segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Quando o cancro era pecado

Fafe era uma terra um bocadinho hipócrita. Evidentemente eu não posso dizer se Fafe era uma terra mais ou menos hipócrita do que as outras terras, porque eu só conhecia Fafe, mas que Fafe era uma terra um bocadinho hipócrita, disso tenho a certeza absoluta, porque eu estava lá e não sou parvo. Provavelmente Portugal completo era um país um bocadinho hipócrita, se calhar inteiramente hipócrita, mas disso eu não sabia ainda, não fazia sequer ideia, porque, é como digo, eu estava em Fafe, e em Fafe desconhecia-se o mundo abaixo de Arões, sobretudo derivado àquilo de que Fafe era uma terra um bocadinho hipócrita. Mas, verdade seja dita, éramos razoavelmente felizes e saudáveis.
Em Fafe, por exemplo, ninguém padecia de cancro. Porque em Fafe não existia a palavra cancro. Cancro. A palavra cancro não se dizia. O cancro era crime e castigo. Pecado e culpa. Vergonha, tabu. Dizia-se que Fulano ou Sicrana tinham - aqui baixando a voz ao nível do sussurro, do segredo ao ouvido, do cochicho maledicente, da coscuvilhice beata - um psdtrff. Um psdtrff, com sinal da cruz e tudo. Sim, estava no hospital, no Porto, com um psdtrff, muito malzinha ou malzinho, consoante fosse Sicrana ou Sicrano, Deus lhe perdoe. Muitos fafenses morreram, naquele tempo, com psdtrff, mas nunca ninguém morreu com cancro. E não havia Sicranes.
E mamas? Mamas, dizia-se. Havia mama e havia mamas em Fafe, embora não fosse geral, como já aqui informei com todo o rigor. Tanto quanto me lembro, predominava um certo convencimento de que as raparigas e mulheres de Fafe possuíam realmente mamas, porém nem todas queriam que isso se soubesse. Mas cancro e mamas ou mama é que nunca poderiam coincidir numa mesma frase: cancro da mama, vamos um supor, seria impossível, desde logo porque é obsceno, e a pornografia constava que era só em Guimarães, e, em todo o caso, como se viu, a palavra cancro não existia em Fafe. Psdtrff da mama, com todo o respeito, até admito que possa ter havia, mas eu nunca ouvi dizer, devo confessar.
E depois do cancro, a sida, a mesma hipocrisia, a mesma pequena hipocrisia, a mesma enorme ignorância. Ignorância e indizível maldade. Naquele tempo, o cancro esteve para a sida como João Baptista serviu para Jesus Cristo, mas não adiantou, ninguém acreditou, essa parte não vinha no catecismo de sacristia, rançoso e cruel, e bondade e compaixão eram apenas palavras da boca para fora. Como psdtrff...
Assim eram as coisas nos bons velhos tempos, e eu limito-me a contá-las tal qual as sei. Fafe está aqui como mero pretexto, mais nada. Fafe é hoje uma terra completamente diferente e absolutamente igual. Porque Fafe, sendo talvez às vezes uma terra um bocadinho hipócrita, é com certeza e sempre uma terra do caralho. Quero dizer, do c******.

P.S. - Hoje é Dia Nacional de Prevenção do Cancro da Mama. Texto publicado originalmente no meu blogue Fafismos.

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

Activistas?

Dizem que são activistas. E o que é que fazem? Sentam-se, alapam-se, deitam-se, enrolam-se, aconchegam-se, colam-se, pregam-se, amarram-se, acorrentam-se, plantam-se, e dali não saem dali ninguém os tira. Sem menosprezo pelos seus meritórios serviços, eu parece-me que, em rigor, melhor fariam se se chamassem, antes pelo contrário, passivistas ou, vá lá, paradistas...

Ó Lua, não me ligas nenhuma!...

