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quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

A vida sem internet

Os jovens criativos da Rádio Renascença, e devem ser mesmo muito pequeninos, perguntam, num anúncio de promoção a um programa: - Já imaginou a vida sem internet? E quer-se dizer: eu já, isto é, sou desse tempo, lembro-me muito bem, e por acaso até nem se estava mal...

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Rádio.

Aproveite para namorar...

Antena 1, a nossa rádio pública, pouco depois das 21h15 de um Dia de São Valentim, Dia dos Namorados, que por acaso é outra vez amanhã. O locutor, voz excelentíssima, põe ao lume os chouriços do costume, prepara a entrada de Sérgio Godinho mas escorrega na burilada bucha de ligação. "Se vai na estrada, conduza com cuidado. Olhe, aproveite para namorar!..." - diz ele. E realmente. Se conduzir, namore! Há lá melhor maneira de morrer num acidente de viação...

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Rádio.

A fama tem um preço

Na rádio, Renascença por acaso, o reclame a uma telenovela da SIC avisa: - A fama tem um preço! Pois tem. E o arroz carolino também. E a massa-cotovelo e as batatas e os alhos e o azeite, que está pela hora de morte. As próprias pessoas, diz-se, também têm um preço. Algumas, melhor colocadas na vida, têm dois ou três...

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Rádio.

Continue connosco...

Foto Hernâni Von Doellinger

domingo, 9 de fevereiro de 2025

Ray Charles morreu?

É a minha vida. Divido-me aqui entre o computador e o fogão. Ainda há pouco, bateu-me a lembrança e larguei de repente o teclado para ir a correr lá ao outro lado da casa ver o ponto de um caldo de nabos que por acaso tinha em andamento. O rádio da cozinha estava a dar, sem mais nem menos, a esta hora, Ray Charles. Era, como sempre, a rádio nacional, oficial, a Antena 1, Ray Charles cantava "Hit the road Jack" e eu pensei "ó carago, morreu o Ray Charles, coitadinho..."
Mas não morreu, foi impressão minha. Embora me pareça que Ray Charles (1930-2004) precise de morrer todos os dias para dar na rádio. Mesmo na rádio nacional, oficial, a da necrologia e das efemérides.

(Outro dia foi tal e qual. Cheguei à cozinha e o rádio, na velha Antena 1, para o que lhe havia de dar, falava de Maria Teresa Horta nas notícias da hora de almoço. Coisa estranhíssima. E eu pensei "já fostes"...
Felizmente, também não se confirma.)

quarta-feira, 27 de novembro de 2024

O tempo da nabiça e do tomate

Foto RTP Arquivos

Dezembro a bater à porta e o Borda D'Água manda resguardar as plantas do gelo. Arrotear terras e mato para as sementeiras da Primavera. No crescente, continuar as covas e a estrumagem. As sementeiras de trigo e centeio continuam se não houver geadas, bem como a de cebola, couves, beterraba, nabiça, pimentos, tomate e salsa. Em sítios abrigados pode-se ainda semear agrião, espinafre, alfaces, fava e ervilha. Plantar ainda macieiras e pereiras. Cortar madeiras, no minguante. Continuar a poda das vinhas e mergulhia das vides. Fim da apanha da azeitona e limpeza dos lagares. No jardim, prossegue a plantação de roseiras, gladíolos, cíclames e lírios, a proteger das geadas. Semear ervilhas-de-cheiro, goivos e jacintos. Quanto aos animais, abrigue o gado do frio e chuva, e acarinhe-o.
Quer-se dizer: em Dezembro descansa mas não durmas, como recomenda, por seu lado, O Seringador.
E pronto. É este tempo, senhores. O tempo. Ou, como dizia o outro na rádio a preto-e-branco: na aldeia do Senhor Costa, assim vai a agricultura. E quem diz Costa, diz Montenegro.

