quinta-feira, 9 de março de 2017

João Simões Lopes Neto 2

O negro Bonifácio

Se o negro era maleva? Cruz! Era um condenado!... mas, taura, isso era, também!
Quando houve a carreira grande, do picaço do major Terêncio e o tordilho do Nadico (filho do Antunes gordo, um que era rengo), quando houve a carreira, digo, foi que o negro mostrou mesmo pra o que prestava... mas foi caipora.
Escuite.
A Tudinha era a chinoca mais candongueira que havia por aqueles pagos. Um cajetilha da cidade duma vez que a viu botou-lhe uns versos mui lindos - pro caso - que tinha um que dizia que ela era uma

"............................................... chinoca airosa,
Lindaça como o sol, fresca como uma rosa!..."

E o sujeito quis retouçar, porém ela negou-lhe o estribo, porque já trazia mais de quatro pelo beiço, que eram dali, da querência, e aquele tal dos versos era teatino...
Alta e delgada, parecia assim um jerivá ainda novinho, quando balança a copa verde tocada de leve por um vento pouco, da tarde. Tinha os pés pequenos e as mãos mui bem torneadas, cabelo cacheado, as sobrancelhas finas, nariz alinhado.
Mas o rebenqueador, o rebenqueador... eram os olhos!...
Os olhos da Tudinha eram assim a modo olhos de veado-virá, assustado: pretos, grandes, com luz dentro, tímidos e ao mesmo tempo haraganos... pareciam olhos que estavam sempre ouvindo... ouvindo mais, que vendo...
Face cor de pêssego maduro, os dentes brancos e lustrosos como dente de cachorro novo, e os lábios da morocha deviam ser macios como treval, doces como mirim, frescos como polpa de guabiju...
E apesar de arisca, era foliona e embuçalava um cristão, pelo só falar, tão cativo...
[...]

 "Contos Gauchescos", João Simões Lopes Neto 

(João Simões Lopes Neto nasceu no dia 9 de Março de 1865. Morreu em 1916.)

Sem comentários:

Enviar um comentário