O Natal de tia Calu
Tia Calu deixara a porta semi-aberta, para não correr a todo instante a receber os rapazes. Maria Augusta, sozinha, não daria conta do recado. Eram salgadinhos de toda sorte, delicados pastéis, empadinhas apimentadas, camarões recheados, canapés de salmão importado, caprichosas invenções do seu reconhecido gênio culinário. Entre os presentes recebidos àquela manhã havia dois vidros grandes de caviar. Seriam a surpresa da noite. Cortava, amassava, picava, colocava, com requintes de decoradora, trabalho amoroso e sutil, em que punha a alma. Naquela noite todos viriam! Pela primeira vez todos estariam em sua casa, na doce festa de Natal.
Soaram passos na sala.
- Vai ver quem chegou, Maria Augusta.
A preta espiou à porta, viu um jovem oficial, de malinha na mão, contemplando risonho a grande árvore, fulgurante de luzes.
- Tem um que eu não conheço. Está fardado.
- Fardado?
Seu rosto subitamente se fechou. Tia Calu, em suas festas, não gostava que eles viessem de uniforme e todos sabiam disso. O uniforme era a lembrança viva do perigo permanente, da ceifadora implacável.
[...]
"Balbino, Homem do Mar", Orígenes Lessa
(Orígenes Lessa nasceu no dia 12 de Julho de 1903. Morreu em 1986.)
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