Isto à conclusão do engenheiro Sousa Veloso, que faleceu faz hoje dez anos. José de Sousa Veloso, engenheiro agrónomo e mítico apresentador do programa TV Rural da RTP. Durante três décadas, o Senhor Engenheiro deu as notícias e a táctica aos lavradores e outros telespectadores portugueses. Morreu no dia 27 de Novembro de 2014, com 88 anos. Conheci muito bem o engenheiro Sousa Veloso. Ambos frequentávamos o velho café Peludo. Ele no televisor pendurado logo à entrada, do lado esquerdo, por cima dos bolos-reis previamente encomendados e comprados fora para o Natal, e eu sentado no canto contrário, atento à TV e aos bolos, ouvindo uma e desejando os outros, nem que fosse só um bocadinho. No final, o Senhor Engenheiro dizia, num largo sorriso, já em cima da música: "Despeço-me com amizade, até ao próximo programa". Era para mim.

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Radiofonicamente falando

Ele tinha dois rádios muito jeitosos. Outro dia deu um tombo na banheira e agora o rádio do braço esquerdo, coitadinho, só apanha a onda média.

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Radiologia.

No princípio era o rádio

O rádio, diz a Wikipédia, é um elemento químico de símbolo Ra, número atómico 88 e massa atómica 226, pertencendo à família dos metais alcalino-terrosos, grupo 2 ou IIA da classificação periódica dos elementos. À temperatura ambiente, o rádio encontra-se no estado sólido. É um metal altamente radioactivo encontrado em minerais de urânio como na pechblenda. As suas aplicações são derivadas do seu carácter radioactivo. Foi usado em medicina e depois substituído por radioisótopos mais eficientes. Foi descoberto por Marie Curie e seu marido Pierre, em 1898, na pechblenda/uranita. O rádio era um sucesso absoluto, até que apareceu a televisão, isto ainda antes da internet e das chamadas redes sociais. Mas cá se vai safando...

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Radiologia.

domingo, 13 de outubro de 2024

Os "aitens" da Senhora Presidenta

Foto Hernâni Von Doellinger

Comentava-se o Orçamento de Estado na rádio Antena 1, à hora do almoço. Luísa Salgueiro, presidenta da Câmara de Matosinhos, foi convidada a dar a sua opinião, na qualidade de também presidenta da Associação Nacional dos Municípios Portugueses - ANMP. Como se tivesse lido o documento de ponta a ponta mesmo antes de ele ter sido entregue na Assembleia da República, a autarca de todos os autarcas falou, falou, falou, aliás como costuma falar. E referiu-se, nomeadamente, aos "aitens" do Orçamento, aos diversos e variados "aitens", eu ia buscar uma maçã à cozinha, o rádio estava aceso e, palavra de honra, obliterei-me como que por relâmpago, trouxe mais um jarro de água, porque entretanto perdi-me, e eu queria comer, não era beber. Perdi-me nos "aitens" da Senhora Presidenta. 
"Aitens"? Mas quais "aitens"? "Aitens"? A sério? A palavra item era um advérbio latino. Latino, não germânico ocidental ou anglo-frísio. E assim ficou em português. A forma correcta de pronunciar a palavra item é "íteme", à maneira latina, ou, parece-me melhor, "ítem", na forma aportuguesada. O plural de item é itens, dizendo-se "ítens".
A Senhora Presidenta disse "aitens" e eu, claro, lembrei-me de Salazar, da velha anedota de quando o ditador foi de visita a Inglaterra. Resumindo, e sem ofensa para os novos fascistas, do Chega ou não: Salazar, que usava vaso de noite e viajou acompanhado pelo seu mordomo Francisco, não sabia falar inglês, mas disseram-lhe que era fácil, o português era igualzinho ao inglês, bastava trocar o "i" por "ai". A meio da noite, apertadinho, o presidente do Conselho chamou, com o mais perfeito sotaque londrino - Ó Chaico, traz-me o penaico!
Era apenas uma anedota, um bocado ingénua, talvez oposicionista, se calhar Salazar até sabia falar muito bem inglês, basta ouvir António Guterres hoje em dia, mas foi dela, da anedota, e dele, Salazar, que eu me lembrei ao ouvir os "aitens" da Senhora Presidenta.
Eu sei que Luísa Salgueiro não está sozinha quando assim manifesta esta espécie de analfabetismo chique (aliás, "chaique"). Os "aitens" andam por aí de boca em boca, na boca de toda a gente, repetidos, normalizados, modernos, como se a patacoada já fosse regra gramatical. Não é. E incomodou-me, doeu-me, envergonhou-me particularmente ouvir a Senhora Presidenta a asnear ali na rádio nacional, à vista do país inteiro. Fiquei sentido por ser ela. Tocou-me como se fosse comigo. Porque, a verdade é só uma, moro em Matosinhos, a Senhora é a minha Presidenta e eu, ainda por cima, faço-lhe muito gosto.

