Foi um bom ano. Óptimo! Em tempo de balanço, há que dizer com toda a
frontalidade que as sardinhas da época 2020 foram excelentíssimas, e sei de prova tirada que as de 2021 também prometem.
Abençoada proibição. Finalmente, ao fim de quase dez anos, enfrentei-me
com sardinhas competentes, maiores ou menores, sabendo e cheirando a mar
e pingando no pão, como manda a tradição.
Por acaso eu às
tradições até nem ligo. Cá em casa só começamos a assar sardinhas depois
de passados os santos populares e tenho um contrato assinado com os
meus amigos pescadores e com a minha querida peixeira que me proíbe de
explicar porquê. Mas em 2020 comemos sardinhas assadas do nosso mar
todas as sextas-feiras após o São João e até aos princípios de Novembro,
com Setembro e Outubro em grande forma, apesar de serem meses que sardinhamente falando, padecem de "r".
Uma vez, na peixaria da Dona Augusta, seria mês de Abril, uma senhora perguntava se "As sardinhas..." e foi logo interrompida pela minha peixeira, que lhe respondeu "Estão muito boas, as sardinhas ainda estão boas". É claro que não estavam, e logo em ano de colheita medíocre, mas a peixeira tem de fazer pela vida. Eu trouxe biqueirão.
Já experimentaram, decerto já, tirar a cabeça aos biqueirões, abri-los pela barriga retirando-lhes a espinha, que sai muito facilmente, temperar estas "costeletas" com sal, pimenta preta moída na hora, limão e um quase-nada de alho picado, e deixá-los neste preparo aí umas quatro horas, duas para cada lado? E depois passá-los por ovo e pão ralado e fritá-los sem deixar queimar? E fazer entretanto um arrozinho de bacalhau com trocinhos de tronchuda? Arroz carolino, já se sabe, que se transforma com o peixinho num verdadeiro manjar de deuses. Mas decerto já experimentaram.
Dica: as espinhas saem ainda mais facilmente se os biqueirões forem do dia anterior. Mas, para mim, peixe ou é do dia ou já não é peixe. Em miúdo, muito gostava eu de ouvir às peixeiras de Fafe o pregão "É da biba, olha a bibinha", e ficava-se logo também a saber que as sardinhas nesse dia seriam mais caras. Mas eram "como prata". Hoje tenho a sorte de morar em Matosinhos, a dois passos do porto de pesca e da lota. O mais das vezes trago para casa peixe vivo, literalmente vivo, que os pescadores dos barcos pequenos estão a acabar de entregar. O que me levanta alguns problemas, operacionais e... de consciência. Um dia tive com uma solha uma luta cujos pormenores não conto nem quero lembrar. Ganhei, mas portei-me mal. E só à mesa é que me perdoei.
É. A sabedoria popular ensina, e genericamente bem, que Maio, Junho, Julho e Agosto
são os melhores meses para comer sardinha assada. Mas a Dona Dina, que Deus tem, dizia-me que de Junho a Dezembro eu
podia comer as suas sardinhas à confiança, e eu comia e ela tinha razão.
A Dona Dina era uma pessoa muito boa e a melhor assadeira de sardinhas
do mundo. As sardinhas assadas da Dona Dina eram não mais do que
douradas e traziam sempre o mar dentro.
Eu ando lá perto...
Uma vez, na peixaria da Dona Augusta, seria mês de Abril, uma senhora perguntava se "As sardinhas..." e foi logo interrompida pela minha peixeira, que lhe respondeu "Estão muito boas, as sardinhas ainda estão boas". É claro que não estavam, e logo em ano de colheita medíocre, mas a peixeira tem de fazer pela vida. Eu trouxe biqueirão.
Já experimentaram, decerto já, tirar a cabeça aos biqueirões, abri-los pela barriga retirando-lhes a espinha, que sai muito facilmente, temperar estas "costeletas" com sal, pimenta preta moída na hora, limão e um quase-nada de alho picado, e deixá-los neste preparo aí umas quatro horas, duas para cada lado? E depois passá-los por ovo e pão ralado e fritá-los sem deixar queimar? E fazer entretanto um arrozinho de bacalhau com trocinhos de tronchuda? Arroz carolino, já se sabe, que se transforma com o peixinho num verdadeiro manjar de deuses. Mas decerto já experimentaram.
Dica: as espinhas saem ainda mais facilmente se os biqueirões forem do dia anterior. Mas, para mim, peixe ou é do dia ou já não é peixe. Em miúdo, muito gostava eu de ouvir às peixeiras de Fafe o pregão "É da biba, olha a bibinha", e ficava-se logo também a saber que as sardinhas nesse dia seriam mais caras. Mas eram "como prata". Hoje tenho a sorte de morar em Matosinhos, a dois passos do porto de pesca e da lota. O mais das vezes trago para casa peixe vivo, literalmente vivo, que os pescadores dos barcos pequenos estão a acabar de entregar. O que me levanta alguns problemas, operacionais e... de consciência. Um dia tive com uma solha uma luta cujos pormenores não conto nem quero lembrar. Ganhei, mas portei-me mal. E só à mesa é que me perdoei.
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