domingo, 29 de agosto de 2021

Há verdades que precisam de ser ditas

Há verdades que precisam de ser ditas. Bacalhau à espanhola, por exemplo. Bacalhau à espanhola não é caldeirada de bacalhau, tão-pouco ensopado de bacalhau. Bacalhau à espanhola é um prato que pede azeite e não água. É quase um guisado, de molho grosso e aveludado, e com o tempero apurado até aos limites legais de sal, pimenta, alho, louro e salsa. Por mim, também malagueta. Colorau, um nada só para dar cor. E, tomem nota, o pimento e o tomate são duas desnecessidades usadas apenas por quem pensa, mas não sabe, que só assim é que é "à espanhola". Erro crasso. O bacalhau à espanhola é à portuguesa!
E permitam-me que esclareça ainda o seguinte: o bacalhau até pode ser de quarto, daquele que, inteiro, não mede mais do que um palmo e tem a espessura de uma folha de papel A4. E pode ser pouco. Não faz diferença nenhuma. O importante é o gosto que o bacalhau empresta, o equilíbrio do tempero geral, a consistência da molhanga. Quando eu era pequeno e os tempos eram de pobreza como os de agora, a minha mãe fazia um bacalhau à espanhola a que, honestamente, chamava batatas à espanhola. E vocês não fazem ideia do que perderam por nunca terem provado as batatas à espanhola da minha mãe...
E pronto, era isto. Fiz a minha parte, estou enfim de consciência tranquila. Andava com esta espinha atravessada na garganta há que tempos, depois de ter visto o que não queria aí num sítio onde fui comer. E agora, se me dão licença, vou à cozinha rectificar a feijoada com tripas do almoço e salgar uns ossinhos da suã para o jantar de logo à noite.

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