terça-feira, 22 de outubro de 2019

Eneida de Moraes 4

(...) Uma noite, numa de minhas prisões (quem já esqueceu os trágicos dias do fascismo brasileiro?) fui levada da Casa de Detenção para a Polícia Civil. Ia ser novamente interrogada. 
Quando cheguei ao sombrio prédio da Rua da Relação, puseram-me num cubículo onde já havia alguém. Era noite; estava escuro demais naquele pedacinho frio. Não consegui ver a pessoa presente. Perguntei:
- Quem é você?
Ouvi um soluço e uma voz feminina começou a contar: 
- Não sou política, nunca me meti nisso, mas me prenderam. E você quem é? Não entendo de nada. Só se foi porque andei dizendo na repartição que precisamos ter liberdade no Brasil. Tenho também uns parentes que foram presos, mas eu sou eu (e soluçava)... Que horas são? 
Disse-lhe a hora, contei quem era e de onde vinha, esperei que meus olhos se habituassem a escuridão. Conversamos. Era um bela mulher morena que chorava, chorava muito. Ia perder o emprego com certeza, ia sofrer, iam bater-lhe (...).

"Aruanda", Eneida de Moraes 

(Eneida de Moraes nasceu no dia 23 de Outubro de 1904. Morreu em 1971.)

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