a verdade também é só uma, convinha-se um lugar cá mais para cima, para o Minho, se possível, no Alto Minho então é que era, uma casinha com um terreno, pequeno que fosse, o rio e o mar à beira...
(Publicado originalmente no dia 10 Agosto de 2023. O Seminário de Nossa Senhora da Conceição, em Braga, faz 100 anos depois de amanhã, quinta-feira, dia 14. Sigo com a série de republicações vitaminadas, assinalando a efeméride pela parte que me toca.)segunda-feira, 11 de novembro de 2024
A invasão
Foto Hernâni Von Doellinger |
Cavalheiro de posição
- E qual é exactamente a posição de vosselência?...
- Defesa central. Mas também faço o lado direito...
P.S. - Hoje é Dia dos Solteiros. E Dia Mundial do Órfão e Dia de São Martinho e Dia Mundial do Origami e Dia do Armistício. Um dia realmente em cheio...
O meu amigo Jeremias
(Publicado originalmente no dia 19 de Fevereiro de 2020. O Seminário de Nossa Senhora da Conceição, em Braga, faz 100 anos na próxima quinta-feira, dia 14. Sigo com a série de republicações vitaminadas, assinalando a efeméride pela parte que me toca.)
domingo, 10 de novembro de 2024
As castanhas são como o próprio nome indica
Foto Hernâni Von Doellinger |
As castanhas. As castanhas têm pouco que se lhes diga. Chamam-se castanhas por causa da própria cor, acho eu, e este ano não sei a que preço é que estão à saída do assador. (Eu e os assadores agora saímos à rua em horários descombinados - e é a vida.) As castanhas fazem-me gases e há cinco qualidades de castanhas: castanhas cruas, que sabem a infância e a dor de barriga, castanhas cozidas, que precisam de saber a funcho, castanhas piladas, que são uma pouca-vergonha, castanhas assadas, que são quentes e boas, e castanhas com bicho, que são uma merda. No Verão, as castanhas são tremoços.
As castanhas vêm dos ouriços, que antigamente tinham a mania de cair em cima das cabeças das pessoas. Os ouriços de Fafe eram os piores. Havia um castanheiro nas traseiras do tasco do Senhor Augusto Paredes, encostado ao muro, mesmo em frente ao Palacete, e os ouriços caíam na rua como tordos. Mas esperavam por mim, matreiros e organizados, para me desabarem aos pares ou num indecente mènage à trois mesmo em cheio no cocuruto. E eu, desprevenido, sem capacete. Era um cristo.
Para além dos filhos da puta dos ouriços e das castanhas que servem para a nossa alimentação, os castanheiros davam também uma tirinhas muito jeitosas para se fazerem grinaldas e óculos de brincar. Os castanheiros podem ter mais de mil anos, mas o do quintal do Paredes não. O quintal do Paredes era também o quintal do Senhor Jerónimo Barbeiro e do Senhor Lopes Agulheiro, três famílias grandes e boas, e eu tenho saudades daquela gente toda. O castanheiro do Paredes agora é um prédio de rés-do-chão e quatro andares. Mesmo em frente, centenário e ainda elegante e digno, agora é o Palacete que cai. Cai aos bocados, desgostoso com o abandono e a ignorância adjacente.
Derivado às castanhas existem também as castanhadas e as castanholas. As castanhadas quem as sabia explicar muito bem era o Luisão que passou a pasta ao Rúben Dias que passou a pasta ao Otamendi, não desfazendo do Palhinha, ali ao lado, que também era um competência. E as castanholas fazem um papelão nas mãos de Lucero Tena.
Eu gosto muito de castanhas. E afinal as castanhas têm bastante que se lhes diga.
P.S. - Publicado originalmente no dia 21 de Novembro de 2012. Hoje é Dia Mundial da Bolota e amanhã é que é Dia de São Martinho. Recomenda-se, no entanto, que, mesmo hoje, os magustos sejam feitos com castanhas. Castanhas e não bolotas!