quarta-feira, 22 de abril de 2020

Jorge de Lima 6

[Vereis que o poema cresce independente]

Vereis que o poema cresce independente
e tirânico. Ó irmãos, banhistas, brisas,
algas e peixes lívidos sem dentes,
veleiros mortos, coisas imprecisas,

coisas neutras de aspecto suficiente
a evocar afogados, Lúcias, Isas,
Celidônias... Parai sombras e gentes!
Que este poema é poema sem balizas.

Mas que venham de vós perplexidades
entre as noites e os dias, entre as vagas
e as pedras, entre o sonho e a verdade, entre...

Qualquer poema é talvez essas metades:
essas indecisões das coisas vagas
que isso tudo lhe nutre sangue e ventre.


"Livro de Sonetos", Jorge de Lima

(Jorge de Lima nasceu no dia 23 de Abril de 1893. Morreu em 1953.)

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