(Agora outra coisa, que não tem nada a ver. As velhas anedotas de Salazar, que certamente ele também terá herdado de outro figurão que eu não sei, passaram depois para Samora Machel, primeiro presidente de Moçambique independente. E assim sucessivamente.)

quinta-feira, 26 de setembro de 2024

O cantor Gershwin, dizia a rádio da especialidade

Ouço rádio. Prefiro a rádio à televisão e os jornais em papel ao online. Prefiro os dicionários encadernados à Wikipédia e os livros de uma forma geral às séries "de culto". Tirando David Ferreira, às vezes o futebol e a meia hora a seguir ao meio-dia, que me ligam religiosamente à Antena 1, a minha rádio de companhia era a Smooth FM. Gostava da música que por lá passava, música da minha idade, e ria-me com o que diziam os locutores. Ignorância em frequência imoderada era ali - das bojardas gramaticais nas "notícias" aos spots publicitários que primavam pela asneira. Uma vez, na promoção a um concerto de Anthony Strong no lisboeta Centro Cultural de Belém, dizia-se assim:
"Anthony Strong em Portugal, num tributo às grandes vozes masculinas do jazz. Anthony Strong: Tribute To The Great Male Jazz Vocalist Of All Times. Entre os quais, Louis Armstrong, Chet Baker, Gershwin e muitos mais, numa noite memorável". Fim de citação. Exactamente, sobretudo Gershwin, esse extraordinário cantor...

P.S. - O compositor George Gershwin, autor de "Porgy and Bess", "Rapsodia in Blue", "Um Americano em Paris" e outras mais pequenas maravilhas, nasceu no dia 26 de Setembro de 1898.

quarta-feira, 12 de junho de 2024

Filipe La Féria, o supersupremo

Ouço os reclames na rádio Antena 1, a nossa rádio nacional, e os reclames são dois, vão alternando. Diz um que o espectáculo "Laura" é "o sonho supremo de Filipe La Féria". E o outro diz que o espectáculo "A Bela Adormecida" é "a obra-prima de Filipe La Féria". Eu não sei quem é que escreveu os reclames, mas parecem-me lidos por vozes oficiais da rádio Antena 1, a nossa rádio nacional, vozes e rádio em que, por princípio e definição, podemos e devemos confiar. Portanto "Laura" e "A Bela Adormecida" são de certeza dois musicais do caraças, extraordinários, superlativos, absolutamente absolutamente, únicos, só também não sei se "obra-prima" é mais do que "sonho supremo" ou se "sonho supremo" é mais do que "obra-prima". Ou vice-versa.
Em todo o caso, a mim, que não domino a ciência do vaudeville e espreito às vezes a televisão, sempre me pareceu que Filipe La Féria desenrascou-se muito bem com o espectáculo "Passa por mim no Rossio", em 1991, e depois, ao longo dos anos, só lhe vai mudando o título.

domingo, 9 de junho de 2024

Levaram-lhe o autorrádio

- É pá, tipo, fogo, roubaram-me o autorrádio!...
- É pá, tipo, partiram-te o vidro?...
- É pá, tipo, sei lá, também levaram o carro...

terça-feira, 30 de abril de 2024

A capella, ma non troppo

A rádio Smooth FM anunciava a vinda a Portugal dos Manhattan Transfer. Fazia a apresentação, e é justo, de "um dos mais famosos grupos de jazz a cappella". Em fundo passava um jingle: os Manhattan Transfer, "um dos mais famosos grupos de jazz a cappella", cantando muito bem acompanhados por orquestra. Perdoa-lhes, Senhor, eles não sabem o que é cantar a capella...

sábado, 20 de abril de 2024

Posso pedir um disco?