Foto Hernâni Von Doellinger

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Desenganado pelo médico

Rosalvo Almeida, 77 anos, neurologista aposentado e membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, defende que os médicos devem optar por formas de protesto que não prejudiquem os doentes. De acordo com o jornal Público, o sócio número 1 do Sindicato dos Médicos do Norte perdeu a paciência e rasgou o cartão, agora sou eu a dizer, por ser contra a luta da classe "à custa dos doentes". Ao fim de quatro décadas, Rosalvo Almeida decidiu bater com a porta e sair da estrutura sindical que ajudou a fundar, argumentando que sente "vergonha" das declarações com que os dirigentes sindicais justificam as actuais "lutas" e "sucessivas greves" levadas a cabo "em desrespeito pelos doentes".
A este respeito, e continuo a citar o Público, um dirigente sindical respondeu que a medicina "não é um sacerdócio". E eu, confesso, pensava que era - sacerdócio: missão nobre, profissão honrosa - , e ainda ontem vim tão satisfeito e crente da consulta semestral com a minha médica excelentíssima, sempre presente e interessada, obstinada sacerdotisa do Serviço Nacional de Saúde, mas bem enganadinho que eu andava, e a doutora Joana aparentemente também. Hoje já sei: a medicina, afinal, é apenas uma profissão particularmente liberal, um gancho, um tacho, uma caixa registadora, um negócio como outro qualquer - o médico do sindicato desenganou-me...

O novo administrador

Ele tomou posse e imediatamente operou uma revolução completa na frota da empresa. Os veículos passaram a chamar-se viaturas.

Certidão de óbvio

As autoridades compareceram no local e confirmaram o óbvio: o morto já se encontrava cadáver. E é daí que a coisa vem...

P.S. - Hoje é Dia Nacional da Desburocratização.

terça-feira, 24 de outubro de 2023

Nações Unidas, um dia qualquer

Hoje é Dia das Nações Unidas. Nações unidas, nos tempos que correm, com a matança que vai por aí? Só pode ser piada...

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Emigração e imigração, em Fafe

"Emigração e Imigração em Portugal no séc. XXI" é o tema da conferência a realizar na próxima sexta-feira, dia 27 de Outubro, pelas 18h30, no Arquivo Municipal de Fafe. Pedro Góis, professor associado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, será o orador, em mais uma iniciativa do Museu das Migrações e das Comunidades. A entrada é livre.

Morreu o Bobi

Morreu o Bobi. Era o cão mais velho do mundo e era evidentemente português. O Bobi estava no Guinness como o Cristiano Ronaldo e quase tudo o que é feito em Portugal e dá no Correio da Manhã. O Bobi também deu no Público. Só para terem uma ideia, o Bobi era tão antigo que até se chamava Bobi, que era o nome que antigamente se dava aos cães, no tempo dos romanos, ou pelo menos Tejo. O Bobi morreu e Portugal está mais pobre. Mas é o país que temos...

sábado, 21 de outubro de 2023

Os missionários

Hoje é Dia Internacional das Missões. E isso traz-me boas memórias. Os missionários fizeram muito parte do meu imaginário infanto-juvenil. Embora o meu seminário fosse rigorosamente diocesano, eu acompanhava-lhes as aventuras através da literatura especializada, nas revistas Além-Mar e Audácia, pelo menos. Os missionários eram também artistas de cinema, heróis e mártires. Isso, os missionários. Pedindo meia dúzia de palavras emprestadas a Emmanuel Carrère, os missionários, quando começaram e durante séculos, foram, por outro lado, umas criaturas que a Igreja mandou por esse mundo fora para baptizar os selvagens sem lhes pedir opinião.

A fé e o império

Foto Hernâni Von Doellinger

quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Heaven, I'm in heaven

Foto Hernâni Von Doellinger

Pois faria-o!

Escreve o jornal O Jogo, em título, a propósito do jogador de futebol Jakub Jankto, internacional checo que em Fevereiro tornou pública a sua homossexualidade: "Assumiu-se como homossexual e diz: se pudesse repetir, faria-o de certeza". Pois faria-o!...

P.S. - Entretanto a bojarda foi corrigida, "fá-lo-ia", e antes assim.

segunda-feira, 16 de outubro de 2023

O comentador que o país inteiro consagrou

Fala-se no "comentador que o país inteiro consagrou", e os antigos pensamos logo em Alves dos Santos. Os modernos cuidam que é Marcelo Rebelo de Sousa.

P.S. - O jornalista e comentador desportivo Alves dos Santos morreu no dia 17 de Outubro de 1996. Contava 82 anos.

Alojamento local

Foto Hernâni Von Doellinger

domingo, 15 de outubro de 2023

Guerras santas e outras criações

O pior foi quando os homens criaram Deus. Mas, lá está, a culpa é de Deus. Deus fez asneira quando criou os homens.

