sábado, 11 de março de 2017

Carmen Dolores 3

E certo dia, sob a reprovação mal refreada dos seus, Madalena participou que se ia casar com um senhor Salgado, quinquagenário ainda robusto, que lhe oferecia a comunhão da simpatia contra os próximos e comuns desalentos da velhice solitária.
Por ocasião desse casamento, enquanto a noiva, madura e satisfeita, jurava fidelidade ao futuro de cabelos grisalhos, bem empertigado na sua casaca solene, o Matias, sucumbido, sussurrava ao ouvido do cunhado Jorge.
"Tudo isto é obra fatal da defunta Valentina..."
E, mais áspero:
"Eu, se ela ressuscitasse, metia-lhe uma bengalada..."
O filho acrescentou com raiva:
"Eu fazia mais: assassinava a peste..."
E volvendo o olhar torvo para as sedas lilases e farfalhantes da mãe ao pé do altar, concluiu entre dentes:
"Ainda esta manhã ela foi levar uma coroa de amores perfeitos ao túmulo da amiga, agradecendo a lição..."
Madalena, entretanto, pesada e triunfante, ia dizendo ao senhor Salgado, cuja calva reluzia às luzes: "Recebo a vós..."
Era o direito à felicidade, proclamado alto!... Era o direito à vida própria!...


"Lição póstuma", Carmen Dolores

(Carmen Dolores nasceu no dia 11 de Março de 1852. Morreu em 1910.)

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