Vinham o padre, o presidente da câmara, o chefe da polícia, o sargento da GNR, o Emplastro, o comandante dos bombeiros, a fanfarra dos escuteiros, uma gaiola com pombas brancas, o André Ventura e o director da prisão. Parecia a procissão da Senhora de Antime parando em frente à Câmara, meu rico menino. O carcereiro, que vinha também, desatarraxou a porta da cela e o director da prisão, pausado e solene, com voz de locutor de rádio, informou o condenado: - Tens direito a um último pedido. O condenado pensou um bocadinho e disse: - Pode ser o "Sete e Pico", do Conjunto António Mafra?...

Agora a sério. Isto é, à séria, se inadvertidamente lido em Lisboa. Falemos de discos, dos velhinhos e cada vez mais modernos discos de vinil. A primeira jukebox de todos os tempos entrou em funcionamento no "saloon" Palais Royale, de São Francisco, EUA, no dia 23 de Novembro de 1889. A Fafe, as primeiras jukeboxes deverão ter chegado no final da década de sessenta do século passado, com as barracas de matraquilhos que se instalavam por baixo da Arcada, mais central era impossível, pelos 16 de Maio e pelas Festas da Vila. Havia um brilhantíssimo grupo de jovens fafenses, mais velhos do que eu, que dava excelente uso à novidade. Dessa malta porreira fariam parte, se não me engano, o Berto Dantas, o tio, o Eduardo do Retiro, o Mesquita, creio que o Mané, o Dr. Mané, o Jorge Lem, se era assim que se chamava, o Jorge Barros, filho do Nelinho, bissextamente o Ginho Cardoso e não tenho a certeza se o Bi Valente, gente assim desta categoria, e estou decerto a esquecer alguém ou alguéns e a confundir nomes. Eu admirava muito estes tipos cheios de classe, seguia-os sempre que podia, distâncias à parte, uma vez até me levaram com eles para um jogo de futebol que foram fazer a Felgueiras e no fim ainda tiveram a bondade de convidar-me para a almoçarada na Juditinha, evidentemente depois do Bertinho ter pedido por mim à minha mãe.
Mas tornando à maquineta dos discos, que mais tarde haveria de exibir também videoclipes, aliás de muito duvidosa qualidade, artística e técnica. Aquela rapaziada, já com algum mundo, tinha fino gosto musical e conhecia o que, regra geral, em Fafe ainda não se sabia. Acredito que me educaram o ouvido, entre alguns outros a quem o devo. A escolha na jukebox era muito limitada, pindérica, a ementa ao dispor consistia quase só naquilo a que hoje costumamos chamar música pimba. "O autocarro do amor" - de "Os Taras" e Montenegro, por onde andava um moço chamado Quim Barreiros - tocava de manhã até à noite, num despique fratricida e interminável com "Eu te amo, meu Brasil", de "Os Incríveis". Uma xaropada insuportável, um atentado às orelhas de qualquer um, nem que não as tivesse ou por mais moucas que elas fossem. A minha sorte é que os rapazes do bando do Bertinho, chamemos-lhes assim, faziam questão de destoar da ignorância geral e caprichavam na evangelização, pondo a tocar, de forma paciente e cirúrgica, Beatles obrigatoriamente, "Aquellos ojos verdes", por Nat King Cole, que eu desconhecia, tenho vaga ideia também de um clássico de Sinatra, não sei qual, lembro-me da poderosa versão de "I'm free", da ópera rock Tommy, dos The Who, com a London Symphony Orchestra, e sobretudo, e estou-lhes tão grato por isso, ensinaram-me a inestimável "Eloise", de Barry Ryan, que ainda hoje me regala.

Assim que tal, as festas acabavam, as barracas eram desfeitas, as jukeboxes iam-se embora e a minha vida entristecia. Sobrava-me o rádio e Quando o Telefone Toca, do Matos Maia, e era preciso dizer a frase.
Os 16 de Maio agora são Feiras Francas e as Festas da Vila, graduada em cidade, chamam-se Festas do Concelho, muita água passou entretanto por baixo das pontes e carros por cima então nem se fala. É tudo muito sofisticado e cosmopolita, mas os discos de vinil estão outra vez na moda e a música dos António Mafra parece que também.
Por outro lado. Os matraquilhos foram inventados pelo galego Alexandre Campos Ramires ou Alexandre de Fisterra, que também era editor e escritor. O nome mais bonito dos matraquilhos é, digo eu, pseberico. Assim se falava pelo menos em Fafe.