O meu caminho

Foto Hernâni Von Doellinger

Quem não sabe é como quem não vê

Hoje é Dia Mundial da Bengala Branca. Branca. Branca e apenas branca. E eu parece-me que há aqui qualquer coisa que não bate certo, mas a verdade é que os modernos entendidos, os intrépidos vigilantes do palavrismo, os mui respeitáveis fiscais do arco-íris e benévolos defensores das pessoas-portadoras-de, ainda não disseram nada. Nadinha! O que se me afigura manifestamente arreliador.

sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Adeus, velho Titan!

Foto Hernâni Von Doellinger

Dia 12 de Abril de 2012. O superguindaste Titan, desactivadíssimo e declarado em avançado estado de degradação, estava a ser desmantelado no molhe sul do Porto de Leixões, junto ao terminal de cruzeiros em construção. Durante a operação, a cabina de uma das gruas da obra caiu sobre uma conduta de gás, provocando várias explosões e um enorme incêndio. Morreu um trabalhador.
O Titan, símbolo de Leixões e de Matosinhos, desaparecia em tragédia, apagando-se compulsivamente dos nossos belos pores-do-sol. Considerado uma importante peça da arqueologia industrial, mesmo em frente à minha varanda se eu me puser de lado, os seus restos foram despejados e esquecidos num canto manhoso junto à Docapesca, encostado à rua dos restaurantes de peixe e dos turistas, a apodrecer como o lixo desleixado que por ali fede.
Passou o tempo e veio a ferrugem. O renascimento do Titan foi sendo anunciado pelo Governo, pela Câmara de Matosinhos e pela APDL, ao sabor dos ciclos eleitorais, primeiro em 2019 e depois em 2020. Prometia-se a construção de uma réplica inoperacional do velho gigante para fins eventualmente culturais mas certamente turísticos, ou, como quem diz, pelo menos para propaganda. E finalmente em Outubro de 2021 a coisa foi inaugurada, e por acaso até calhou bem porque um mês depois eram as eleições autárquicas.
Quanto aos alquebrados ossos do velho Titan, o verdadeiro, as memórias visíveis e palpáveis do "maior guindaste a vapor do mundo", utilizado na construção do Porto de Leixões, no século XIX, por ali continuaram, junto à vedação, partilhando a desmemória com o também abandonado rinque do Futebol Clube Senhor do Padrão, que eu não sei o que é feito dele.
Até que esta semana. No princípio da semana, sem pompa nem circunstância, suponho que também sem aviso, e se calhar por vergonha, o que restava do velho Titan, o genuíno, foi desaparecendo aos bocadinhos, um dia atrás do outro, até que o canto ficou vazio, ainda mais triste, ainda cercado por baias metálicas como se viesse aí a Volta a Portugal e por aquelas folclóricas fitas de plástico que costumam interditar os locais de crime.
O velho Titan, o verdadeiro, foi finalmente embora, sem uma festa de despedida, sem umas palavrinhas a abater, obrigadinho ó mano e faz favor de desculpar!, sem sequer missa de undécimo ano, pelo menos que se soubesse. Foi-se sem honra nem glória. E sem croquetes e sem zumba. Sem convidados, sem ministros, parece impossível em Matosinhos, sem batedores da polícia nem polícia municipal, sem Joel Cleto e sem Luísa Salgueiro e demais autoridades locais, civis, religiosas e militares. E portanto sem televisões, que ainda nem fazem ideia e hoje já é sábado.
Pela minha parte, digo: adeus, velho Titan! Morreu o guindaste! Viva o guindaste! O de imitação, mas é que temos...

Os judeus e os árabes e vice-versa

Eu, confesso, não sei distinguir o sofrimento das vítimas inocentes israelitas do sofrimento das vítimas inocentes palestinianas. Não sei dizer qual é o sofrimento mais justo, o sofrimento maior, o sofrimento mais razoável, o sofrimento mais aceitável, compreensível e lógico. Não sei dizer qual é o sofrimento mais iníquo, condenável e horrível. Não sei. Mas isso sou eu, que, já percebi, sou burro, não tenho lado. O sofrimento humano, vejo-o todo igual. Desnecessário, estúpido e brutal. Filhodaputa! As vítimas, inocentes ou não, judeus ou árabes, árabes ou judeus, vejo-as todas iguais. Pessoas, histórias, vidas. Os mortos, vejo-os todos iguais. Mortos.

quarta-feira, 11 de outubro de 2023

A vida feita num oito

Hoje é Dia Mundial da Visão. E eu, no entanto, vou ao dentista. Quer-se dizer, tenho a minha vida feita num oito.

