Ha alguns dias, na cidade de Kobe - poderia precisar o dia, e quase a hora, se tamanho rigorismo me exigissem - irrompeu a Primavera. Irrompeu: não há sombra de exagero no vocábulo. Irrompeu, surgiu dum pulo, fez explosão. Neste país do Sol Nascente, onde o sol e, com ele, todas as grandes forças naturais são ainda uns selvagens - se assim posso expressar-me -, uns selvagens sem freio, sem noção das conveniências, incapazes de se apresentarem de visita, de luvas e casaca, numa corte qualquer da nossa Europa; neste país do Sol Nascente, ia eu dizendo, a criação inteira apostou, parece, em oferecer em cada dia uma surpresa, toda ela exuberâncias inauditas, espalhafatos únicos, repentismos nervosos, caprichos doidos, como se reunisse em si a quinta essência da alma das creanças e a quinta-essência da alma das mulheres, a gargalhada, a troça, enfim, motejadora de tudo quanto é ordem, harmonia, contemporizadora lei das transições.
"Paisagens da China e do Japão", Wenceslau de Moraes
(Wenceslau de Moraes nasceu no dia 30 de Maio de 1854. Morreu em 1929.)
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