P.S. - Hoje é Dia do Disco de Vinil ou simplesmente Dia do Disco.

domingo, 21 de janeiro de 2024

Bienal, como o próprio nome indica


Vale a pena a recordação. E era a melhor das intenções, disso que não haja dúvidas. Na sua voz maviosa, a locutora da rádio fazia o elogio e o convite à visita à Bienal de Cerveira - "há 17 anos" a levar ao Alto Minho a nata da arte plástica nacional e internacional. Pois. Dezassete anos, contas bem feitas, porque naquele ano, 2013, era a décima sétima edição do evento e portanto não havia que enganar. A locutora da voz maviosa (já disse que a voz era maviosa, não já?) ignorava que a Bienal de Cerveira começou em 1978 - há 35 anos naquela altura, assim é que está certo - e que as bienais, como o próprio nome indica, realizam-se de dois em dois anos. Mas isso são pormenores.
Perdoo a ignorância da locutora. Eu próprio já escrevi que Vila Nova de Cerveira perde muito por não fazer a Bienal todos os anos. Mas era uma laracha das minhas: tenho a mania da piada tirado do cu com um dedo, não falo na rádio e raramente falo a sério. Perdoo a locutora por causa da sua voz definitivamente maviosa, minha companhia pelos nevoeiros matinais do Parque da Cidade, e porque a seguir ela me deu "Purple Rain", versão Urselle. Claro que era muito melhor o extraordinário original de Prince, mas se calhar não é suficientemente smooth...

P.S. - Jaime Isidoro - pintor, galerista e fundador da Bienal de Cerveira - morreu no dia 21 de Janeiro de 2009. Tinha 85 anos. A XXIII Bienal Internacional de Arte de Cerveira está marcada para este ano, de 20 de Julho a 30 de Dezembro, sobe o tema "És livre?" e comemorando os 100 anos do nascimento de Isidoro.

domingo, 11 de junho de 2023

O rádio deu que o mundo ia acabar, em FM

Ele tinha dois rádios muito jeitosos. Deu um tombo na banheira e agora o rádio do braço esquerdo, coitadinho, só apanha a onda média.

Nostradamus, estão a ver? Se não estão a ver, pensem em Orson Welles e chegam lá. Ah!, também não estão a ver Orson Welles. O grande realizador e actor americano, a voz potente, a presença imensa, o "Citizen Kane", o pregador de partidas que, em Outubro de 1938, transmitiu a versão radiofónica da "Guerra dos Mundos", de H. G. Welles, simulando uma reportagem em directo sobre a invasão da Terra por marcianos, e os americanos, que acreditam em tudo, caíram que nem patos e o medo paralisou pelo menos três cidades e o pânico tomou conta de várias localidades próximas de Nova Jersey, onde o programa era feito e onde, faz de conta, o ataque começara. Ainda nada? Também não interessa, eles são realmente muito antigos. Michel de Nostredame, aliás, foi um boticário e médico francês da Renascença que praticava muito bem a alquimia e rondava satisfatoriamente o ocultismo e a astrologia. Escreveu um famoso livro em versos intitulado "As Profecias", o qual, como o próprio nome indica, conteria previsões codificadas acerca do futuro, e tão codificadas seriam que só alguns muito poucos é que continuam a acreditar naquelas cousas sem sentido. Ou, a posteriori, com o sentido que se lhes quiser encaixar.
Eu sou de Fafe. Com muito gosto! E a sina, em Fafe, era lida por umas senhoras ciganas às quartas-feiras em cima da Arcada, sempre com um olho na mão e outro na polícia. A alternativa mais académica e legal era a balança colocada à porta do "escritório" das camionetas do João Carlos Soares, mesmo em frente ao Café Avenida. Subia-se para a balança, metia-se a moeda e saía um cartãozinho com o peso mais ou menos e o horóscopo resumido. Quem não ficasse satisfeito, era só pesar-se outra vez e o futuro mudava imediatamente. O peso às vezes também...
Nostradamus, nome latino e artístico, padecia de epilepsia psíquica, de gota e de insuficiência cardíaca. Se a isto tudo somarmos a habilidade para a leitura dos astros e das cartas de tarô, facilmente perceberemos que o artista viveu e morreu antes do tempo. O nosso Miguel seria o convidado ideal, diário, bidiário, ou talvez até terciário, para todos os programas das manhãs e das tardes das televisões generalistas portuguesas de hoje em dia.
A mais eficaz profecia de Nostradamus acabou por ser, lamentavelmente, a do seu próprio falecimento. Em 1566, dia 1 de Julho, inesperada véspera do definitivo dia 2 de Julho, estava o profeta cada vez mais à rasca derivado ao dramático agravamento da gota e da artrite, chamou o seu secretário e, entre trovões e relâmpagos e talvez sarças ardentes de febre, disse-lhe o que já lhe dissera mais do que uma vez: de amanhã não passo. E finalmente acertou.

