terça-feira, 30 de maio de 2017

Domingos do Nascimento

Versos de um decadente

Grotas vencendo, túneis bifurcando,
Garimpa o comboio o Cubatão - parece
Uma enorme serpente aos silvos curveteando,
Guizos tinindo, a cauda e S...

Alma! Contempla o vasto panorama.
Ergue o olhar, se inflama,
Vê como rola célere a torrente...

Rilha o comboio, rilha sobre os trilhos,
Ringe entreabrindo a luz, ronda fechando a treva;
Salta os abismos, rasga as densas matas.
Na corrida precipite que o leva,
Rilha o comboio, rilha sobre os trilhos,
Entre rumores de cascatas...

Chéu... Chéu... Chéu...
Uma nesga de mar! A orla da serrania!
Fremem as matas, ri a casaria.
- O abismo... o nevoeiro... a serra... o céu!...
Grotas vencendo, túneis bifurcando,
Grimpa o comboio o Cubatão - parece
Uma enorme serpente, a cauda em S...

Como o animal bravio
Que a flecha transpassou, ruge, redobra o salto,
Cambaleia, e de novo arranca em disparada,
Para cair além... para não mais se erguer. 
Galga o comboio a borda do planalto,
As entranhas em chama, o flanco luzidio,
Num bramido possante de metais,
Num bramido que vai de quebrada em quebrada,
Para cansar, para morrer
Entre coxilhas e pinheirais.

Perdendo a vida ardente que a acrisola,
A serpe enorme - de aço resfriado -
Não mais ruge, nem rilha, nem mais rola
Pelo destino que lhe foi traçado.

Já não ruge, nem rilha, nem mais rola...

- Tal um comboio, após a impetuosa carreira,
Ó alma, não mais tens a tua nevrose ardente!
Outra nova clareira no presente?

Domingos do Nascimento 

(Domingos do Nascimento nasceu no dia 31 de Maio de 1863. Morreu em 1915.)

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