Ele sabia onde estava o "fotógrafo"...

Foto Hernâni Von Doellinger

A vespa asiática

As vespas asiáticas são principalmente Honda, Yamaha e Suzuki. Mas também Zongshen, Lml, Lifan, Generic, Kinroad, Jincheng, Znen, Masaï, Keeway, Baotian, Sym, Pgo, Kymco e TNT. Isto apenas por exemplo. E são realmente uma praga.

sábado, 7 de outubro de 2023

Ex-planada

Foto Hernâni Von Doellinger

O Oliveira

O Oliveira foi chamado de urgência à gerência. Ordens: mudança de secção e de funções. Quer-se dizer: mobilidade, sinergias. Deram-lhe portanto um martelo. - Um martelo!? - protestou -, mas toda a gente sabe que eu sou o Oliveira da serra...

P.S. - Só para que fique registado: Oliveira de Frades e Oliveira do Hospital celebram hoje os respectivos feriados municipais.

sexta-feira, 6 de outubro de 2023

E os domingos calhavam à quarta-feira


A feira de Fafe era três. Um três-em-uma, três feiras numa só, pague uma e leve três. A feira de Fafe era um pacote, uma pechincha. Dou-lhe uma, dou-lhe duas, dou-lhe três! Tínhamos a Feira propriamente dita, no terreiro do Largo, actual Praça 25 de Abril. Tínhamos a Feira das Galinhas, na hoje chamada Praceta Egas Moniz. E tínhamos a Feira do Gado, na Feira Velha, agora dita Praça Mártires do Fascismo. As três eram apenas uma, coincidiam no mesmo dia, quarta-feira, como ainda hoje, a dispersão geográfica não passava de um pormenor, mas de vanguarda. Se fosse hoje, dir-se-ia que era uma feira em três pólos. Ricos tempos! Tínhamos muito, tínhamos tudo, uma fartura. De feira estávamos nós bem servidos, faltava-nos era dinheiro...
Em bom rigor, a feira começava antes da feira, logo por Cima da Arcada, numa espécie de antecâmara dedicada às artes performativas e da propaganda, espaço semanalmente ocupado pelo vendedor de banha da cobra, pelos milagres e mezinhas da santa Alexandrina de Balasar, pelas pacientes Testemunhas de Jeová e, ocasionalmente, pelo Rei das Limas, que, no entanto, era praticamente da casa, como já aqui contei. E havia também um sítio especial para o pão, diversos tipos de pão regional, doméstico, de Fafe e das redondezas até Amarante, especialidades vendidas por duas ou três senhoras e por um senhor que vestia um avental de peito, comprido até aos pés, impecável de branco e de limpeza.
Descidas as escadas, no Largo, os ourives instalavam-se debaixo dos arcos da Arcada ou logo em frente, hoje sítio de esplanadas e medíocres programas de televisão de aluguer. Parecia que o ouro do mundo inteiro se juntava ali, em cima de bancas de madeira forradas a flanela negra, as nossas ourivesarias Martins e Pérola também montavam estendal, e eu ficava a imaginar aqueles ourives todos com os bolsos dos casacos cheios de pistolas e espingardas caçadeiras, e sobretudo com uns tomates muito grandes dentro das calças, porque de outro modo não podia ser. Eles andavam assim carregados de terra em terra, quer-se dizer, sem seguranças, sem carrinhas blindadas, sem telemóveis, sem ligação directa à polícia, sem satélites, sem drones, nada, só o patrão e talvez um empregado de preferência solteiro e eventualmente borrado de medo, os dois enfiados na velha carripana e a rezar o terço. Isto é, estavam mesmo a pedi-las...
No terreiro da feira era o costume. Hortaliças, legumes, verduras, frutas, talvez secção de louça e panelas. E muito povo. A feira instituíra-se local de encontro semanal, mais do que a missa de domingo, e aqui, zona de cozinha e mesa, eram sobretudo mulheres. Outra vez descendo, para a Feira Velha, aí eram principalmente homens, lavradores em maioria, com as carteiras a abarrotar de notas de conto. À roda da escola fascista cujas pedras deram, por milagre, em capela, vendia-se e comprava-se gado. Bois, vacas, bezerros. E alfaias agrícolas, e jugos e sogas, e pipas e dornas, e latoaria, e fatos e samarras e capotes e croças e chapéus e bonés e sapatos e botas e galochas e chancas e socos. E nos tascos das redondezas, isto é, na vila inteira, apanhavam-se pielas de caixão à cova. Lá dentro, na escola, era um cheiro a bosta que se não podia, mas o regime realmente também não se recomendava...
Gado de mais pequeno porte, digamos, frangos, galos, galinhas, garnisés, pintainhos e coelhos das mais variadas origens e díspares feitios, isso era mais cá para cima, na Feira das Galinhas, larguinho de terra virado para a Igreja Nova e onde se mercavam também ovos, farinhas, feijão e milho, saquinhos de sementes, tudo colocado no chão estreme, em carreirinhas ordenadas, honestas, sem truques para enganar o freguês. Fazia-se comércio directo. Havia quem levasse à feira galinhas de patas atadas, debaixo do braço forte ou enfiados em cestas de vime com a crista de fora, e trouxesse para casa meia dúzia de sacos de feijão e grão, sacos de pano, sossegados no açafate muito bem tenteado na cabeça com rodilha.
Lembro-me agora: chegou a haver um mercado de sábado, mas só pelas manhãs, parece-me, no nosso Santo Velho, outro terreiro. Era uma feirinha.
Há muito despejada do Largo, a feira de Fafe andou entretanto com a tenda às costas, deu as suas voltas, até assentar arraiais na hoje chamada Praça das Comunidades, feita de propósito para a função. E ali está de armas e bagagens, creio que bem instalada e para ficar. Mas é só uma...