(Agora. Aqui que ninguém nos ouve: Renascença não quer dizer Rádio Renascença, é outra coisa. Registe-se, ainda assim, que o americano Edwin Armstrong, outro antigo, inventou o FM radiofónico em 1933 e fez a primeira apresentação pública da sua invenção nos EUA no dia 11 de Junho de 1935. Faz hoje anos. E pronto, tanto relambório para chegar a isto, a este claustrofóbico entre parênteses. Se fosse eu, também não lia!)

quarta-feira, 7 de junho de 2023

Antes de ir às Antas, Sinatra cantou em Fafe

Vinham o padre, o presidente da câmara, o chefe da polícia, o sargento da GNR, o Emplastro, o comandante dos bombeiros, a fanfarra dos escuteiros, o Bruno de Carvalho, uma gaiola com pombas brancas e o director da prisão. Parecia a procissão da Senhora de Antime parando em frente à Câmara. O carcereiro, que vinha também, desatarraxou a porta da cela e o director da prisão, pausado e solene, com voz de locutor de rádio, informou o condenado: - Tens direito a um último pedido. O condenado pensou um bocado e disse: - Pode ser o "Sete e Pico", do Conjunto António Mafra?...

Agora a sério. À séria, se inadvertidamente lido em Lisboa. A primeira jukebox de todos os tempos entrou em funcionamento no "saloon" Palais Royale, de São Francisco, EUA, no dia 23 de Novembro de 1889. A Fafe, que é o que aqui interessa, as primeiras jukeboxes deverão ter chegado no final da década de sessenta do século passado, com as barracas de matraquilhos que se instalavam por baixo da Arcada, mais central era impossível, pelos 16 de Maio, que ainda foram há pouco, e pelas Festas da Vila, que estão quase a ser. Havia um brilhantíssimo grupo de jovens fafenses, mais velhos do que eu, que dava excelente uso à novidade. Dessa malta porreira fariam parte, se não me engano, o Berto Dantas, o tio, o inseparável Eduardo do Retiro, o Mesquita, creio que o Mané, o Dr. Mané, o Jorge Lem, se era assim que se chamava, o Jorge Barros, filho do Nelinho, bissextamente o Ginho Cardoso e não tenho a certeza se o Bi Valente, gente assim desta categoria, e estou decerto a esquecer alguém ou alguéns e a confundir nomes. Eu admirava muito estes tipos cheios de classe, seguia-os sempre que podia, distâncias à parte, uma vez até me levaram com eles para um jogo de futebol que foram fazer a Felgueiras e no fim ainda tiveram a bondade de convidar-me para a almoçarada na Juditinha, evidentemente depois do Bertinho ter pedido por mim à minha mãe, que não era para brincadeiras.
Mas tornando à maquineta dos discos, que mais tarde haveria de exibir também videoclipes, aliás de muito duvidosa qualidade, artística e técnica. Aquela rapaziada, já com algum mundo, tinha fino gosto musical e conhecia o que, regra geral, em Fafe ainda não se sabia. Acredito que me educaram o ouvido, entre alguns outros a quem o devo. A escolha na jukebox era muito limitada, pindérica, a ementa ao dispor consistia quase só naquilo a que hoje costumamos chamar música pimba. "O autocarro do amor" - de "Os Taras" e Montenegro, por onde andava um moço chamado Quim Barreiros - tocava de manhã até à noite, num despique fratricida e interminável com "Eu te amo, meu Brasil", de "Os Incríveis". Uma xaropada insuportável, um atentado às orelhas de qualquer um, nem que não as tivesse ou por mais moucas que elas fossem. A minha sorte é que os rapazes do bando do Bertinho, chamemos-lhes assim, faziam questão de destoar da ignorância geral e caprichavam na evangelização, pondo a tocar, de forma paciente e cirúrgica, Beatles obrigatoriamente, "Aquellos ojos verdes", por Nat King Cole, que eu desconhecia, tenho vaga ideia também de um ou dois clássicos de Sinatra, não sei quais, lembro-me da poderosa versão de "I'm free", da ópera rock Tommy, dos The Who, com a London Symphony Orchestra, e sobretudo, e estou-lhes tão grato por isso, ensinaram-me a inestimável "Eloise", de Barry Ryan, que ainda hoje me regala.

