domingo, 12 de março de 2017

Peregrino Júnior 3

Não estava com medo, não. Mas caminhava hesitante, com sobrosso. As sombras do crepúsculo esmagavam a floresta. O canto sinistro das aves noturnas povoava a solidão de assombrações e agouros.
Sem olhar para trás, com o coração aos pulos, escolheu uma boa forquilha de pau e preparou a armadilha, sapecando na espingarda uma grossa carga de escumilha. Ao menor estalido da folha, arrepiavam-lhe os cabelos, e um frio estranho pela espinha.
Medo? Mas, medo de quê?... ele nunca tivera medo de nada!...
A luz hesitante da lua cheia escorria pelos galhos espessos da mata, sem clarear o chão. Os troncos secos, entrançados de cipó e embiras, erguiam-se para o céu, no labirinto do mato verde, como esqueletos sinistros.
Naquele cenário aterrador, Zeferino experimentou uma sensação estranha. Medo! Sim... um medo que ele nunca tinha sentido. Um medo não sabia de quê. Cerrou os olhos, transido de terror. O pica-pau martelava no quiriri da noite. Uma gargalhada estraçalhante de coruja abalou tragicamente o silêncio negro da floresta. Zeferino deu um grito e desembestou na carreira, numa alucinação, para a beira do igarapé, onde amarrara a montaria.

"A Mata Submersa", Peregrino Júnior

(Peregrino Júnior nasceu no dia 12 de Março de 1898. Morreu em 1983.)

Sem comentários:

Enviar um comentário