Fui ver o 25 de Abril ao Porto. Porque, para quem não tem mais nada que fazer e é teso, o Porto é um sítio porreiro para se ver 25 de Abris e não é preciso comprar bilhete. No Porto há milhões de camones de passagem, milhares de portugueses desempregados coçando colhões e esquinas, trezentos e cinquenta portuenses residentes e uma praça e uma avenida destinadas ao 25 de Abril, às greves gerais, ao 1.º de Maio, aos carteiristas e aos vadios em geral, as quais, praça e avenida, são emprestadas pelo Sr. Pinto da Costa quando o Futebol Clube se esquece de ser campeão - o que em democracia é raro e altamente suspeito.
O 25 de Abril correu muito bem. Vintecincodeabrilou-se ali com grande pertinácia e depois acabou. Acabou, mas eu, que sou de lágrima fácil, estava com uma vontade de mijar que já não era só vontade, era um estado de emergência, e desatei a correr como um tolinho para o WC sob as escadinhas da Rua 31 de Janeiro com a Estação de São Bento e com a polícia de choque atrás de mim como se eu levasse um engenho explosivo na braguilha. Não levava. Estava apenas à rasca. À rasquíssima. E a retrete estava de portas fechadas. Por causa do feriado.
Que se segue: eu bem não queria, mas tive de ir, com uma mão à frente e outra atrás, às casas de banho da estação propriamente dita. Às tais, às míticas, às suspeitíssimas. O que se passou lá dentro não interessa, apenas faço questão de garantir que saí daqueles apertos com a honra invicta. A polícia, entretanto, desinteressou-me de mim e passou a perseguir um casal de lavradores do Marco de Canaveses que tinha vindo a uma consulta de otorrinolaringologia, ela com a infelizmência de um xaile vermelho às costas e ele com um saco de plástico na mão, sotaque da terra e "cara de marroquino". Nas varandas (ou sacadas, como se diz em Fafe) cantava-se "Grândola, vila morena" com uma afinação de oficina de automóveis. O relógio exterior de São Bento batia as quinze e quinze. A polícia também. Após a sova da ordem, as autoridades verteram nos autos que o perigoso saco continha um cartucho com 250 gramas de sementes de pepino compradas sem guia de remessa na Casa Hortícola do velho Bolhão, um toquinho de chouriço de colorau, meia sêmea, um taparuer com uma cebola da monda rachada em quatro e metida em sal grosso e vinagre tinto e dois olhos de azeite, uma garrafa de cerveja quase vazia de vinho, duas pastilhas avulsas para o enjoo e um canivete belga com seis centímetros de lâmina. Os dois indivíduos, um do sexo masculino e o outro não, entre os sessenta e os setenta anos, foram detidos por posse de arma branca. Os peritos em minas e armadilhas fizeram explodir o resto.
P.S. - Contava-se que havia um padre, famoso pregador, que fazia sempre o mesmo sermão. Só mudava o nome do santo. Ora bem: o grosso do texto acima foi publicado no dia 23 de Março de 2012 e para uma greve geral. Já o adaptei a um 1.º de Maio e hoje ponho-lhe o 25 de Abril. Palpita-me que não vou ficar por aqui...
Sem comentários:
Enviar um comentário