(Texto publicado originalmente no meu blogue Fafismos)

À moda antiga

Foto Hernâni Von Doellinger

quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Em Portugal seria impossível

A coisa foi notícia, veio nos jornais. Aqui há uns anos, na Suazilândia, mais de 80 mil virgens dançaram para o rei. Com as purezas praticamente ao léu, as jovens concorriam ao lugar de noiva de Mswati III, um felizardo que na altura já aquecia os pés com doze esposas e pode sempre escolher mais uma.
Em Portugal tal cerimónia seria impossível. Não por falta de virgens, evidentemente. Mas não temos rei.

P.S. - Mswati III, 41 anos, goza actualmente de quinze esposas, de acordo com a última contagem.

Mansos cavalos de seda

Foto Hernâni Von Doellinger

terça-feira, 3 de outubro de 2023

Jogava-se ao tene, que era para todos

Jogava-se ao tene, no nosso largo. Tene, esclareça-se desde já, não é singular de ténis. Nem é sapatilha desirmanada nem nome que se dê ao jogo de ténis quando jogado por uma pessoa só. Nesse caso chama-se squash. Não. O tene era um jogo universal, de recreio, de rua, de pobres, envolvendo quantos mais miúdos melhor, sem necessidade de outros apetrechos ou equipamentos senão o próprio corpo e muita corda nos sapatos. Embora também se jogasse descalço. Ou de chancas. Ou, vá lá, de galochas...
As regras são simples. O objectivo do jogo é fugir ou tenir, conforme o ponto de vista. Escolhe-se à sorte um desgraçado, que deve tentar apanhar, isto é, tocar com a mão, os outros participantes. Um deles. E, uma vez conseguido, troca-se de posição. Quem foi apanhado, isto é, tocado, assume então a função de apanhador, o ex-apanhador passa a normal fugidor e assim sucessivamente.
Dir-me-ão então: ora, mas isso é o jogo da apanhada, ou o pega-pega ou pique-pega, se for no Brasil. Nada disso. Era o tene, o nosso tene. Porque, lá está, basta tenir, tocar levemente com a mão, com o dedo. Quem toca levemente, tene. Básico e inofensivo. O tene. Já o arranca-cebolas, por exemplo, implicava outra, por assim dizer, dinâmica e não raras visitas ao hospital.
Dir-me-ão então, e já estão a chatear: ora, mas não é tenir, é tinir, o verbo tenir não existe na língua portuguesa. Existe, existe, basta ir a Fafe e ouvir alguém que seja do falar antigo e que se lembre, claro que se lembra, do velho jogo e deste precioso regionalismo talvez baixo-minhoto e que pegou de estaca pelo menos ali na nossa zona. Ou onde é que cuidam que o bom do Costeado foi buscar o "Nem lhe teni, senhor árbitro!"?...

(Texto publicado originalmente no meu blogue Fafismos)

Ao nível

Foto Hernâni Von Doellinger