Mas pronto. Assim que tal, as festas acabavam, as barracas eram desfeitas, as jukeboxes iam-se embora e a minha vida entristecia. Sobrava-me o rádio e Quando o Telefone Toca, do Matos Maia, e era preciso dizer a frase...
Por outro lado. Os matraquilhos foram inventados pelo galego Alexandre Campos Ramires ou Alexandre de Fisterra, que também era editor e escritor. O nome mais bonito dos matraquilhos é, digo eu, pseberico.

Ora bem. Vem esta desarticulada lembrança a propósito de Frank Sinatra (1915-1998), que actuou pela primeira vez em Portugal no dia 7 de Junho de 1992, faz hoje 31 anos, no também já falecido Estádio das Antas, no Porto, o que só não foi novidade completa porque, como acabo de revelar, mais de duas décadas antes já o mavioso Francis Albert cantava em Fafe, alto e bom som, mas barracas de matraquilhos com porta aberta por baixo da Arcada. Os 16 de Maio agora são Feiras Francas e as Festas da Vila, graduada em cidade, chamam-se Festas do Concelho, muita água passou entretanto por baixo das pontes e carros por cima então nem se fala, mas convém não esquecer...

quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Os famosos do dia

No dia 29 de Dezembro de 1891 o empresário americano Thomas Edison patenteou o rádio. No dia 29 de Dezembro de 1987 o tractorista português Anacleto Felgueiras fracturou o cúbito.

segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Descendo ao topo da hora

Ora cá está mais uma interessantíssima problemática. A problemática do "topo da hora", esse escusado e equívoco bordão radiofónico que hoje me proponho dissecar com a seriedade intelectual e a profundidade filosófica do costume.
Na rádio, o "topo da hora" é o sítio onde estão colocados os noticiários. Os noticiários alargados, entenda-se, porque também há as edições apertadinhas, às meias. Doses. "Notícias no topo da hora", costumam dizer-nos os locutores ou jornalistas, remetendo-nos, por exemplo, para as 11 horas, para o noticiário das 11 horas. E aqui é que bate o ponto. Porque (sigam o meu raciocínio, por favor), se o noticiário das 11 horas for no "topo da hora", ele deverá ir para o ar às 11h59m59s, porque aí é que é o topo da hora 11. Isto é: para estarem no "topo da hora", as notícias das 11 só são ao meio-dia; porque, na verdade, as 11 são o topo da hora, mas das 10, da hora 10. O que quer dizer que temos andado estes anos todos com os noticiários trocados.
Que não restem dúvidas: topo, neste contexto, quer dizer a parte mais elevada, o cume. E o cume de uma hora é o último segundo antes de ela entrar na hora seguinte. É certo que topo também pode significar extremidade, mas, se forem por aí, recomenda-se aos senhores locutores, jornalistas e radialistas em geral que apontem sempre as notícias para o topo de baixo.